O globo, n. 30888, 02/03/2018. País, p. 4

 

Novo diretor-geral promove dança das cadeiras na PF

Jailton de Carvalho

02/03/2018

 

 

Delegado Elzio da Silva comandará combate ao crime organizado

-BRASÍLIA- O novo diretor-geral da Polícia Federal, Rogério Galloro, decidiu trocar todos os diretores setoriais indicados para os cargos pelo ex-diretor Fernando Segovia. Entre os escolhidos está o delegado Elzio Vicente da Silva, chamado para comandar a Diretoria de Combate ao Crime Organizado, o segundo cargo mais relevante na hierarquia da polícia. Também devem compor a diretoria os delegados Silvana Helena Borges, Umberto Ramos Rodrigues, Delano Bunn e Fabricio Kelmer, segundo policiais que estão acompanhando a dança das cadeiras no comando da PF.

Os nomes da equipe de Galloro começaram a vir a público na quarta-feira. Ontem, o novo diretor reclamou do vazamento. Ele alegou que ainda iria tratar do assunto com o ministro da Segurança, Raul Jungmann. O diretor não excluiu, no entanto, nenhum dos nomes citados no noticiário. Entre os indicados para a nova diretoria, o nome que chama mais atenção é o de Elzio Vicente da Silva, superintendente da PF em Brasília. Trata-se de um dos delegados mais experientes e respeitados dentro da instituição.

Ex-promotor que fez concurso para delegado, Silva fez parte da equipe do ex-diretor Paulo Lacerda, que inaugurou o período das grandes operações de combate à corrupção. Silva, aliás, esteve à frente de algumas das mais impactantes ofensivas da polícia contra o crime de colarinho branco, entre elas as operações Anaconda, Furacão e Navalha.

Deflagrada em 2003, a Anaconda quebrou um tabu ao botar na cadeia um dos mais poderosos juízes federais de São Paulo, Rocha Mattos, condenado por corrupção. A Furacão (ou Hurricane) resultou na prisão de quase todos os grandes bicheiros do Rio em 2007 e deixou em delicada situação desembargadores e até um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspeitos de favorecer os criminosos. A Navalha expôs, também em 2007, a extensão das relações entre donos de empreiteiras, políticos e outros agentes públicos, inclusive policiais. As três operações, que tiveram forte repercussão, serviram de parâmetro para outras grandes ações da polícia.

PERFIL DISCRETO

Discreto, Silva passava ao largo do noticiário da época e ainda hoje, mesmo como superintendente em Brasília, se mantém longe das câmeras. Isso vale também para o período em que foi superintendente em Tocantins e em Mato Grosso.

Ele não gosta de ser filmado, fotografado ou mesmo citado. Quando acontece algum caso relevante e que deve ser tratado publicamente, Silva prefere, geralmente, escalar um outro delegado que atuou no tema para dar entrevista.

Mas se fala pouco e quase não aparece em público, o delegado tem fama de trabalhar até de madrugada. Ele também é descrito como metódico e paciente.

Foi ele quem, de longe, coordenou a equipe responsável pela Operação Acrônimo. A operação começou com a simples apreensão de pouco mais de R$ 100 mil em poder do lobista Benedito Oliveira, conhecido como Bené, no aeroporto de Brasília, e quase derrubou o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT). Bené virou delator e fez várias acusações contra o governador. Pimentel virou réu no STJ, mas se mantém no cargo.

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MP quer refazer investigação de Janot

Vinicius Sassine

02/03/2018

 

 

Procurador critica denúncia feita contra Dilma por obstrução à Justiça

-BRASÍLIA- O polêmico caso dos emails atribuídos à ex-presidente Dilma Rousseff, por meio dos quais ela teria alertado o marqueteiro João Santana e sua mulher, Mônica Moura, sobre os avanços da Lava-Jato, pode voltar à etapa zero das investigações. O então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou a petista por obstrução dos trabalhos da Justiça e, para isso, usou o episódio como uma das provas do crime. Agora, o caso foi remetido à primeira instância e, na visão da Procuradoria da República no Distrito Federal (PRDF), não foi devidamente investigado.

O procurador da República Ivan Marx pediu à Justiça Federal arquivamento do trecho da denúncia de Janot que trata dos e-mails. Marx manifestou a intenção de refazer essa investigação. Foi solicitada autorização para retirar cópia do processo, em caso de arquivamento, com a finalidade de instaurar um procedimento investigatório criminal — equivalente a um inquérito da Polícia Federal (PF) — para apurar se Dilma alimentou esses e-mails, de onde alimentou e se obstruiu a Justiça com o gesto. Isso significaria, na prática, uma nova investigação.

O então procurador-geral denunciou Dilma, o ex-presidente Lula e o ex-ministro Aloizio Mercadante ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo crime de obstrução da Justiça, em 6 de setembro de 2017, pouco antes de deixar o cargo. A peça lista três episódios que configurariam o crime: suposta oferta de apoio político e financeiro ao então senador Delcídio Amaral (ex-PTMS), de forma que não fizesse acordo de delação premiada; intenção de dar posse a Lula no cargo de ministro da Casa Civil, com o propósito de blindar o expresidente com o foro privilegiado; e as supostas conversas entre Dilma e Mônica via rascunho de uma conta de Gmail, com alertas cifrados sobre os avanços da Lava-Jato em direção a João Santana, marqueteiro das campanhas da petista.

Relator da Lava-Jato no STF, o ministro Edson Fachin determinou a transferência do caso para a primeira instância, pois já não havia autoridades com foro privilegiado entre os denunciados. Os autos foram remetidos à Justiça Federal em Brasília em janeiro deste ano. No começo de fevereiro, Ivan Marx encaminhou documento com pedido de arquivamento do caso específico dos e-mails.

“FALTA DE ELEMENTOS”

Os outros dois episódios levados em conta para a denúncia de Janot contra Dilma ainda estão pendentes de análise. Na estrutura do Ministério Público Federal (MPF) não existe hierarquia, assim um procurador que atua na primeira instância não está subordinado ao procurador-geral da República.

Marx criticou, no pedido enviado à Justiça Federal, a denúncia de Janot. Argumentou que os três episódios citados não estão conectados, de forma a justificar uma mesma acusação à Justiça. A suposta troca de e-mails entre Dilma e Mônica baseou-se apenas em ação cautelar de quebra de sigilos telemáticos e telefônicos citados no processo, sem existirem elementos suficientes para ratificar a denúncia, conforme o pedido enviado pela PRDF à Justiça Federal.

Entre as diligências previstas, caso a Justiça concorde com o arquivamento e com a remessa de uma cópia do processo ao MPF, está um pedido de informações ao Arquivo Nacional sobre os registros existentes a respeito da militância de Dilma contra a ditadura militar. Isto porque os emails supostamente utilizados para a comunicação, 2606alvarina@gmail.com e 2606iolanda@gmail.com, trazem referências a episódios ocorridos naquele período. Outra providências seriam ouvir Mônica e solicitar informações à Google – empresa dona do Gmail.

Procurada, a assessoria da expresidente afirmou que esperaria a publicação da reportagem para saber do que se trata. A reportagem procurou ainda a assessoria de Janot, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.