O globo, n. 30861, 03/02/2018. País, p. 4

 

PF cancela indicação de delegado para superintendência no Rio

Juliana Castro e Luan Santos   

03/02/2018

 

 

MPF contestou escolha de Felício Laterça por ligação com políticos

A Polícia Federal (PF) voltou atrás e cancelou ontem a indicação do delegado de Macaé (RJ), Felício Laterça, para o cargo de superintendente do órgão no Rio. À tarde, houve um pedido do próprio delegado para não assumir a função. Mais cedo, no entanto, Laterça havia convocado coletiva de imprensa para garantir que iria comandar a PF no estado.

Na entrevista na sede da PF em Macaé, antes de desistir do cargo, o delegado disse que sua indicação “causou desconforto entre os colegas de profissão”, mas que não há nenhuma investigação em curso contra ele. Laterça, que é filiado ao PSC, estava ao lado do prefeito de Macaé, Dr. Aluízio (PMDB).

— O Ministério Público Federal não está investigando nada. Não há nenhuma denúncia (contra mim) sendo investigada — afirmou o delegado. — Não é verdade que não vou ser nomeado. Vou ser o superintendente da PF no Rio. Espero ser nomeado o quanto antes. Tenho 28 anos de carreira. Sou ficha-limpa. Não há nada anotado no meu histórico. Na Superintendência, vou combater a corrupção. Se for preciso, vou investigar o meu irmão (Rodolfo Laterça). Por questão ética, me afastaria — afirmou Felício Laterça.

Como O GLOBO revelou, o MPF instaurou procedimento para acompanhar a nomeação de Felício Laterça. Procuradores enviaram ofício ao diretorgeral da PF, Fernando Segovia, questionando se havia algum procedimento administrativo em curso para apurar condutas do delegado e se, antes de escolhê-lo para o cargo mais importante da PF no estado, foram observados os princípios da moralidade, impessoalidade e interesse público.

Antes do afastamento de Lateria terça, Segovia dissera que a verificação sobre o nome do delegado era um processo natural, mas que se houvesse algo que o desaprovasse, a nomeação teria de ser revista.

Laterça comentou a polêmica envolvendo o prédio onde funciona a sede da PF em Macaé. Segundo procedimento do MPF no município, o prefeito oferecido ao delegado que a sede da PF fosse instalada na propriedade que pertenceria a um aliado e que é alugada à prefeitura. Em troca, Rodolfo Laterça, irmão de Felício, seria nomeado no gabinete de Farid Abrão, que na época era deputado estadual e hoje é prefeito de Nilópolis. No procedimento, há um anexo com a nomeação de Rodolfo para o cargo.

O irmão do delegado também já passou pelo gabinete do deputado estadual Chiquinho da Mangueira e, anteontem, foi nomeado pelo governador Luiz Fernando Pezão para a subsecretaria operacional da Secretaria estadual de Administração Penitenciária (Seap). No cargo, Rodolfo será responsável, entre outras coisas, por realocar os detentos dentro das unidades prisionais.

Na entrevista coletiva, Laterça disse que na época da mudança da sede da PF em Macaé para o prédio alugado pela prefeitura, em 2016, houve uma investigação da corregedoria da PF, feita a partir de uma denúncia anônima.

— Os corregedores apuraram e enviaram parecer para o MPF, e foi decidido que não iriam continuar com o processo por falta de provas — disse.

Ainda sobre o imóvel, o prefeito de Macaé disse que “a elaboração do contrato de locação da prefeitura para ceder o espaço para a Polícia Federal existe desde 2009”.

— Isso foi reconhecido oficialmente. Em 2016, foi assinado o comodato do prédio — afirmou Dr. Aluízio.

Laterça, por sua vez, disse que um relatório do MPF apontou a necessidade de um novo prédio:

— Onde a PF estava não havia a menor condição de trabalho. Por isso, estamos aqui.

Sobre suposta ligação com o prefeito de Macaé, Laterça, sentado ao lado do mandatário, disse ter pouca relação com ele, somente “entre delegado e prefeito”.

Após o afastamento do cargo, Laterça disse que tomou a decisão para se defender judicialmente das reportagens e para preservar a imagem da PF. (*Especial para O GLOBO)

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STF autoriza inquérito para investigar Kassab

André de Souza e Daniel Gullino

03/02/2018

 

 

Executivos da J&F disseram ter dado propinas ao ministro entre 2009 e 2016

-BRASÍLIA- A pedido do relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Edison Fachin, o ministro Alexandre de Moraes, também do STF, autorizou ontem a abertura de um novo inquérito para investigar o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD), por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e caixa dois.

A investigação foi solicitada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e será baseada na delação premiada de executivos da J&F. O ministro já era investigado em dois inquéritos no STF, abertos a partir da delação premiada de executivos da Odebrecht. Em seu acordo, Wesley Batista, da J&F, afirmou ter feito pagamentos mensais de propina a Kassab, no valor de R$ 350 mil, entre 2009 e 2016. Já Ricardo Saud relatou ter pago R$ 5,5 milhões. O ministro nega as acusações.

Fachin também autorizou a abertura de mais um inquérito para investigar o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), suspeito de ter ameaçado o exministro da Cultura Marcelo Calero. O pedido também foi feito por Raquel Dodge. Agora já são quatro inquéritos no Supremo contra Lúcio.

Calero deixou o governo em novembro de 2016 após relatar pressão do ex-ministro Geddel Vieira Lima para que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ligado ao Ministério da Cultura, liberasse o licenciamento de um prédio no qual Geddel tinha apartamento. Logo depois, Calero teria sido ameaçado por Lúcio.

Ontem, o ministro Edson Fachin autorizou o envio de 12 questionamentos formulados pela procuradora-geral da República ao presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Ele é investigado com basena delação do ex-diretor de relações institucionais do Grupo Hypermarcas Nelson José de Melo. O executivo disse ter repassado R$ 5 milhões para a campanha de Eunício ao governo do Ceará em 2014 mediante contratos fictícios pelos quais nenhum serviço foi prestado.

Dodge pergunta se Eunício conhece o lobista Milton Lyra, investigado na Operação LavaJato, e, caso sim, qual a natureza dessa relação. Segundo o termo de depoimento de Nelson Mello em sua delação, “em um determinado momento de 2014 Milton Lyra informou que seria procurado por um portador de Eunício Oliveira”. Mello também disse que “recebeu um sobrinho de Eunício Oliveira, então candidato a governador, o qual pediu ajuda financeira na candidatura” e que “concordou com o pedido pela posição do senador”.

Eunício afirmou que “não comenta investigações judicais em andamento”. Em nota, a defesa de Milton Lyra negou participação em irregularidades.