Correio braziliense, n. 20060, 23/04/2018. Política, p. 3
Sem MP, governo busca alternativas
Vera Batista
23/04/2018
A Medida Provisória (MP 808/17) que redefinia 17 pontos controversos da reforma trabalhista (Lei 13.467/17) perde hoje a validade. Com isso, as relações entre patrões e empregados ficam em um limbo, segundo analistas. Nem os empresários nem os funcionários, e muito menos os membros do Poder Judiciário, têm certeza de como deverão se portar em relação ao assunto. É o que eles chamam de insegurança jurídica. Apesar de não ter feito esforço algum para a MP ser aprovada no Congresso, o governo, agora, anunciou que vai editar por decreto, projeto de lei ou portaria ministerial algumas pílulas restauradoras do impacto das alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O ministro do Trabalho, Helton Yomura, admitiu que não será editada nova MP. “Seria muito desgastante para o Congresso.” Mas disse que está estudando alternativas. “O que puder fazer por decreto, vamos fazer. O que não puder, estudaremos o ambiente legislativo. Não devemos juntar numa medida só, até para ter uma viabilidade”, destacou. A Casa Civil, por meio de nota, confirmou que, por enquanto, a área técnica está levantando os pontos que podem ser regulamentados por decreto. “Ainda não há nada que podemos adiantar. Não há prazo para a entrega. Talvez na próxima semana ocorra uma reunião técnica para iniciar as tratativas.”
“Lavaram as mãos. Nem Executivo nem Legislativo vão levar o assunto para frente”, assinalou Paula Santone Carajelescov, sócia na área Trabalhista do Rayes & Fagundes Advogados Associados. Para ela, os dois poderes se acomodaram e vão esperar o sinal do Judiciário. “É mais fácil o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Supremo Tribunal Federal (STF) tomarem a iniciativa, como aconteceu com a terceirização, por exemplo.” O TST formou uma comissão — teve o prazo de conclusão dos trabalhos prorrogado por 30 dias na última sexta-feira — para estudar a aplicação da reforma. Com isso, a partir desta segunda-feira, na prática, entra em vigor a Lei 13.467/17. Ou seja, mulheres grávidas e lactantes podem trabalhar em ambientes insalubres. Patrão e empregado negociarão diretamente a jornada de 12 horas por 36 horas, sem a presença do sindicato. E permanece a dúvida se as novas normas interferem nos contratos anteriores a 2017, entre outras.
Para a advogada trabalhista Ana Paula Barbosa Pereira, do Nelson Wilians e Advogados Associados, o governo tem que fazer alguma coisa, e muito rápido. “É difícil acreditar que quem criou essa armadilha e deixou a MP caducar vá fazer restaurações pontuais menos de seis meses depois. Mas não quero pensar que essa bagunça se prolongará até 2018.”.
Luis Fernando Riskalla, sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, aponta que a não conversão da Medida Provisória nº 808 em lei pode significar considerável obstáculo no avanço e no aperfeiçoamento das normas trabalhistas. Thais Riedel, do escritório Riedel Advogados Associados, acredita que, a esta altura e com a disputa que começa a se delinear entre o presidente Michel Temer e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, não deverá sair nem decreto, nem projeto de lei ou portaria. “O governo vai empurrar com a barriga e manter sem culpa essa insegurança jurídica.”