Título: O rentável negócio das tornozeleiras
Autor: Sassine,Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 30/03/2012, Política, p. 4
Uma das principais bandeiras de Demóstenes Torres (DEM-GO) no Senado serviu a um dos ramos de negócio de Carlinhos Cachoeira. Amigo íntimo do bicheiro, o senador foi relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do projeto que alterou o Código Penal e a Lei de Execução Penal para permitir o monitoramento eletrônico de presos por meio de pulseiras ou tornozeleiras eletrônicas. Demóstenes incluiu uma emenda no texto que ampliou a possibilidade de uso dos equipamentos. Diálogo telefônico usado pela Polícia Federal (PF) para a Operação Monte Carlo, obtido pelo Correio, revela que Cachoeira intermediou a compra de 2 mil tornozeleiras eletrônicas, em maio do ano passado: "Carlinhos pede para pegar um negócio em Brasília, 2 mil peças, tornozeleiras de presídios", cita a PF na transcrição da conversa entre o bicheiro e um funcionário.
Ex-secretário de Segurança Pública e ex-procurador-geral de Justiça em Goiás, Demóstenes é um contumaz defensor do monitoramento eletrônico de detentos com alta periculosidade. Em 2010, pediu apoio aos líderes partidários no Senado para aprovarem o Projeto de Lei nº 175, de 2007, relatado por ele na CCJ. A proposta foi aprovada em maio de 2010 e sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva no mês seguinte.
As pulseiras ou tornozeleiras podem ser usadas por presos em saídas temporárias no regime aberto e em prisão domiciliar, conforme decisão dos juízes. Diversos estados já adotaram o recurso. No ano passado, Demóstenes voltou a relatar no Senado um projeto que prevê monitoramento eletrônico de presos. Foi ele o responsável pelo relatório das mudanças no Código de Processo Penal, que também virou lei, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em maio.
Os equipamentos permitem saber a localização do preso e a distância percorrida por ele. Passou a ser um negócio rentável para muitas empresas. Cachoeira decidiu investir nesse ramo, como mostra a investigação da PF. As interceptações telefônicas revelam o bicheiro supostamente envolvido na intermediação da compra de 2 mil tornozeleiras , mas não se sabe o destino do equipamento.
No diálogo com outro investigado na Operação Monte Carlo, Cachoeira pede para que os equipamentos sejam buscados. Não há detalhes sobre a origem ou o destino da mercadoria. Para o procurador regional da República Carlos Alberto Vilhena Coelho, coordenador do núcleo criminal da Procuradoria Regional da República (PRR) da 1ª Região, a possível compra de tornozeleiras eletrônicas mostra "a proximidade e a intimidade de Cachoeira com o sistema penitenciário goiano".
Foi esse um dos argumentos do procurador manifestados no pedido de habeas corpus formulado pela defesa jurídica de Cachoeira, que continua detido no presídio federal de Mossoró (RN). Os advogados pediram a prisão domiciliar do acusado, que passaria a ser monitorado justamente por uma tornozeleira eletrônica. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região seguiu a recomendação da PRR e negou o habeas corpus. Novos pedidos foram feitos pela defesa jurídica de Cachoeira.
Para o procurador Carlos Alberto, é "imprescindível" manter o bicheiro no presídio de segurança máxima. Ele reproduz na sua manifestação a transcrição telefônica sobre as 2 mil tornozeleiras. O governo de Goiás prepara licitação para comprar equipamentos eletrônicos para presos. No ano passado, chegou a divulgar a aquisição de algumas unidades.
Equipamento
A emenda incluída por Demóstenes no PL nº 175/2007, relacionada ao monitoramento eletrônico de presos, foi validada na sanção da Lei nº 12.258/2010. "A ausência de vigilância direta não impede a utilização do equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado, quando assim determinar o juiz de execução", diz o trecho incluído pelo senador e validado pelo Executivo.