Título: Crise não é de Brasília nem do PT
Autor: Queiroz , Agnelo
Fonte: Correio Braziliense, 13/04/2012, Política, p. 3

Foi em meio a uma das crises políticas mais graves no Distrito Federal que Agnelo Queiroz ganhou as eleições e assumiu o governo, em janeiro de 2011. Os eleitores o escolheram na expectativa de resgatar a paz institucional no DF, que andava por um fio. Desde o início de sua administração, no entanto, o petista vive às voltas tendo de se defender de denúncias. A mais recente delas é a que o vincula ao esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Diálogos interceptados pela Polícia Federal durante a Operação Monte Carlo sugerem que Agnelo Queiroz teria tentado manter contato com o contraventor. Em outras conversas, fica no ar a suspeição de que integrantes do GDF teriam colaborado com os interesses do esquema criminoso na área do lixo supostamente montado com a influência de Cachoeira. Em entrevista ao Correio, no entanto, Agnelo é categórico. Para o governador, há uma tentativa de puxá-lo para um escândalo que, segundo ele, pertence ao DEM, ao PSDB e tem como principal expoente o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO). "Essa crise é do DEM e do PSDB. Não é nem de Brasília, nem do PT. É especificamente de Goiás. Há uma tentativa que eu chamaria desesperada, porque pega fatos soltos, frágeis, contraditórios e inconsistentes." Agnelo garante que não há nada que o comprometa pessoalmente. Ele afirma ser favorável à abertura de uma CPI no Congresso que retome o foco das investigações da Polícia Federal, segundo o governador para "investigar a contravenção, o jogo do bicho, a interferência de um senador, que era o representante desse esquema no Senado Federal". Sobre Demóstenes, Agnelo registra: "É bom lembrar que Demóstenes, no epicentro desse escândalo, foi quem pediu o meu impeachment no ano passado. Se eu tivesse qualquer ligação com Carlinhos Cachoeira, a quem o senador atendia aos interesses, como os diálogos apontam, esse embate político não existiria".

Que avaliação o senhor faz sobre as denúncias de que teria uma relação com Carlinhos Cachoeira? Essa crise é do DEM e do PSDB. Não é nem de Brasília, nem do PT. É especificamente de Goiás. Há uma tentativa, que eu chamaria desesperada, porque pega fatos soltos, frágeis, contraditórios e inconsistentes. Tentam fazer uma ligação com o meu governo. Mas o Governo do DF não tem ninguém indicado por esse grupo. Tentativas foram feitas e frustradas, como as fitas hoje mostram. Não temos negócio com esse grupo de Cachoeira.

O senhor é o 01? Não. Isso é uma completa fantasia.

Mas houve tentativas do esquema de Cachoeira de indicar pessoas para o seu governo? Hoje, a gente sabe por fragmentos de gravações, realizadas em janeiro de 2011, quando da montagem do governo, que isso pode ter ocorrido. Hoje é que a gente fica sabendo. Mas não houve nenhum tipo de entrada no GDF.

O senhor falou em contradições. Pode citá-las? Incoerência é atribuir declarações de terceiros que tentam vender poder, influência, bravatas, vincular essas declarações com alguma realização do Distrito Federal. Mas não se encontra uma única relação de causa e efeito. Todas as informações liberadas até agora, eu tenho certeza absoluta, não têm nenhuma relação com o Distrito Federal. Tentou-se levantar uma relação com a Delta, uma empresa que cuida do lixo no DF. Essa é uma outra mentira. Essa empresa entrou no Governo do Distrito Federal por ordem judicial em dezembro de 2010, no governo passado. A Delta participou de uma licitação no governo Arruda em 2007 e, por ordem judicial, assumiu o contrato, portanto o que governador fez foi cumprir ordem judicial.

O senhor teria alguma ingerência para mudar esse contrato? Nenhuma, porque, se assim o fizesse, uma ação judicial devolveria o contrato para a empresa. Uma decisão judicial deve ser cumprida, foi o que Rogério Rosso (ex-governador) fez. Então, para entrar no meu governo, não precisava ter nenhuma influência, nenhum benefício para ninguém. A Delta cumpre o contrato. Só outra ordem judicial pode tirá-la. Por que eu digo que essa crise é do DEM e do PSDB? É de Goiás e não é de Brasília? O que a Polícia Federal investigou e esse amplo noticiário quer esquecer? Investigou o jogo, a contravenção, o caça-níquel e não tem nenhuma referência da influência desse negócio do Cachoeira aqui no Distrito Federal, nenhuma leniência, nenhuma colaboração com isso, em absoluto. É só ver fartamente na investigação da Polícia Federal. Se alguém tiver cometido alguma atitude não republicana no meu governo, que responda individualmente. No momento em que se descobre qualquer irregularidade, o caminho é a porta da rua.

Existe a chance de aparecer alguma gravação em que o senhor converse com Cachoeira? Não existe. Primeiro, tentaram passar um diálogo de que eu teria um pedido de audiência, que é um absurdo completo. Chegam a afirmar que a Polícia Federal diz que a pessoa sou eu. Isso também é mentira. É só ler o fac-símile da PF que fala "pode-se entender que é o Agnelo Queiroz". Nem a polícia, que faz uma investigação de um ano e meio ou mais disse, acompanhando todos os movimentos e as ações desse grupo, vai poder afirmar isso, porque é mentira. Eu, Agnelo, o governador, não pedi nenhuma conversa com Cachoeira. O senhor é a favor da CPI do Congresso? Sou a favor da CPI. A comissão retoma o rumo principal do que é o objeto, que é investigar a contravenção, o jogo do bicho, a interferência de um senador que era o representante desse esquema no Senado. Esse é o problema central. Defendo que tenha a CPI, porque, pelo menos, não vai existir o uso político de frases separadas, lacônicas para tentar vincular A ou B a esse grupo. É bom lembrar que Demóstenes, no epicentro desse escândalo, foi quem pediu o meu impeachment no ano passado. Se eu tivesse qualquer ligação com Carlinhos Cachoeira, a quem o senador atendia aos interesses, como os diálogos apontam, esse embate político não existiria.

O Ministério da Justiça mandou investigar os vazamentos do inquérito. A quem o senhor os atribui? Tenho certeza de que o objetivo dessa campanha, porque é uma campanha, é envolver o PT nesse escândalo dos jogos. Esse é o grande objetivo, vincular o nosso partido. É claro que vários adversários aproveitam isso para desestabilizar o Governo do DF, que está enfrentando com muita determinação o crime organizado, a desorganização e tudo o que ocorreu no passado por aqui. E tem muita gente que se beneficiou desses esquemas e que teve os interesses contrariados.

O senhor diz que essa é uma crise do DEM e do PSDB. Não acha que vai precisar do suporte de seu partido no Congresso para enfrentar esse momento? Como a própria lista de indiciados da Polícia Federal aponta, não há nenhuma relação entre o meu nome e essa investigação. Mas é evidente que, como trata-se de uma campanha de desestabilização envolvendo o PT nessa crise, eu preciso é, claro, de apoio, e tenho. Estive com o Rui Falcão (presidente nacional do PT) hoje (ontem) e as lideranças do PT. Tive o apoio da minha bancada toda da Câmara Legislativa, o suporte dos partidos que me apoiam aqui no Distrito Federal, porque o que estão tentando fazer é criar uma disputa política para nivelar essa crise que não nos pertence.

O senhor perdeu um importante assessor, o Cláudio Monteiro, que era o chefe de gabinete. Tem confiança de que ele não se envolveu diretamente nesse esquema? Tenho. Eu chamei o Cláudio e conversei com ele. Mas ele pediu para se afastar e para se defender. A acusação é feita por um diálogo de terceiros, que não é dele, falando que ele estava interferindo na indicação do presidente do SLU. Eu sei que isso não é verdade, porque eu indiquei o presidente do SLU, porque era um delegado e estava deixando a Secretaria de Segurança Pública, sem vínculo nenhum com esse segmento. Uma pessoa de passado limpo, pessoa idônea, que assumiu essa pasta, porque eu queria justamente colocar uma pessoa sem vínculo nenhum com esse segmento. Mas Cláudio Monteiro percebeu que o ataque não é a ele, mas ao Distrito Federal, entendeu isso, agora vai provar a inocência e, aí sim, voltar ao governo. Mas acho que essa é a atitude, porque nós não podemos deixar dúvida sobre o comportamento das pessoas.

Desde o início de sua gestão, o senhor está às voltas com crises políticas, respondendo denúncias. Como é possível resolver os problemas da segurança, educação, saúde, transporte nessas circunstâncias? Na saída do governo, o presidente Lula me disse que eu encontraria a pior situação do Brasil, entre os novos governadores. Mas só tive a dimensão dessa frase depois que entrei e vi uma situação dramática. Tenho enfrentado uma estrutura carcomida, viciada e muitos adversários, todos poderosos. Mas não tenho saída. Minha missão é essa. Botamos a casa em ordem em apenas um ano. Agora é o ano da gestão. Vamos melhorar a eficiência. Não tenho dúvida de que o Distrito Federal dará um grande salto de desenvolvimento econômico, social até o fim do meu governo.

Esse governo é melhor do que os anteriores? Quero que comparem o meu governo no fim do mandato. Não podemos comparar com outros tendo apenas um ano e meio de mandato, sobretudo na situação que encontrei. Mas tenho certeza de que vamos apresentar bons resultados. Nossos adversários fazem uma verdadeira campanha para imobilizar o governo. Mas isso não me abate. Estou enfrentando e vou continuar enfrentando.

A oposição fala em criar uma CPI do Cachoeira na Câmara Legislativa. O senhor acha que vinga? Essa é uma questão de investigação da Polícia Federal. É nacional. Atinge vários estados e se concentra mais em Goiás e no Rio de Janeiro. Não aqui. Há uma tentativa de vincular o Distrito Federal nessa crise, mas a própria lista da Polícia Federal mostra que não existe nenhum deputado federal, senador e governador do Distrito Federal envolvido. A lista da Polícia Federal mostra isso. Estão tentando colocar isso goela abaixo com o que chamei de falsas evidências, absolutamente forçadas. Não há sentido em investigar essas denúncias na Câmara Legislativa.

Marcello Lopes, o Marcelão, que nas escutas conversa com Dadá, o Idalberto Matias, era seu assessor? Não. É mais uma forçação de barra. Ele não é meu assessor. Não poderia porque nem o conheço. Ele foi indicado para a Casa Militar pelo Cláudio (Monteiro). Havia uma relação entre eles porque são policiais civis. Nem todos os comissionados são meus assessores, obviamente. Apenas aqueles que trabalham diretamente comigo. Não o conheço. Se ele entrar aqui, nem sei quem é. Ele ficou no governo apenas duas semanas neste ano. E esses diálogos captados pela Polícia Federal são anteriores à passagem dele pela Casa Militar.

E o Zunga, o João Carlos Feitoza, ex-servidor do GDF, que, segundo escutas de conversas do Dadá, teria pedido para marcar um encontro do senhor com Cachoeira? O senhor tem alguma relação com ele? Tenho. Eu o conheço porque ele é muito ligado ao esporte. Mas nunca pedi a ele que marcasse qualquer compromisso para mim.

Com a saída do Cláudio Monteiro, o cronograma de construção do estádio será alterado? Haverá algum prejuízo? Não tem prejuízo em absoluto. O Cláudio formou uma equipe que vai continuar trabalhando. A responsabilidade pelo comitê da Copa é minha porque sou o presidente e ele era o executivo. Vamos cumprir os prazos.

Já há um substituto para o comitê da Copa? Os técnicos que estão na equipe são pessoas que estão já trabalhando e vão continuar trabalhando, enquanto a gente faz uma mudança, caso demore esse esclarecimento em relação ao Cláudio e ele possa voltar.

E a chefia de gabinete? Não posso ficar sem chefe de gabinete. A Vera, minha secretária, está respondendo por enquanto, mas devo colocar outra pessoa porque o dia a dia do meu gabinete precisa ser resolvido.