Título: Os riscos da concentração bancária
Autor: Lima , João Heraldo
Fonte: Correio Braziliense, 13/04/2012, Opinião, p. 15

Na manhã de 15 de setembro de 2008 caiu a primeira peça de um dominó que desencadeou uma crise financeira sem precedentes. A falência do centenário banco americano Lehman Brothers revelou ao mundo as falhas sistêmicas de um mercado que operava sem rígidos controles.

Foi com uma crise dessa dimensão, da qual muitos países ainda não se recuperaram, que os bancos centrais começaram a discutir o aprimoramento das normas que regem um dos setores mais estratégicos para o crescimento econômico. A percepção da necessidade de regras mais rígidas resultou no Acordo de Basileia 3. Entretanto, é preciso cautela na dosagem dessas medidas para o sistema financeiro brasileiro, um dos mais austeros do mundo no que compete à formulação e cumprimento de normas. Sem dúvidas, Basileia 3 pode trazer muitas contribuições, mas, se subirmos demais o nível das exigências, corremos o risco de inverter o propósito do acordo, agravando um problema que tem afetado a qualidade do nosso mercado: a concentração bancária.

O Banco Central brasileiro colocou em audiência pública as novas normas que devem reger o mercado. Do ponto de vista dos bancos pequenos e médios, o órgão regulador tem mostrado pouca flexibilidade quanto à aplicação de padrões ainda mais rígidos.

Calibrar a regulação de acordo com o porte das instituições pode, eventualmente, trazer benefícios para a competitividade do sistema financeiro do país.

É de suma importância que os bancos elevem os níveis de solvência, mas não se pode deixar que as regras, que são facilmente absorvidas pelos grandes bancos, prejudiquem o segmento de pequenos e médios.

A experiência evidencia que quanto maior for o número de empresas que oferecerem um mesmo serviço, maior será a necessidade de criar diferenciais para atrair e fidelizar clientes. A competição, portanto, eleva a eficiência e a qualidade de um setor.

Nesse contexto, o sistema bancário brasileiro só está perdendo força. O Brasil conta com apenas 157 bancos — dos quais cinco concentram, sozinhos, mais de 70% dos ativos do mercado.

Embora tal concentração bancária tenha se revelado um fenômeno mundial, evidenciado pela crise financeira, a comparação com outros países comprova a urgência que temos em aperfeiçoar o setor no Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, há 6.529 instituições, ou um banco para cada 47,3 mil habitantes.

Até os nossos pares latino-americanos são mais competitivos. Enquanto a média brasileira é de um banco para cada 1,2 milhão de habitantes, na Argentina há uma instituição para cada 527,6 mil habitantes; no Chile, uma para cada 686,3 mil habitantes.

Como a crise deixou evidente, a concentração bancária brasileira não torna necessariamente o mercado financeiro mais sólido.

O fenômeno da concentração bancária, marcado por sucessivas fusões e aquisições, afeta diretamente as pequenas e médias empresas, pois são os agentes econômicos mais dependentes dos bancos de nicho. O middle market é responsável por mais de 56% dos empregos gerados na economia a cada ano, segundo dados do Ministério do Trabalho. Um segmento tão expressivo, portanto, precisa de incentivos para crescer.

Quem atende melhor essa demanda são os bancos pequenos e médios, pois têm mais expertise na oferta de produtos direcionados. Por conta de um atendimento pessoal e especializado, as instituições financeiras menores conseguem acompanhar as transformações que seus clientes enfrentam ao longo de todo o processo de maturação dos negócios. Com isso, assumem um compromisso de longo prazo com as empresas, contribuindo para a evolução do mercado.

Segundo dados do Banco Central, somente nos últimos três anos perdemos cinco bancos médios brasileiros para o movimento de fusões e aquisições. Hoje, o país conta com 34 instituições desse porte. O dado requer atenção, pois a tendência é que o fenômeno se estenda com o enrijecimento das normas que regem o sistema financeiro.

Somente a pulverização da oferta de crédito pode elevar a concorrência entre os bancos e, dessa forma, reduzir o custo de investimento das empresas que mais dependem de recursos. Afinal, mais importante do que simplesmente crescer, é garantir que o crescimento do país se mantenha no longo prazo. A atuação dos bancos de pequeno e médio porte converge com essa fundamental missão.