Título: Base espera presidente mais zen
Autor: Braga, Juliana
Fonte: Correio Braziliense, 02/04/2012, Política, p. 3

Na volta da viagem ao Oriente, Dilma retoma o posto ocupado interinamente por Marco Maia. Expectativa é que a crise com aliados esteja contornada após votações e promessa de liberação de recursos

Após uma semana ausente do país por conta da viagem à Índia para participar da cúpula dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a presidente Dilma Rousseff volta a exercitar, em solo brasileiro, o poder da caneta presidencial conferido a ela por mais de 55 milhões de eleitores em 2010. Além de retomar as articulações políticas no Congresso e negociar o empenho das emendas parlamentares ao Orçamento de 2012, Dilma também anunciará, amanhã, novas medidas para estimular a economia brasileira. Entre elas, a desoneração da folha de pagamentos.

Parlamentares esperam que o astral na relação mude. O Correio mostrou, na quinta-feira, que o acirramento no tom palaciano na relação com o Congresso tem o aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas Lula tem dito que ele agiria de maneira diferente, embora "cada um tenha seu estilo", conforme relato de pessoas próximas ao petista. Recuperado do câncer de laringe, ele deve intensificar as conversas com os aliados já nesta semana. Em outra frente, o aceno de Dilma em liberar mais recursos para os deputados pode sinalizar uma mudança de perfil no trato com aliados após os embates das últimas semanas.

Durante o período em que Dilma e o vice-presidente Michel Temer estavam ausentes do país, o Brasil foi governado interinamente pelo presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). E o deputado petista, integrante do grupo político que atualmente controla a liderança do governo e do PT na Câmara, aproveitou para "demonstrar sua habilidade política e capacidade de destravar nós", segundo avaliação da própria oposição, expressada pelo líder do PSDB, deputado Bruno Araújo (PE).

Maia se reuniu com parlamentares da oposição em almoço na Residência Oficial da Câmara, conduziu as negociações para a aprovação da Lei Geral da Copa, desobstruindo a pauta de votações da Casa e abrindo espaço para a votação do Código Florestal — maior ponto de impasse entre o governo e a base aliada, especialmente os peemedebistas.

Marcada a votação, fez questão de anunciar ele mesmo que o nó estava desatado e que, finalmente, a Lei Geral da Copa iria à votação. E ainda deixou proliferar as afirmações de aliados de que "a crise viajara com Dilma para a Índia".

Dilma não gostou das movimentações intensas do petista. A relação entre ambos sempre foi tensa, alternando momentos de aproximação e de antagonismo. No começou, conforme apurou o Correio, o Planalto deixou que Maia se movimentasse com mais desenvoltura. "A presidente estava deixando Marco Maia "surfar na onda" para não parecer que é o Executivo quem pauta o Legislativo", disse uma fonte do governo.

Mas a paciência presidencial tem limite. Marco Maia fez um acordo com os ruralistas para que eles não obstruíssem a Lei Geral e, em troca, deixou pré-marcada para abril a votação do Código Florestal. Dilma queria essa votação para depois da Rio+20, em junho, pois sabe que será derrotada. Um parlamentar que acompanhou as negociações do presidente da Câmara afirmou que "Maia não definiu a data para não constranger a presidente".

Dilma, então, autorizou a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, a destravar o empenho das emendas parlamentares ao orçamento de 2012. É um montante que gira em torno de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões e deve ser liberado nos próximos dias. Esses recursos já estavam sendo negociados por Dilma com Ideli; a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann; e a ministra do Planejamento, Miriam Belchior. Mas o processo foi sustado após os senadores derrubarem a recondução de Bernardo Figueiredo à presidência da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

Comando Com o anúncio feito por Ideli Salvatti da liberação dos empenhos, Dilma retomou para si o comando do processo. A mudança de espírito do Palácio do Planalto foi tão nítida que Ideli, acuada havia três semanas sob uma chuva de críticas de senadores e deputados, teve ânimo para brincar. "Me disseram: "Tá tudo em paz?" E eu disse assim: "Se estiver tudo em paz, eu sou demitida"".

Maia acusou o golpe palaciano. "Uma coisa não tem nada a ver com outra. A liberação de recursos para obras e projetos do governo é normal, faz parte do processo político", rebateu. O fato é que a semana será decisiva para mensurar a relação entre Planalto e Congresso.

Base aérea

Dilma Rousseff chegou à Base Aérea de Brasília às 7h45 de ontem, depois de cumprir cinco dias de agenda em Nova Délhi, na Índia. De acordo com a assessoria da Presidência, ela passou o dia no Palácio da Alvorada, sem compromissos oficiais. Hoje, tem reunião marcada às 15h com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. O encontro ocorre às vésperas do anúncio de medidas econômicas.