O globo, n. 30923, 06/04/2018. País, p. 8

 

'Sem atalhos' - Jungmann defende Villas Bôas

Maria Lima e Mateus Coutinho

06/04/2018

 

 

Ministro da Segurança Pública diz que comandante do Exército é ‘soldado exemplar’ e que não há risco para a democracia

-BRASÍLIA- O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, voltou a negar a intenção do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, de pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do habeas corpus do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva ou de levar adiante ações para tentar um “um atalho democrático”.

Um dia antes do julgamento, Villas Boâs questionou, em sua conta no Twitter, “quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais”.

Em seguida, escreveu: “Asseguro à Nação que o Exército brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem em repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às missões institucionais.”

As declarações foram criticadas por organizações como a Anistia Internacional, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Durante o julgamento do habeas corpus, o ministro Celso de Mello também recriminou a fala do general, e disse que o respeito à Constituição é “indeclinável”.

— Repito, não houve qualquer pressão do general ou menção sobre atalho no processo democrático. A gente vai, junto com todos os brasileiros, decidir com muita alegria qual será o futuro do Brasil em outubro, porque isso ninguém vai tomar dos brasileiros e brasileiras. A democracia é algo consolidado e irreversível — declarou Jungman.

As declarações foram dadas após um encontro com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e com o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), para discutir problemas de segurança no estado. Na quarta-feira, Jungmann já havia minimizado a possibilidade de uma ditadura militar. Na manhã de ontem, ele participou de um evento com Villâs Boas, no Clube Militar.

Sobre os apoios dados por outros generais à fala de Villas Bôas, o ministro disse que não há hoje uma força relevante que possa interferir no processo democrático.

— Muitas vezes a gente vive ansiedades, dificuldades, tropeços, mas a caminhada da democracia do Brasil ninguém vai obstar, até porque não existe nenhuma força relevante, importante, hoje que possa estar apostando no sentido contrário — garantiu.

Jungmann também minimizou o silêncio do presidente Michel Temer sobre o episódio. Líderes do PT cobraram, no Senado, a demissão do general.

— Villas Bôas é um soldado exemplar, um líder respeitado e um democrata, reúne virtudes muito republicanas. Não vejo por que Temer tenha que se pronunciar sobre a fala, um tuíte do comandante do Exército — defendeu o ministro.

NO CENTRO DAS ATENÇÕES

O comandante do Exército foi o centro das atenções em uma cerimônia realizada em Brasília na manhã de ontem. O evento — uma cerimônia de entrega de espadas aos novos generais de Brigada — ocorreu na sede do Lago Sul do Clube Militar de Brasília. O general ficou no centro do púlpito, ao lado dos ministros Raul Jungman e Joaquim Silva e Luna (Defesa). Nenhum deles quis falar com a imprensa.

No auditório do evento, o clima era de alívio com a decisão do STF. Após a passagem das espadas, os militares das três forças, familiares e convidados se aglomeraram para cumprimentar o comandante, formando uma longa fila no centro do salão. O general recebeu todos para cumprimentos e tirou até fotos, ao lado de sua filha que o acompanhava. Os ministros, por sua vez, deixaram o local logo após o fim da cerimônia.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

 

Tiro em ônibus de Lula foi de calibre 32

06/04/2018

 

 

Polícia ouviu 15 testemunhas, mas não tem suspeitos de ataque no Paraná

-CURITIBA- O atirador que atacou um ônibus da caravana do expresidente Lula no Paraná, em 27 de março, usou uma arma antiga, de calibre 32, estava a cerca de 19 metros de distância do alvo e a aproximadamente 4,5 metros de altura. Os dois tiros foram dados quando o veículo já havia passado por ele. Os dados estão no relatório das perícias apresentadas ontem pela Polícia Científica do Paraná.

Foram encontrados dois projéteis, que atingiram o lado direito do ônibus — um na lataria e outro no vidro. O ataque aconteceu entre Quedas do Iguaçu, no oeste do Paraná, e Laranjeiras do Sul, na região central.

O delegado responsável pelo inquérito, Helder Lauria, diz que ainda não há suspeitos sendo investigados, mas que já ouviu 15 testemunhas, entre integrantes da caravana e policiais rodoviários estaduais.

De acordo com o perito criminal Inajar Kurowski, um dos projéteis foi encontrado dentro da lataria do ônibus. A bala só não atingiu o interior do veículo porque foi barrada por uma placa de aço e porque o projétil e a arma eram de baixo impacto. Supostamente, a arma utilizada nos disparos é parecida com uma “garrucha”.

— Tudo indica que era uma arma obsoleta, com munição de calibre .32. É uma arma que já saiu de fabricação há muito tempo. Nem a arma nem a sua munição são mais fabricadas, e as pessoas as mantêm, às vezes, como coleção ou herança — disse o perito.

Já o tiro que atingiu o vidro do veículo foi “de raspão” e, conforme indícios, pode ter ricocheteado para a frente do carro, destruindo parte do retrovisor. O especialista indica ainda que é impossível apontar se o veículo estava em movimento no momento do impacto.

— A desproporção entre a velocidade do alvo e a do projétil é tão grande que não há uma marca dizendo se o veículo estaria em movimento ou não — conta.

Dois pneus do mesmo ônibus atingido pelos disparos foram furados por “miguelitos”. Na sua lataria, foram identificadas marcas de chutes e pedradas.

A perícia analisou ainda imagens da praça de pedágio, no Km 464, em Laranjeiras do Sul, mas o laudo restou inconclusivo, devido à baixa qualidade dos vídeos.

— As imagens impossibilitam o pronunciamento categórico quanto à presença ou não dos disparos (na praça de pedágio) — explicou o perito Lucas de França.

INQUÉRITO SEM PRAZO

As imagens foram analisadas quadro a quadro, com tratamento digital, para tentar evidenciar se os disparos foram feitos antes da passagem do ônibus pela praça de pedágio, o que poderia ajudar a chegar aos responsáveis. Em alguns quadros, como aponta França, é possível identificar pontos que poderiam caracterizar as marcas de disparos, contudo, em quadros seguintes, as marcas não foram identificadas.

O delegado Helder Lauria diz que não há prazo para apresentar o inquérito final. Ele aponta que a identificação do calibre da arma pode levar ao atirador.

— Se for apreendida alguma arma, podemos fazer o confronto. Além disso, sabendo a posição do atirador, podemos voltar ao suposto local apontado pelas vítimas para verificar se o disparo foi realizado dali mesmo (...). Estamos buscando a autoria para, assim, saber a motivação do crime — concluiu o delegado.