Título: Racistas agem há 30 anos
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Fonte: Correio Braziliense, 25/03/2012, Cidades, p. 27

Marcelo Valle Silveira Mello dissemina preconceito e racismo há, ao menos, sete anos. Acabou preso na última quinta-feira somente após a Polícia Federal detectar a possibilidade de um massacre de estudantes da Universidade de Brasília (UnB). Mas o rapaz de 26 anos está longe de ser uma exceção no Distrito Federal. Ele não é o único nem foi o primeiro a espalhar um ódio irracional contra determinadas comunidades na capital do país.

Grupos de racistas atuam de forma organizada no DF há pelo menos 30 anos. Os mais antigos identificados pela Polícia Civil são admiradores declarados de Adolf Hitler. Desde 1982, semeiam ideais nazistas e cometem crimes. Pregam o ódio a homossexuais, estrangeiros, punks, anarquistas e nordestinos. Mas a amplitude da ação desses grupos criminosos, formados por homens e mulheres conhecidos como carecas, acabou descoberta por investigadores apenas em novembro de 2007.

Ao analisar o material apreendido na casa de dois supostos integrantes do Carecas do Planalto, há quatro anos e meio, os policiais da 21ª Delegacia de Polícia (Taguatinga Sul) desvendaram alguns dos códigos de honra dos skinheads (carecas, em inglês). Entre eles, há um braço armado, encarregado de punir supostos traidores e inimigos. Esse subgrupo é conhecido como C18. O C se refere a Combate, 1 à letra A (em referência a Adolf) e 8 à H (Hitler).

Esses códigos estão nas duas últimas páginas de um dos livros recolhidos na chácara de Rui Barbosa Oliveira, apontado como líder do Carecas do Planalto. Os manuscritos são considerados essenciais na solução do assassinato do adestrador de cães Jaílson Oliveira Nunes. O crime ocorreu em 22 de fevereiro de 2007. A vítima era skinhead. Ele teria sido morto após abandonar o grupo. O caso continua em aberto. Ninguém foi punido até o momento.

Pelo texto escrito no livro a caneta de tinta azul, Jaílson e outro careca, identificado como Neto, estavam marcados para morrer por causa da origem nordestina. O vigilante Jaílson era natural de Cubati, na Paraíba. Já Neto, que está vivo, nasceu no interior do Piauí. "Isso é abominável para uma organização à altura da BH. Se sentindo usurpada, a BH acionou a C18", diz a mensagem deixada no livro apreendido. BH são as iniciais de Blood and Honor, Sangue e Honra, na língua inglesa.

O mesmo texto afirma que Jaílson e Neto são traidores. Alerta que ambos faziam contatos com skinheads paulistas para derrubar os líderes do movimento em Brasília. Mas, segundo a mensagem, os dois usariam identidades falsas nas conversas com os colegas de São Paulo, na tentativa de esconder a origem nordestina.

Os policiais civis investigaram ainda as mortes de outros dois skinheads. Um deles foi encontrado morto com um tiro na cabeça em outubro de 2007. Ele teria se suicidado após receber intimação para prestar esclarecimentos à polícia. Outra morte ainda sem explicação é a de um homem cujo corpo foi encontrado em um saco amarrado a uma pedra, no fundo do lago. Ele foi enterrado com trajes nazistas. Os dois casos continuam sem apuração.