Correio braziliense, n. 20044, 07/04/2018. Economia, p. 8

 

Meirelles brigará para concorrer à Presidência

Rosana Hessel

07/04/2018

 

 

Henrique Meirelles renunciou ontem ao cargo de ministro da Fazenda e anunciou a pré-candidatura à Presidência da República pelo MDB, seu novo partido. As pretensões do ex-comandante da economia esbarram, entretanto, na intenção do presidente Michel Temer de encabeçar a chapa emedebista nas eleições deste ano.

Meirelles descartou ser vice-presidente, senador ou governador. “Eu vou analisar a possibilidade de uma candidatura à Presidência. Vou iniciar esse processo com atenção e seriedade devida. Não pretendo ser candidato a vice e não há menor possibilidade de ser candidato a governador ou a senador”, frisou. “Estou analisando uma candidatura a presidente (da República)”, emendou.

O ministro evitou comentar sobre a possibilidade de não conseguir ser cabeça de chapa pela legenda à qual se filiou no último dia 3. O prazo para a candidatura termina em 15 de agosto. Até lá, a escolha da chapa, segundo o ministro, será pela análise da viabilidade de cada candidato.

A aposta de Meirelles para conseguir ser o escolhido do partido para disputar o Palácio do Planalto são os resultados da economia, das pesquisas qualitativas e de sua carreira como executivo de sucesso. Ele destacou que vários indicadores macroeconômicos melhoraram desde a saída da ex-presidente Dilma Rousseff, em maio de 2016.

O Produto Interno Bruto (PIB) voltou a crescer após dois anos de recessão. A inflação está no menor nível desde 1999, permitindo que a taxa básica de juros (Selic) atingisse 6,5% ao ano, o mais baixo patamar da história. O ministro prevê expansão de 3% e a criação de 2,5 milhões de empregos neste ano.

Mas, mesmo com dados positivos da economia, o cidadão comum ainda não percebeu essas mudanças. “A população ainda não consegue ver a melhora. Poderia estar um pouco melhor, não fosse a crise de maio de 2017 (quando estourou a primeira denúncia contra Temer, a da JBS)”, destacou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

Além disso, o ex-chefe da Fazenda não tem dados positivos nas contas públicas para mostrar. O rombo fiscal deste ano deverá ser maior do que o do ano passado e a dívida pública bruta corre o risco de ultrapassar 80% do PIB em 2018, praticamente o dobro da taxa média dos países emergentes, pelas estimativas da Standard & Poor’s. “A área fiscal está ruim, mas o mercado tem ignorado isso, porque ele acha que o próximo presidente é quem vai ter que resolver esse problema”, explicou o economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central.

Especialistas reconhecem que, como a reforma da Previdência não avançou, a emenda do teto de gastos — um dos pilares da credibilidade do ajuste fiscal promovido pelo chefe da Fazenda e, que tem evitado oscilações maiores no mercado — corre o risco de ruir se não houver mudança no sistema de aposentadorias, que tem deficits crescentes. “O próximo presidente precisará, de fato, promover a reforma da Previdência. Meirelles poderia ser essa pessoa, mas acho que ele não tem o perfil de um candidato para cargo eletivo”, avaliou Freitas.

Substituto

Após dois encontros com Temer, Meirelles confirmou a saída do cargo e a substituição pelo secretário executivo da pasta, Eduardo Guardia, que assumirá o comando da Fazenda a partir da semana que vem. Na avaliação do economista Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o fato de Meirelles ter conseguido emplacar seu braço direito como seu sucessor mostrou que ele conseguiu negociar bem sua saída para que não houvesse interferência política na área econômica. “Esse foi um bom sinal para o mercado, porque a política econômica será mantida”, completou.

Para Balassiano, a candidatura de Meirelles deve ajudar a melhorar a qualidade das campanhas. “O ministro personifica o legado positivo do governo Temer, que é a área econômica. Sua candidatura deixaria o debate um pouco mais sério, porque ele é um dos poucos que teria condições de debater a necessidade da reforma da Previdência e defendê-la”, destacou.

Dificuldades

Apesar da iminente prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, especialistas têm dúvidas de que um candidato do governo, seja ele qual for, tenha que disputar apenas uma das duas vagas do segundo turno, porque quem ganharia mais com Lula fora da corrida presidencial seria o pré-candidato Jair Bolsonaro (PSC). “O centro está muito pulverizado e não tem uma candidatura única governista. Governo e PT, ao tentar adiar a prisão de Lula, estão articulando uma frente ampla para eleger o Bolsonaro”, avaliou Freitas.

Sergio Vale, da MB, também reconhece que a competição entre os partidos de centro deve dificultar a vida de um candidato governista. “Essa eleição não vai bastar ter tempo de TV, mas ser bom de palanque. Além disso, o que o Meirelles fez na economia é difícil de vender para a população. Acho quase impossível que ele consiga subir sua popularidade na eleição”, destacou.

Parece que Meirelles está ciente disso e deve aproveitar todos os eventos em que Temer estiver. Depois de anunciar a decisão que disse ter tomado ontem mesmo, o ministro embarcou com o presidente para Salvador para participar de uma cerimônia de posse de diretores da federação e da Confederação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb e Cieb) e depois seguiu com Temer para o Paraná, onde participa hoje de um simpósio do setor varejista.

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Concorrência no próprio partido

07/04/2018

 

 

O cientista político Christopher Garman, diretor para as Américas do Eurasia Group, é cauteloso ao falar das chances de Henrique Meirelles e do presidente Michel Temer. Para ele, ambos dificilmente conseguirão ir para o segundo turno. “A probabilidade de um candidato do governo é muito pequena”, avaliou.

De acordo com ele, Meirelles enfrentará dificuldades para ser candidato dentro do seu novo partido. “As chances do ministro são muitíssimo baixas. É provável que ele nem seja candidato, porque vai enfrentar muitas barreiras no partido. O governo tem uma aprovação muito baixa, menos de 10%, e, portanto, se subisse, o candidato natural seria o Temer e não o Meirelles. Logo, as mesmas razões para ser candidato valem para os dois. Ele só seria competitivo se a aprovação do governo subisse de 10% para 20%, e, nesse caso, Temer sairia candidato”, avaliou.

Para Garman, o candidato com mais chances de derrotar Bolsonaro no segundo turno, apesar de ser fraco no primeiro, é o tucano Geraldo Alckmin, mas ele admite que outros candidatos que ainda não anunciaram campanha, como o ex-ministro Joaquim Barbosa, também poderiam surpreender.