Valor econômico, v. 17, n. 4422, 16/01/2017. Brasil, p. A2.​

 

 

Empecilos à venda da Eletrobras dificultam retomada de Angra 3

Rodrigo Polito

16/01/2018

 

 

As dificuldades no Congresso e na Justiça para o avanço do plano do governo de privatização do controle da Eletrobras afetam a retomada da construção da usina nuclear de Angra 3, segundo uma fonte ligada à estatal. Sem a desestatização da elétrica, tudo indica que a decisão relativa à conclusão da terceira usina nuclear brasileira, cujas obras estão interrompidas desde setembro de 2015, demore ainda mais.

"A indefinição sobre a [privatização da] Eletrobras é um complicador [para a retomada das obras de Angra 3]", afirmou a fonte, sob condição de anonimato.

O projeto de lei sobre a privatização do controle da Eletrobras, que encontra-se na Casa Civil, prevê a segregação da Eletronuclear, braço de geração de energia nuclear, e da hidrelétrica binacional de Itaipu da holding, ante do processo de venda do controle da elétrica. A ideia principal é deixar Eletronuclear e Itaipu sob o comando de uma nova estatal.

Em novembro, o secretário-executivo do ministério de Minas e Energia, Paulo Pedrosa, havia dito que a modelagem de privatização da Eletrobras conteria uma solução para a retomada das obras de Angra 3. "Esperamos que, nesse processo de privatização, Angra e o projeto nuclear precisarão ser segregados. E esse processo de segregação pode nos permitir uma solução para Angra 3", disse ele, na ocasião, no Rio.

O problema é que o Congresso tem dado sinais contrários à aprovação da privatização da Eletrobras. O primeiro sinal foi a forte reação negativa à Medida Provisória 814/2017, que inclui um artigo que permite a inclusão da Eletrobras e suas controladas no Plano Nacional de Desestatização (PND). Além disso, este artigo teve o efeito suspenso na última semana, por meio de liminar concedida pela Justiça Federal em Pernambuco.

Além da necessidade de definição sobre governança da Eletronuclear, também é necessária para a retomada das obras de Angra 3 a revisão do contrato de venda de energia da usina, elevando seu preço dos atuais R$ 240 por megawatt-hora (MWh) para algo em torno de R$ 400/MWh. Segundo a fonte, a correção tornaria o projeto novamente viável do ponto de vista econômico, possibilitando a parceria com uma empresa privada para a conclusão das obras.

Conforme o Valor apurou, três grupos estrangeiros estão interessados em firmar uma parceria para concluir Angra 3: a russa Rosatom, a chinesa CNNC e o consórcio franco-japonês EDF / Mitsubishi. Na prática, a ideia é que o sócio privado aporte os recursos necessários para a conclusão da obra em troca de uma participação no empreendimento. Estima-se que são necessários R$ 13 bilhões para concluir o empreendimento, que tem índice de conclusão das obras de 65%.

O reajuste do preço da energia de Angra 3 pode ser feito pelo próprio ministério de Minas e Energia. O Valor apurou, porém, que o ministro Fernando Coelho Filho quer que o tema passe pela aprovação da Casa Civil e do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

As obras da terceira usina nuclear brasileira foram interrompidas em setembro de 2015, por indícios de irregularidades em contratos investigados pela operação "Lava-Jato", da Polícia Federal, e pela falta de pagamento a fornecedores da obra.

De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2026, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Angra 3 está prevista para entrar em operação apenas em 2026.

Além da necessidade de investimentos para concluir Angra 3, a definição sobre a retomada do projeto é fundamental para a Eletronuclear, do ponto de vista financeiro. Desde outubro do ano passado, a companhia está pagando mensalmente ao BNDES um valor de R$ 30 milhões relativo a juros da dívida de construção da térmica. A subsidiária da Eletrobras tem financiamento de R$ 6,15 bilhões com o banco estatal. Desse total, foram sacados cerca de R$ 2,8 bilhões, sob os quais incidem os juros cobrados atualmente pelo BNDES.