O globo, n.30882 , 24/02/2018. PAÍS, p.3

O ELO DA FECOMÉRCIO

CHICO OTÁVIO

DANIEL BIASETTO

 

 

Presidente da entidade é suspeito de operar com Cabral desvio de R$ 11 milhões do Sistema S

A apuração do Ministério Público Federal encontrou conexões entre o líder empresarial e o esquema de corrupção montado pelo ex-governador Sérgio Cabral. A investigação estima desvios de cerca de R$ 11 milhões de duas entidades do Sistema S. A Operação Jabuti, que prendeu ontem o presidente da Federação do Comércio do Rio de Janeiro (Fecomércio), Orlando Diniz, revelou as conexões entre o esquema comandado pelo governador Sérgio Cabral e os empresários do setor comercial. Com o poder dos cargos que exerciam, Cabral e Diniz trocaram favores pessoais em manobras que envolveram lavagem de dinheiro, contratação de empregados fantasmas e aprovação de leis sob encomenda, como demonstraram as investigações que estimam os desvios em ao menos R$ 11 milhões.

A prisão de Diniz — afastado do comando do Sistema Sesc-Senac no Rio — é preventiva, como determinou o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal. Outras três pessoas ligadas à entidade também foram alvos de mandados de prisão temporária: Marcelo Salles, diretor-geral do Senac-RJ e Sesc-RJ; Plínio José Freitas, do corpo técnico do Senac-RJ, e Marcelo Fernando Novaes Moreira. O Ministério Público sustenta que Diniz teria desviado ao menos R$ 3 milhões de duas entidades do Sistema S, o Sesc e o Senac-RJ, para a Thunder Assessoria Empresarial, firma na qual figura como sócio-administrador. Notas frias emitidas por empresas indicadas por Cabral foram usadas para justificar a entrada do dinheiro na Thunder.

Em troca do favor do peemedebista, Diniz contratou pela Fecomércio sete pessoas ligadas ao ex-governador ou a seus operadores, gastando com os seus salários cerca de R$ 8 milhões. Os chamados de “jabutis” eram funcionários fantasmas do Sistema S no Rio. Entre eles, uma irmã de Wilson Carlos; a mãe e a mulher de Carlos Miranda; a mulher de Ari Ferreira da Costa Filho, o Arizinho; a mulher de Sérgio de Castro Oliveira, o Serjão; Ana Rita Menegaz (ex-chefe de cozinha do Palácio Guanabara); e Sônia Ferreira Baptista (ex-governanta da família Cabral).

Os procuradores da República afirmam no pedido de prisão que os R$ 3 milhões apurados nas notas serviram para esquentar dinheiro desviado por Diniz do Sistema S Rio. As transferências, afirmam, foram facilitadas por um convênio firmado pelo presidente da Fecomércio com o Sesc-Senac, que não passava por fiscalização.

 

PRAZO ESPECIAL DE PAGAMENTO DE ICMS

Na petição à Justiça, o MPF sustenta ainda que Cabral sancionou uma lei, em 2009, que proibiu a decretação de novos feriados estaduais, “o que, a toda evidência, vai ao encontro dos interesses dos sindicatos afiliados à Fecomércio”. A força-tarefa também citou o decreto assinado pelo então governador, em 15 de dezembro de 2009, que concede prazo especial de pagamento de ICMS a empresas indicadas pela federação.

A Força-Tarefa suspeita que Diniz já esperava a visita dos agentes da Polícia Federal. Nos endereços ligados ao empresário — no Leblon, Zona Sul do Rio, e no Condomínio Portobello, em Mangaratiba, na Costa Verde — os investigadores encontraram cômodos praticamente vazios.

Na petição, a força-tarefa informa que também investiga, desde 2016, repasses de dinheiro da Fecomércio a escritórios de advocacia, entre os quais o de Adriana Ancelmo, mulher do exgovernador. No valor total dos honorários pagos a estes escritórios é de R$ 180 milhões. A forçatarefa, com base no depoimento de um executivo da Fecomércio, afirma que o empresário fez movimentos financeiros atípicos e vultosos para fazer pagamentos a advogados.

A banca de Adriana Ancelmo recebeu R$ 20 milhões. O escritório dirigido por Roberto Teixeira e Cristiano Zanin (advogados do ex-presidente Lula) lidera a lista de honorários, com repasses que somam R$ 68 milhões, de acordo com a força-tarefa.

Em dezembro do ano passado, Diniz, que comandava a Fecomércio desde 1998, foi afastado da presidência do Sesc Rio por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em caráter provisório. O julgamento sobre o afastamento estava previsto para o dia 6 de fevereiro, mas foi adiado por ordem do ministro relator do caso, Napoleão Nunes Maia Filho.

 

O QUE DIZEM OS INVESTIGADOS

Em nota, a Fecomércio chamou de “inverdades” as acusações contra Diniz. “As acusações que recaem sobre Orlando Diniz são infundadas. Ele vai esclarecer todos os pontos levantados pela PF e pelo MPF e o devido processo legal deve provar sua inocência.” Ainda critica os atuais interventores escolhidos para gerir a entidade.

O escritório de advocacia de Adriana Ancelmo foi procurado, mas não se pronunciou até o fechamento desta edição

Já a Teixeira, Martins & Advogados informou que presta serviços jurídicos desde 2011 à Fecomércio-RJ, “que é uma entidade privada que representa os comerciantes”. “A atuação do escritório em favor da Fecomércio-RJ e também de entidades por ela geridas pode ser constatada em diversas ações judiciais que tramitam perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal”.