Correio braziliense, n. 20055, 18/04/2018. Política, p. 2

 

STF abre ação penal contra Aécio

Renato Souza e Rosana Hessel

29/04/2018

 

 

UM PAÍS SOB TENSÃO » Primeira turma da Corte decide aceitar acusações contra senador envolvendo a operação lava-jato. Ele nega envolvimento nos casos

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) é o primeiro político tucano a ter uma denúncia aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Lava-Jato. As acusações que foram feitas contra ele pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por crimes de corrupção e obstrução de Justiça ao receber R$ 2 milhões do empresário Joesley Batista, do grupo J&F.

A primeira acusação, por corrupção ativa, foi aceita por unanimidade pelos cinco integrantes da 1ª Turma, Marco Aurélio Mello, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Alexandre de Moraes. Eles seguiram o voto do ministro Marco Aurélio, que é o relator do caso. Também se tornaram réus por este crime a irmã do senador; a jornalista Andréa Neves; o primo dele, Frederico Pacheco de Medeiros; e um ex-assessor do senador Zezé Perrella (PMDB-MG), Mendherson de Souza Lima. Todos negam envolvimento em qualquer ilegalidade.

O ministro Alexandre de Moraes abriu divergência quanto ao crime de obstrução de Justiça. Ele votou contra a aceitação por entender que não existem provas suficientes da materialidade dos atos criminosos. No entanto, foi voto vencido, e Aécio também terá que responder por esta acusação. Após tomar conhecimento do resultado, o senador afirmou que vai provar a legalidade dos seus atos. “Agora eu terei a oportunidade que eu não tive até aqui, de provar de forma clara e definitiva a absoluta correção dos meus atos. [...] Vamos agora à fase mais relevante de todas: provar a mais absoluta legalidade e correção dos meus atos”, disse.

Em uma nota, divulgada logo após a decisão, Aécio afirmou que é vítima de "um enredo" construído para aparentar que ele cometeu atos ilegais. "Estou sendo acusado tendo como base uma ardilosa armação de criminosos confessos, aliados a membros do Ministério Público, que construíram um enredo para aparentar que cometi alguma ilegalidade. Não cometi crime algum", afirmou.

O senador alegou ainda que as denúncias têm origem em "um flagrante armado", se referindo à operação da Polícia Federal. "É preciso que a Justiça reconheça em definitivo que não se pode considerar válidas denúncias originadas de um flagrante armado com o intuito de gerar impressão de crime, já que não há qualquer prova de que crime houve."

Durante o julgamento, Marco Aurélio afirmou que existem diversas provas dos crimes cometidos, e que, ao longo da ação, os fatos serão aprofundados. “Existe transcrição de conversas telefônicas e conversas do senador das quais se extrai que estaria tentando influenciar na escolha de delegados da Polícia Federal para conduzir inquérito da Operação Lava-Jato, buscando a impunidade de políticos envolvidos nos atos ilegais. Com base nas evidências, encontra-se indícios de prática criminosa. Por isso voto pela aceitação da denúncia.”

O ministro Luís Roberto Barroso, ao votar para que a denúncia fosse recebida pelo tribunal, disse estranhar a forma como o dinheiro de Joesley chegou até Aécio. A defesa e o próprio senador sustentam que os valores se referem a um empréstimo que o político solicitou ao empresário. “Um empréstimo de R$ 2 milhões é registrado em um contrato, onde se prevê juros e multa em caso de atraso. Aqui não existe um contrato. O repasse de valores que são emprestados se faz por meio de transferência bancária ou cheque. Ninguém sai por aí transportando malas de dinheiro sem ter algo errado”, afirmou. Além desse processo, outros oito inquéritos tramitam contra o peessedebista no STF.

Próximos passos

A partir de agora, começa a investigação contra o senador. Ele foi afastado do mandato em duas ocasiões no ano passado, por conta das acusações que agora foram aceitas. O primeiro afastamento, em 18 de maio, e o segundo, em 26 de setembro, foram anulados pelo Senado Federal. O próprio STF decidiu que decisões que afetem o cumprimento do mandato devem ser chanceladas pela casa legislativa.Diferente das medidas cautelares impostas anteriormente, a denúncia não precisa de aval do Senado para avançar. O professor Conrado Gontijo, especialista em direito penal do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP), destaca que a partir de agora começa a fase processual. “Com a denúncia aceita, o STF começa a estipular prazos para que a defesa e o próprio réu sejam ouvidos. Provas serão apresentadas no processo até o dia da realização da audiência. Como não se trata de presidente dos Três Poderes, não é necessário aval do Senado para que o caso avance. Se ocorrer condenação, pode resultar em perda de mandato e inelegibilidade.”

Debate

No Senado, o assunto tomou conta das conversas entre os parlamentares nos corredores e no plenário. Os políticos evitaram criticar a decisão do STF que acatou a denúncia contra Aécio por corrupção e obstrução da Justiça feita pela Procuradoria-Geral da República. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), um dos caciques da legenda, não comentou a decisão dos ministros do STF. “Acho que Justiça é Justiça. O que a Justiça decidiu está decidido e não tem o que discutir, principalmente, o Supremo.”

O primeiro vice-líder do bloco social-democrata Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), avaliou que o Supremo julgou “adequadamente” para que Aécio possa se defender. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que já esperava a decisão do STF, o que revela um acerto do Conselho de Ética do Senado ao denunciar Aécio. “E o quanto o Senado errou de não ter, anteriormente, concedido a suspensão do mandato.”


Demóstenes na corrida

Por 3 a 2, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu confirmar a decisão do ministro Dias Toffoli, que havia afastado a inelegibilidade do ex-senador Demóstenes Torres (PTB-GO). Na prática, a decisão do colegiado abre caminho para que Demóstenes concorra nas próximas eleições. Procurador no Ministério Público do Estado de Goiás, Demóstenes deseja reassumir a cadeira de senador nas eleições de 2018. Demóstenes foi afastado do cargo de procurador cautelarmente pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em outubro de 2012, após a abertura de processo administrativo. Ele foi cassado pelo Senado em julho daquele ano por quebra de decoro parlamentar, sob acusação de envolvimento com o empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, que foi denunciado por exploração de jogos ilegais e corrupção.

Voto a voto

Confira como cada ministro votou nas duas acusações:

Corrupção Passiva

A favor

» Marco Aurélio Mello

» Luís Roberto Barroso

» Rosa Weber

» Luiz Fux

» Alexandre de Moraes

Obstrução de Justiça

A favor

» Luís Roberto Barroso

» Rosa Weber

» Luiz Fux

» Marco Aurélio Mello