Correio braziliense, n. 20049, 12/04/2018. Política, p. 4

 

Pressão para transferir Lula

Bernardo Bittar

12/04/2018

 

 

UM PAÍS SOB TENSÃO » Por conta dos protestos e da dificuldade em atender à população, sindicato dos delegados quer que Lula passe a cumprir pena em quartel

O Sindicato dos Delegados da Polícia Federal do Paraná (Sindpf-PR) enviou ofício ao superintendente do Paraná, delegado Maurício Valeixo, pedindo que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seja transferido da sede da PF em Curitiba para uma unidade das Forças Armadas. Lula está preso na área central de Curitiba, onde ocupa sala especial e, diariamente, sua presença é motivo de tumultos causados por simpatizantes e opositores. Os delegados alegam que a permanência do ex-presidente no local provoca “transtornos e riscos à população e aos funcionários” e que a FAB, por ser mais afastada do centro da cidade, seria mais viável. Outro argumento é que a PF não é, “sob nenhum aspecto”, o lugar apropriado para cumprimento de sentença penal condenatória.

O ex-presidente ocupa uma sala transformada em cela, no último andar da PF, desde o último sábado, em cumprimento ao mandado expedido pelo juiz Sérgio Moro. Desde a chegada dele, a capital paranaense se tornou alvo de protestos a favor e contra a prisão. Centenas de pessoas entraram em conflito e os policiais usaram bombas e balas de borracha para dispersar manifestantes ainda no dia da prisão, deixando ao menos oito feridos. “Na sede, são realizados, além da rotina policial, atendimentos ao público, como emissão de passaportes e questões relacionadas a produtos químicos, segurança privada, armas e emissão de certidões de antecedentes criminais”, explica o documento enviado pelo sindicato dos delegados.

A entidade pondera que há comprovados riscos à população que reside no entorno do prédio da PF, aos policiais federais e aos demais integrantes do sistema de segurança pública que moram nas imediações, ao passo que alguns invasores, que já se instalaram com barracas e determinada estrutura, estão promovendo ações no sentido de intimidar as pessoas. O sindicato ressalta que policiais temem pelo bem-estar das famílias, lembrando que colegas informam extraoficialmente que “a segurança fica comprometida em face das ameaças e presença de tais manifestantes”.

Ainda sem destino definido, Lula quer receber visitas dos parentes. O ex-presidente pediu uma permissão para que os familiares possam comparecer semanalmente à cela especial que ocupa na PF — ou em qualquer outro lugar, pois a mudança de “endereço” não afetaria. Segundo o advogado Cristiano Zanin Martins, a ideia partiu dele. Apenas os filhos, filhas e netos estão na lista inicial formulada com as pessoas interessadas em visitar o petista. Não se sabe, entretanto, se o pedido do ex-presidente será atendido. E, se for, quando começa a valer. Pela regra, Lula pode receber visitas de advogados a qualquer dia da semana — menos sábados, domingos e feriados — e dos familiares, uma vez por semana, como ocorre com os demais encarcerados da PF. Os “presos comuns” podem ser visitados às quartas-feiras e Lula pediu para que sua família possa ir às quintas.

Sem dinheiro

A defesa do Instituto Lula informou que vai recorrer da decisão da 1ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo de bloquear bens do ex-presidente, de Paulo Okamotto, do Instituto Lula e da L.I.L.S., empresa de palestras do petista. A medida teria sido decretada para garantir o pagamento de dívida fiscal de quase R$ 30 milhões com a União. O débito de Lula, do instituto e da empresa de eventos seria de R$ 15 milhões. Já Okamotto, que é presidente do Instituto Lula, teria débito de R$ 14 milhões. Os envolvidos alegam que a medida é uma forma de dificultar a possibilidade de defesa do ex-presidente, que ficaria sem os valores bloqueados.

Barusco sem tornozeleiras

O ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, delator da Operação Lava-Jato, recebeu autorização judicial para tirar a tornozeleira eletrônica que o manteve sob monitoramento nos últimos dois anos. A decisão é da juíza da 12ª Vara de Execuções Penais de Curitiba, Carolina Lebbos. Barusco era gerente de Engenharia da Diretoria de Serviços da Petrobras, então sob comando de Renato Duque. Alvo da Lava-Jato, ele se livrou da prisão ao fechar acordo com o Ministério Público Federal. Barusco confessou ter recebido propinas de US$ 100 milhões de empreiteiras que integraram o cartel que assumiu o controle de contratos bilionários da Petrobras. O próprio delator abriu mão da fortuna que amealhou de forma ilícita. Os US$ 100 milhões que depositou em contas na Suíça já foram repatriados.

"Na sede, são realizados, além da rotina policial, atendimentos ao público, como emissão de passaportes e questões relacionadas a produtos químicos, segurança privada, armas e emissão de certidões de antecedentes criminais”

Trecho do ofício enviado pelo Sindicato dos Delegados da Polícia Federal do Paraná

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Análise do plano eleitoral

12/04/2018

 

 

Em busca de soluções para enfrentar os problemas eleitorais trazidos pela prisão de Lula, a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), marcou um encontro com o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad para traçar uma nova estratégia de comunicação. Haddad, que pode ser um eventual substituto nas urnas, até agora, é considerado apenas coordenador do programa de governo petista. A reunião da cúpula do partido tem como finalidade a procura de soluções para que Lula, de Curitiba, onde cumpre pena, possa avalizar o planejamento da legenda para as eleições presidenciais, que está em elaboração em São Paulo. A expectativa é de que o documento seja divulgado na próxima segunda-feira, quando ocorre o encontro de Gleisi com Haddad.

Poucas horas antes de se entregar à Polícia Federal, no sábado, Lula reuniu líderes petistas e de movimentos sociais que estavam na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, e comunicou que, durante sua ausência, Gleisi será a porta-voz para assuntos referentes ao PT. O gesto não teve tanta força, comentam petistas, porque Lula quer continuar dando a palavra final nas decisões que envolvem o programa de governo. “É aquele velho problema da política: estar aqui é bom demais. Ninguém quer abrir mão, ainda mais o ex-presidente Lula, com tudo o que representa”, explicou um deputado.

Alternativas

Uma saída cogitada pelos petistas é incluir a senadora e o ex-prefeito na defesa de Lula, porque os dois são advogados e, assim, teriam acesso irrestrito ao ex-presidente sem correr o risco de depender da Justiça para entrar na carceragem da Polícia Federal em Curitiba. Na última segunda, a executiva nacional do PT aprovou uma resolução na qual confirma que Gleisi será a porta-voz de Lula e diz que as negociações com outros partidos com vistas a alianças eleitorais serão decididas pela direção partidária. “Caberá à direção nacional do PT fazer as articulações com outros partidos, que serão conduzidas pela presidenta Gleisi Hoffmann, designada por Lula como sua porta-voz política até que ele recupere a liberdade”, diz a nota.

Petistas interpretaram o trecho como um sinal de que o partido quer excluir Haddad das conversas com outras legendas. O ex-prefeito vinha cumprindo essa função, a pedido de Lula, mas as articulações desandaram depois da condenação do ex-presidente pelo TRF-4, em janeiro. (BB)