Valor econômico, v. 17, n. 4418, 10/01/2017. Política, p. A6.

 

 

Planalto recorre ao Supremo para liberar posse de Cristiane Brasil

Andrea Jubé, Luísa Martins, Marcelo Ribeiro e Cristiane Bonfanti

10/01/2018

 

 

Com receio de perder o apoio do PTB à reforma da Previdência, o presidente Michel Temer assegurou ontem à cúpula do partido que não recuaria da indicação de Cristiane Brasil para o Ministério do Trabalho. Depois que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região manteve a suspensão da posse, o governo decidiu recorrer ao Supremo Tribunal Federal para tentar reverter a decisão judicial.

Na noite de ontem, a Advocacia-Geral da União (AGU) preparava o recurso que deve ser protocolado ainda nesta manhã e encaminhado à análise da presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. A indicação de Cristiane está mantida pelo governo até que o Supremo se posicione sobre o caso.

Para o STF, a ministra da AGU, Grace Mendonça, deve reforçar os mesmos argumentos feitos à segunda instância: a liminar concedida em uma ação popular afronta o princípio constitucional da separação de poderes e significa "grave lesão à ordem pública e administrativa".

Cristiane disse ontem ao Valor que é "zero" a chance de desistir da indicação ao ministério. Questionada se Temer havia cogitado outro nome para o seu lugar, ela foi assertiva: "Nem por um segundo!"

Temer mede os passos para não melindrar o presidente do PTB, Roberto Jefferson, condenado no Mensalão, que indicou a filha Cristiane para o ministério, com respaldo da bancada.

O raciocínio é matemático: dos 18 deputados da legenda, pelo menos 14 apoiam a reforma previdenciária. Jefferson recomendou o fechamento de questão e promete punir os parlamentares que contrariarem a orientação partidária.

A posse estava programada para 15 horas, mas o governo não conseguiu reverter o impedimento judicial em tempo hábil. O salão principal do palácio chegou a ser aprontado para a solenidade, caso a posse da ministra fosse autorizada pelo tribunal.

Por volta das 14 horas, Cristiane, Jefferson e o líder do PTB, deputado Jovair Arantes (GO), chegaram ao Planalto ainda com a expectativa de realização da posse, e se reuniram com Temer no gabinete presidencial. Também estavam presentes os ministros da Secretaria de Governo, Carlos Marun, e da Secretaria Geral da Presidência, Moreira Franco.

Jovair disse ao Valor ter "certeza" de que a presidente do Supremo irá rever as decisões das instâncias inferiores que barraram a posse. "Queremos que a decisão de escolher e nomear ministros, que é prerrogativa do presidente da República, seja respeitada", alegou. Ele acrescentou que em nenhum momento Temer solicitou um segundo nome ao partido em substituição ao de Cristiane.

Ontem, o desembargador Guilherme Couto de Castro, vice-presidente do TRF da 2ª Região, afirmou que a suspensão da posse de Cristiane "não tem o condão de acarretar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública", conforme havia argumentado a AGU no recurso.

Com base nesses argumentos, Castro manteve a decisão do juiz Leonardo Couceiro, da 4ª Vara Federal Criminal de Niterói, que barrou a posse da nova ministra.

Segundo o magistrado de primeira instância, o fato de Cristiane ter sido condenada, em 2016, a pagar R$ 60,4 mil em dívidas trabalhistas a dois ex-motoristas fere o princípio da "moralidade administrativa" e a inabilita para comandar o Ministério do Trabalho.

Os funcionários não tiveram as carteiras assinadas durante o tempo em que prestaram serviços para a deputada federal. "Vislumbra flagrante desrespeito à Constituição Federal no que diz respeito à moralidade administrativa quando se pretende nomear para um cargo de tamanha magnitude pessoa que já teria sido condenada em reclamações trabalhistas", escreveu o juiz.

O magistrado reconhece que o Judiciário não deve interferir em decisões administrativas do Executivo, mas pondera que "o juiz deverá agir sempre que a conduta praticada for ilegal ou, mais grave ainda, inconstitucional". Ele fixou multa de R$ 500 mil em caso de descumprimento.