Valor econômico, v. 17, n. 4450, 27/02/2018. Político, p. A9.​

 

 

Wagner, possível 'plano B' de Lula, é alvo de operação da PF

Renato Alban

27/02/2018

 

 

O ex-ministro e ex-governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), atual secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado, teria recebido R$ 82 milhões, entre propina e caixa dois, do consórcio responsável pela demolição, reconstrução e gestão da Arena Fonte Nova, em Salvador, de acordo com a Polícia Federal.

A suspeita é resultado da Operação Cartão Vermelho, que cumpriu ontem mandados de busca e apreensão em sete endereços em Salvador, inclusive na residência do petista. Wagner é frequentemente citado como alternativa para a candidatura presidencial, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já condenado em segunda instância, seja considerado inelegível.

De acordo com a PF, o dinheiro foi pago ao ex-governador pelas construtoras Odebrecht e OAS, que faziam parte do consórcio da Fonte Nova. No total, o superfaturamento das obras do estádio foi de R$ 450 milhões, segundo a delegada da PF à frente do caso, Luciana Matutino. Ainda são investigados todas as destinações desse montante.

A fatia dirigida ao ex-ministro foi transferida entre 2006 e 2014, segundo Matutino. "O governador à época recebeu boa parte do valor desviado do superfaturamento para campanha eleitoral e propina". Dos R$ 82 milhões, R$ 78,5 milhões teriam sido em propina e R$ 3,5 milhões em doação oficial para a campanha do agora governador da Bahia, Rui Costa (PT), em 2014. A delegada afirmou que Costa, no entanto, ainda não é alvo da ação deflagrada ontem.

De acordo com a polícia, a maior quantia da propina foi paga em espécie e há provas materiais da entrega desse dinheiro, como mensagens de celulares confirmando o recebimento. Uma das remessas, de R$ 500 mil, teria sido entregue na casa da mãe do ex-governador, no Rio de Janeiro. O responsável pelo repasse do dinheiro, segundo Matutino, era o ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho.

Segundo Matutino, o presidente da construtora na época do superfaturamento das obras da Fonte Nova, Marcelo Odebrecht, disse que só doaria para campanha eleitoral de 2014 se Wagner resolvesse dívidas relacionadas ao estádio e a um órgão do governo da Bahia, a Companhia de Engenharia Ambiental e de Recursos Hídricos da Bahia (Cerb).

"A construtora embutiu parte do valor do superfaturamento [da Fonte Nova] na resolução da dívida da Cerb", disse Matutino. De acordo com as delações da Odebrecht, em acordo judicial para pagamento da dívida da Cerb à construtora, foram acrescidos R$ 60 milhões referentes à aceleração das obras da Fonte Nova para a Copa das Confederações. O total do acordo pago pelo governo foi de R$ 290 milhões.

Na operação, foram apreendidos documentos e mídias na Governadoria, na Secretaria de Desenvolvimento Econômico e nas casas e no trabalho dos envolvidos. Wagner foi indiciado ontem mesmo pela Polícia Federal por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Além de Wagner, outros dois indiciados foram revelados ontem pela PF: O atual secretário da Casa Civil da Bahia, Bruno Dauster, e o empresário Carlos Daltro, amigo do ex-governador. Os dois já foram funcionários do grupo OAS.

A PF havia pedido a prisão de Wagner, Dauster e Daltro, mas o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) negou. A operação apreendeu 15 relógios na casa de Jaques Wagner. De acordo com a delegada, a investigação mostrou que o ex-governador e outros envolvidos recebiam relógios de luxo da Odebrecht como propina. Ainda será apurado, no entanto, se os itens encontra- dos ontem têm relação com o caso.

Wagner negou ter recebido propina ou doação de campanha ilegal e disse que não houve superfaturamento. "É parte da politização que virou o processo de investigação", afirmou. Wagner afirmou ainda que não existe superfaturamento em parcerias público-privadas (PPP), que foi o caso da Fonte Nova. "Não sei de onde a delegada tirou esses R$ 82 milhões".

Advogado de Wagner, Pablo Domingues afirmou que o estudo da Universidade Federal da Bahia (UFBA) que aponta as irregularidades e foi base do inquérito da PF não considera no cálculo do custo da Fonte Nova serviços prestados pelo consórcio, apenas a obra em si.

O ex-governador também disse que os relógios apreendidos não são "de luxo", como apontou a delegada. "Vou aguardar o final desse processo e vou me defender com tranquilidade. A Polícia Federal está dando credibilidade a réus confessos", disse Wagner.

Em nota, a Fonte Nova Negócios e Participações (FNP), concessionária responsável pela gestão do estádio, e a Odebrecht informaram que estão à disposição para colaborar nas investigações. A construtora declarou que "está comprometida a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas". A OAS enviou nota informando que a empresa não vai se manifestar sobre o caso.

A reportagem entrou em contato com o secretário Bruno Dauster e a Cerb, mas não teve retorno. O empresário Carlos Daltro não foi localizado