O globo, n. 30865, 07/02/2018. Economia, p. 21
Petrobras inicia processo de venda da refinaria de Pasadena
Ramona Ordonez
07/02/2018
Empreendimento é símbolo do escândalo de corrupção da Lava-Jato
Em comunicado ao mercado, a Petrobras iniciou a etapa de divulgação para a venda da refinaria de Pasadena, nos EUA, símbolo do escândalo de corrupção investigado na Operação Lava-Jato. A Petrobras deu o pontapé inicial para a venda da refinaria de Pasadena, em Houston, nos Estados Unidos. A estatal lançou ontem um teaser (comunicado) com as informações sobre o empreendimento. O processo de venda da refinaria — um símbolo do escândalo de corrupção revelado pela Operação Lava-Jato — será conduzido pela Petrobras America Inc, filiada da estatal.
Em comunicado ao mercado divulgado ontem, a Petrobras informou que estão à venda a refinaria, que tem capacidade de produção de 110 mil barris diários de petróleo, um espaço de armazenagem de 5,1 milhões de barris de petróleo e derivados, o terminal marítimo, a logística e os estoques associados, além de um terreno localizado no canal marítimo de acesso a Houston, para oportunidades de expansão futura.
O teaser contém não só as principais informações sobre o ativo à venda como também os critérios objetivos para a seleção de potenciais participantes. Os interessados deverão se manifestar até o próximo dia 23. Poderão participar do processo empresas da área de refino de combustíveis, companhias de logística, fundos de investimentos e tradings (de comércio exterior).
META DE VENDER US$ 21 BI
A venda da refinaria de Pasadena representa, segundo um executivo próximo à estatal, a oportunidade de se livrar de “mais um esqueleto” do esquema de corrupção que existiu na estatal no passado, revelado pela Operação lava-Jato. A Petrobras pagou ao todo pela refinaria US$ 1,18 bilhão. A compra foi justificada à época pelo projeto de internacionalização de operações da estatal. Mas a escolha e o custo se tornaram alvo de críticas. Pasadena é uma usina antiga e enfrentou uma série de problemas ambientais nos Estados Unidos. No fim do ano passado, foi apresentada a primeira denúncia no âmbito da Lava-Jato sobre a compra da refinaria nos EUA.
A Petrobras pretende levantar US$ 21 bilhões até o fim do ano com a venda de ativos. O programa de desinvestimento visa a equilibrar as contas da companhia, reduzindo seu endividamento. De acordo com o Plano de Negócios da Petrobras 2018-2022, no ano passado, a empresa vendeu ativos equivalente a US$ 4,5 bilhões. Mesmo assim, a meta de venda para o biênio 2017-2018 foi mantida em US$ 21 bilhões. No fim de 2017, ela incluiu projetos de mais de US$ 5 bilhões nesta lista de ativos à venda.
Uma série de iniciativas tem contribuído para melhorar os números da empresa. No ano passado, a abertura de capital da Petrobras Distribuidora (BR) rendeu R$ 5 bilhões à estatal. Além disso, a petroleira levantou outros US$ 2,9 bilhões com a venda de parte do Campo de Roncador na Bacia de Campos para a norueguesa Statoil, com a qual firmou uma parceria estratégica.
DE FERTILIZANTE A PROJETO NO PARAGUAI
Entre alguns dos principais ativos que já estão à venda se destacam postos de gasolina e empreendimentos no Paraguai, 90% da TAG, a Unidade de Fertilizantes III e a subsidiária de biocombustíveis. Fazem parte da lista, ainda, vários campos terrestres e campos marítimos em águas rasas em diversos estados do país. A lista de projetos disponíveis para investidores inclui ainda a Nova Transportadora do Nordeste (NTN), com a rede de gasodutos do Nordeste, e a participação na Braskem.
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Um projeto marcado por problemas
07/02/2018
A compra da refinaria de Pasadena foi um dos estopins que tornaram público o esquema de corrupção que existia na Petrobras revelado pela Operação Lava-Jato. A Petrobras comprou em 2006 uma participação de 50% em Pasadena por US$ 360 milhões. O valor foi muito superior ao pago um ano antes pela belga Astra Oil por toda a refinaria, que tinha sido comprada por US$ 42,5 milhões. Em delação premiada, o ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró informou que ocorreu pagamento de propina na negociação.
Nos anos seguintes, a Petrobras se desentendeu com sua sócia nesse negócio, a Astra Oil, e, devido a uma decisão judicial, a estatal foi obrigada a comprar os outros 50% da participação da empresa belga. A compra de Pasadena acabou custando US$ 1,18 bilhão à Petrobras, um valor muito superior ao que sua sócia pagou.
O caso ganhou repercussão nacional porque a compra foi realizada quando a ex-presidente Dilma Rousseff era presidente do Conselho de Administração da Petrobras. O negócio fazia parte de uma estratégia da Petrobras de se internacionalizar no mercado de combustíveis.
Quando foi questionada por ter dado o aval ao negócio como presidente do Conselho de Administração, Dilma disse que a decisão de todos os conselheiros foi baseada em um resumo executivo falho, gerando uma crise interna na Petrobras e a discussão sobre o papel dos conselheiros na companhia, assim como a indicação política dos nomes que comandavam o Conselho.
Na delação à Justiça, Cerveró disse que Dilma sabia de todos os detalhes da compra da refinaria americana. Em meio à troca de acusações, foi revelada a informação de que as reuniões do Conselho da Petrobras não eram sequer gravadas, aumentando ainda mais a tensão com o caso.
O negócio envolvendo Pasadena foi alvo de processo no Tribunal de Contas da União (TCU). O relatório apontou que a estatal teve um prejuízo milionário “em razão desses gestores terem adotado critérios antieconômicos para definir o preço da refinaria”. Em outubro do ano passado, o TCU chegou a pedir o bloqueio dos bens da ex-presidente Dilma e de outros ex-conselheiros, como Antonio Palocci e José Sergio Gabrielli. O processo ainda não acabou.
A refinaria de Pasadena foi fundada em 1920 pela Crown Central Petroleum, uma das companhias remanescentes do império Rockfeller, cujo grupo Standard Oil chegou a controlar 88% do refino de petróleo nos EUA. Localizada no Houston Ship Channel, uma das vias navegáveis mais importantes dos EUA, Pasadena enfrentou vários problemas ambientais. Com poluição atmosférica acima do aceitável, recebeu, em 1998, multa de US$ 1,1 milhão, aplicada pelo órgão ambiental do Texas. Com tamanho passivo ambiental, os herdeiros da Crown decidiram colocar Pasadena à venda. Foram anos de tentativas.
A refinaria acabou sendo comprada, em janeiro de 2005, pela Astra Oil, controlada pelo belga Albert Frère, o homem mais rico do país. Meses depois, em novembro daquele ano, a Astra Oil assinava memorando de entendimentos com a Petrobras, para fechar o negócio no início do ano seguinte.
No ano passado, grupos ambientalistas do Texas entraram com uma ação contra a refinaria por violação dos limites de poluição.