Título: Recompensa aos denunciantes
Autor: Jeronimo , Josie
Fonte: Correio Braziliense, 26/03/2012, Política, p. 3

Em clima de faroeste, o Congresso discute propostas que transformam o combate à corrupção em uma espécie de corrida de caça ao tesouro, concedendo incentivos financeiros a denunciantes de esquemas e cobrando das empresas multas por gestão permissiva ao desvio de recursos. O carro-chefe dos projetos que recompensam delatores por denúncias de atos ilícitos é uma proposta do líder do PT, senador Walter Pinheiro (BA), em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que garante ao denunciante recompensa de 10% do valor desviado que voltar para os cofres públicos.

O projeto propõe a alteração do artigo 5º do Código de Processo Penal, formalizando recompensa a "qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal" e comunicar à autoridade policial. A proposta é polêmica e encontrou resistência até mesmo na Comissão de Ética Pública da Presidência da República. Em reunião do colegiado, o órgão mostrou-se preocupado com a possibilidade de o projeto criar uma corrida de "caçadores de recompensa". A comissão ponderou que o incentivo "estimula o clima de denuncismo", conduz o problema do combate à corrupção a critérios meramente pragmáticos e pode onerar ainda mais a máquina pública.

O autor do projeto, por sua vez, alega que a medida é mais do que um incentivo financeiro, pois, na maioria dos casos, os delatores de esquemas de corrupção só recebem o amparo do Estado por um curto período de tempo e depois da exposição não conseguem restabelecer rotina de trabalho. "Essa experiência existe em países da Ásia, como as Filipinas. O objetivo não é só o incentivo. O cidadão quando se apresenta e faz uma denúncia dificilmente consegue trabalhar em algum lugar. O Estado banca até determinado período. Não é só um estímulo", afirma Pinheiro.

Má gestão

O líder do PT adianta que o projeto não deve tramitar sozinho na CCJ. O Senado vai reunir textos de outras propostas que também tratam de incentivos às denúncias de esquemas de corrupção para montar um projeto mais amplo. De acordo com Walter Pinheiro, o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) mostrou interesse em relatar as propostas. O compêndio "anticorrupção" do Senado contemplará premissas do Projeto de Lei nº 6826, de 2010, encaminhado ao Congresso ainda durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que responsabiliza também as empresas por atividades ilícitas. A proposta é relatada pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP) e vai ser votada na Comissão Especial dos Atos contra a Administração Pública da Câmara no próximo mês.

No substitutivo de Zarattini, o relator destaca a intenção do governo em criar regras que façam a corrupção ou má gestão doer no bolso. Pela proposta, as pessoas jurídicas serão responsabilizadas pelos atos praticados por qualquer agente ou órgão que as represente e as punições administrativas previstas são multas que variam entre R$ 6 mil e R$ 6 milhões, calculadas de acordo com o faturamento bruto da empresa enquadrada em situação irregular ao prestar serviço para órgão público. O deputado Édio Lopes (PMDB-RR) apresentou emendas sugerindo que as multas previstas no projeto sejam reduzidas e que as empresas acusadas de atos ilícitos não sejam obrigadas a reparar integralmente o dano causado quando o conflito for apenas da esfera administrativa, e não criminal.

""O cidadão quando se apresenta e faz uma denúncia dificilmente consegue trabalhar em algum lugar"" Walter Pinheiro (PT-BA), senador