Correio braziliense, n. 20042, 05/04/2018. Política, p. 3

 

PT tenta manter o discurso

Deborah Fortuna

05/04/2018

 

 

JUSTIÇA » Parlamentares e líderes petistas afirmam que Lula permanece candidato a presidente, mas adversários o consideram fora do baralho

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de negar o habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um duro golpe nas pretensões eleitorais petistas. Enquadrado na Lei da Ficha Limpa e com a possibilidade de ser preso cada vez maior, Lula preferiu ficar em silêncio ontem, mas o PT publicamente não desiste de colocá-lo na disputa das eleições presidenciais de outubro. Para os adversários políticos, no entanto, a candidatura do ex-presidente não tem condições de ser homologada até o fim do período de pré-candidatura, mesmo ele estando à frente das pesquisas.

“Nós vamos lutar politicamente e juridicamente para continuar com o Lula nas eleições”, comentou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), após a decisão do STF. O deputado destacou que o partido ainda vai recorrer à Justiça “até o fim” para que o ex-presidente possa ter o direito de competir. Condenado em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em janeiro deste ano, o ex-presidente enquadra-se nos critérios de inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa e, portanto, estaria inviabilizado de concorrer ao cargo.

Por meio das redes sociais, no entanto, o líder do partido na Câmara, Paulo Pimenta (PR), mostrou-se indignado pelo resultado da votação e disse que ex-presidente será “nitidamente um preso político do golpe”. Ele também confirmou que a legenda vai continuar na disputa ao Planalto com o nome de Lula. “Não vão nos derrotar no grito ou nos tribunais”, afirmou. Outros parlamentares petistas também se manifestaram contra o resultado do julgamento da Suprema Corte. Entre eles, o senador Humberto Costa (PE), que também bateu na tecla de “seguir na luta”. “A construção de uma democracia sólida sofre sempre com a perseguição e a injustiça”, comentou. Logo após o voto da ministra Rosa Weber, considerado o voto decisivo do julgamento, ao negar o habeas corpus, a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), afirmou no Twitter que não é hora de desistir. “Vamos acompanhar o julgamento até o final. Não desistimos. Por Lula e pelos milhões de brasileiros”, escreveu.

“Está impedido”

Os governistas, no entanto, não consideram mais Lula como um candidato viável nas eleições em outubro de 2018.  “O Lula já está impedido de competir pela Lei da Ficha Limpa. O caso do julgamento ontem era só para saber se ele poderia ser preso ou não. O que eu digo é: na questão eleitoral, ele está impedido”, garantiu o deputado Beto Mansur (MDB-SP), vice-líder do governo na Câmara, também logo após a decisão de Rosa Weber.

O deputado Fernando Francischini (PR), recém-filiado ao partido PSL, que tem como pré-candidato à presidência da República o deputado Jair Bolsonaro, deixou claro que a candidatura do partido não sofrerá nenhuma interferência de Lula. “Para o Bolsonaro, não afeta em nada já que ele tem uma campanha despregada da política tradicional e, sendo dessa forma, ele continua percorrendo o Brasil com palestras, independente dos candidatos de esquerda”, comentou. Bolsonaro esteve ontem no protesto na Esplanada contra o ex-presidente Lula. Tirou selfies e deu autógrafos.

Já o deputado Daniel Coelho (PPS-PE) disse que o placar do julgamento dá esperança ao país de que a lei é universal, já que, se o STF revogasse o entendimento geral sobre as prisões após a condenação em segunda instância, poderia haver uma possível reação nas ruas. “Se isso acontecer, a reação da população é imprevisível. Será uma revolta sem tamanho. Lula é admirado por um terço da população, mas odiado por dois terços. Se ficar a impressão de privilégio ou arrumadinho, o resto de respeito que o povo ainda tem às instituições acaba”, disse.

O líder do DEM, Rodrigo Garcia, no entanto, apesar de defender a punição ao ex-presidente, disse que o resultado pode causar uma insegurança jurídica, já que a ministra Cármen Lúcia não pautou primeiro as ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs), impetradas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo PEN (Partido Ecológico Nacional), hoje Patriotas. “Agora, Lula pode ser preso a qualquer momento, mas ainda existe uma insegurança a esse tema, tendo em vista que existem questionamentos junto ao Supremo sobre a prisão em segunda instância. É importante para o país que o Supremo decida a questão de mérito o mais rápido possível”, opinou.

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Críticas de advogados

05/04/2018

 

 

Mais aguardado entre todos os pronunciamentos no julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o voto da ministra Rosa Weber se mostrou contrário ao pedido da defesa e, no plenário do Supremo, levou a uma sensação imediata de abatimento tanto entre os advogados quanto entre os correligionários do líder petista. Havia insatisfação com o voto da ministra Rosa Weber e com a condução da pauta de julgamentos pela presidente Cármen Lúcia.

As primeiras queixas partiram da avaliação de que a ministra Rosa Weber, apesar de negar o habeas corpus de Lula, deu indicativos de que poderia votar contra a prisão em segunda instância numa votação futura, nas ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) — nome técnico das ações que definem a regra geral, não só de um caso específico.

Mas também houve críticas à presidente Cármen Lúcia por, justamente, ter preferido pautar o habeas corpus e não as ações em que Rosa Weber poderia se sentir mais à vontade para votar a favor da presunção da inocência até o esgotamento de todos os recursos. A percepção era de que Rosa Weber poderia votar de acordo com a tese da defesa se primeiro fossem julgadas as ações gerais.

Ao falar em irresponsabilidade, o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) escancarou a indignação dos aliados em relação a Cármen Lúcia por não ter pautado as ações de relatoria do ministro Marco Aurélio que definiriam a regra para todos os réus. “A presidente Cármen Lúcia está impondo à Corte um impasse desnecessário. Ela, como presidente, não deveria fazer isso chegar às rédeas da irresponsabilidade”, afirmou o deputado federal. “Ela (Cármen Lúcia) sabe que há entendimento majoritário diferente e se recusa a pautar as ações declaratórias de constitucionalidade. É isso?”, questionou.

Desânimo

A festa que os apoiadores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva faziam no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, quando teve início o julgamento do seu pedido de habeas corpus, deu lugar a um desânimo generalizado. O voto da ministra Rosa Weber foi recebido com silêncio e os simpatizantes do ex-presidente já consideraram o julgamento encerrado.

A sede do sindicato tem sido usada como espaço para que os apoiadores do petista acompanhem a votação dos ministros do Supremo. Nos primeiros votos, membros de movimentos sociais gritavam palavras de ordem, tocavam instrumentos de percussão e empunhavam bandeiras. No entanto, depois do voto de Rosa, considerado decisivo para o resultado final, os instrumentos e as bandeiras foram guardados.

Bolsa tem queda de 0,31%

O julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal (STF) teve influência negativa no início do pregão do Ibovespa, mas o noticiário internacional reverteu a trajetória. A bolsa brasileira seguiu a bolsa americana e fechou em queda de 0,31%, refletindo a preocupação dos investidores, não com o efeito Lula imediato, mas com as incertezas que uma guerra comercial dos Estados Unidos contra a China traz para o crescimento da economia mundial. “A queda de braços entre as duas maiores potências atinge o mercado como um todo, e é como se colocasse um quebra-molas no crescimento da economia global, que vinha bem”, avalia o analista da Clear Corretora, Raphael Figueredo. Depois do anúncio de sobretaxação de 25% dos americanos sobre mais de 1,3 mil produtos chineses, a China anunciou lista de 106 produtos que também terá tarifação de 25%, como carros, aviões, soja, entre outros