O globo, n. 30859, 01/02/2018. Sociedade, p. 29

 

Inclusão cresce na sala de aula, mas estrutura deixa a desejar

Paula Ferreira

01/02/2018

 

 

Metade das escolas do ensino fundamental não tem biblioteca

Ainda que a passos lentos, o Brasil tem conseguido aumentar a inclusão de alunos com deficiência no sistema de ensino. Em 2017, o número de matrículas desse grupo na educação básica foi de pouco mais de 827 mil. No ano passado, eram 751 mil. O índice apresenta crescimento há quatro anos consecutivos. Mas, apesar disso, a estrutura das escolas ainda é insuficiente para atender a essa população.

Segundo dados do Censo Escolar da Educação Básica 2017, divulgados ontem pelo Ministério da Educação (MEC), o índice de inclusão de pessoas com deficiência em classes regulares, o que é recomendado, passou de 85,5% em 2013 para 90,9% em 2017. No entanto, somente 40,1% dos alunos com deficiência contam com atendimento educacional especializado.

Em relação a 2013, o ensino médio conseguiu quase dobrar o número de matrículas de pessoas com deficiência, passando de 48.589 para 94.274 em 2017. Mas esse grupo ainda corresponde a um percentual irrisório do total de matrículas na etapa, apenas 1,2%. Quando chega à escola, no entanto, muitas vezes o aluno não encontra infraestrutura adequada. Somente 46,7% das instituições de ensino médio apresentam dependências adequadas para esse público. O banheiro adequado para pessoas com deficiência só existe em 62,2% dessas escolas.

No ensino fundamental, o percentual de matrículas de alunos com deficiência em relação ao total é de 2,8%, índice maior que no médio, mas o ritmo desse crescimento foi menor. Enquanto em 2016 o número de matrículas era 709.805, no ano passado esse número era 768.360.

A capacidade de atendimento a esse grupo é ainda menor no fundamental, onde somente 29,8% das escolas têm dependências adequadas para esse público e 39,9% contam com banheiro específico.

As matrículas de pessoas com deficiência também aumentaram na educação infantil. Em 2016, eram 69.784 e no ano seguinte passaram para 79.749. Observando a série histórica, a inclusão desses estudantes em classes regulares também cresceu, passando de 71,7%, em 2013, para 86,8% em 2017.

INSTITUIÇÕES DESPREPARADAS

Mas o problema da falta de estrutura também é uma realidade nessa etapa. Somente 26,1% das creches e 25,1% das pré-escolas têm dependências e vias adequadas a alunos com deficiência. E banheiros adequados estão presentes em apenas 32,1% das escolas de educação infantil.

— Não há o costume de preparar a escola para receber todas as pessoas. Fazemos o caminho inverso: criamos a perspectiva da inclusão, mas não preparamos as escolas. Não temos infraestrutura, e, na maioria das classes, também não temos um segundo formador para auxiliar o professor. Somente colocar a criança na escola sem preparar a instituição coloca em risco a ideia de universalização do acesso à educação — afirma Mozart Neves Ramos, diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna.

A estrutura não é falha somente nas adaptações para estudantes com deficiência. Entre todas as escolas municipais, que concentram 71,5% do total de instituições de educação infantil, somente 29,7% têm biblioteca ou sala de leitura.

No ensino fundamental, apenas 54,3% têm biblioteca ou sala de leitura. O quadro é ainda pior no que diz respeito à existência de laboratório de ciências. O aparato é realidade somente para 11,5% das instituições. E somente 41,2% delas têm quadra de esportes.

A estrutura do ensino médio é um pouco melhor. Na etapa, 88% das instituições têm biblioteca ou sala de leitura. O número de laboratórios nessa rede também é maior: 45,4% das escolas têm. Há quadras de esportes em 76,9% dos estabelecimentos do ensino médio.

— É um desafio ter a infraestrutura básica para atender alunos com necessidades especiais. Mas as escolas brasileiras não têm nem o básico. Há instituições que ainda não dispõe de esgoto tratado, eletricidade, banheiro. Muitas também não têm sala de leitura. Como ter um bom resultado na alfabetização se mais da metade das escolas da rede não têm sala de leitura? O Brasil ainda precisa resolver uma agenda do século XX ao mesmo tempo que tenta solucionar uma agenda do século XXI, com uma escola para desenvolver crianças e jovens para o mundo de hoje — critica Olavo Nogueira, gerente de políticas educacionais do Todos pela Educação.

ESCOLAS SEM SANEAMENTO

Entre as escolas de educação infantil, cerca de 8,5% não têm ao menos um dos serviços básicos como abastecimento de água, energia e saneamento. No ensino fundamental, 10% das escolas não possuem pelo menos um desses recursos básicos.

Se a estrutura é falha, a formação dos professores não é diferente. Segundo o Censo, cerca de 15% dos docentes que atuam na educação básica brasileira não têm ensino superior. O percentual maior de professores sem curso universitário está na educação infantil, onde 24,3% não têm esse diploma. Nos anos iniciais do fundamental a taxa de professores sem curso universitário é 17,3%, quantia que cai significativamente nos anos finais, passando para 8,7%. No ensino médio, apenas 2,6% dos docentes não possuem diploma universitário.