Valor econômico, v. 17, n. 4448, 23/02/2018. Brasil, p. A6.​

 

 

MPF apura elo de supostas contas de Paulo Preto com obras viárias em SP

André Guilheme Vieira

23/02/2018

 

 

O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo apura se há conexão entre R$ 116 milhões mantidos na Suíça que teriam como beneficiário o suposto operador do PSDB, Paulo Vieira de Souza, o 'Paulo Preto', e R$ 10 milhões que teriam sido desviados de reassentamentos realizados pelo governo de São Paulo, a partir de 2009, no eixo de obras do trecho Sul do Rodoanel, da rodovia Jacu-Pêssego e da nova Marginal Tietê. Souza foi diretor de Relações Institucionais da Desenvolvimento Rodoviário SA (Dersa) - empresa de Transportes controlada pelo governo paulista - de julho de 2005 a maio de 2007, e diretor de Engenharia de maio de 2007 a abril de 2010. Nesse período o Estado foi governado por Geraldo Alckmin e pelo hoje senador José Serra (PSDB-SP).

A investigação é conduzida pela força-tarefa da Lava-Jato que atua no MPF de São Paulo.

Em outubro os investigadores obtiveram autorização judicial que ordenou a quebra do sigilo bancário de Paulo Preto e o sequestro de valores do investigado, por meio do bloqueio de ativos de quatro contas bancárias que em 7 de junho de 2016 somavam 35 milhões de francos suíços (equivalentes a R$ 116 milhões na cotação atual) e que em fevereiro deste ano foram transferidos para um banco em Nassau, nas Bahamas, o Deltec Bank And Trust Limited. As informações bancárias foram remetidas ao MPF por autoridades suíças, por meio de acordo de cooperação penal internacional firmado pelas procuradoras da República Thaméa Danelon e Anamara Osório.

As quatro contas foram abertas em 2007 no banco suíço Bordier & Cie, "em nome da offshore panamenha Groupe Nantes SA, cujo beneficiário é o investigado Paulo Vieira de Souza", registra decisão da juíza da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo, Maria Isabel do Prado.

Em seu despacho, a magistrada ressaltou "a presença de fortes indícios de materialidade e autoria da prática de crimes de peculato e falsidade ideológica, tendo em vista as irregularidades nos pagamentos de indenizações por obra pública, comprovadas nas investigações em curso".

A juíza também afirmou, no despacho, que houve "enriquecimento injustificado do investigado no mesmo período, em prejuízo ao erário público". O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda comunicou "operações suspeitas e atípicas" de Paulo Preto. O então diretor da Dersa movimentou mais de R$ 2,5 milhões entre 2009 e 2010, "revelando patrimônio incompatível com o cargo público ocupado", conforme a decisão de Maria Isabel do Prado.

De acordo com a magistrada, dois inquéritos do MPF indicam "fortes indícios" de que, entre 2009 e 2012, Paulo Preto teria realizado "cadastros fictícios de supostos moradores" contemplados pelo Programa de Compensação Social e Reassentamento Involuntário, "com finalidade de apropriação ou desvio de valores públicos destinados às atividades da referida empresa [Dersa]". A investigação foi iniciada pelo Ministério Público estadual de São Paulo (MP-SP), mas ficou com o MPF por envolver verbas federais de R$ 138,4 milhões de convênio assinado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) com o Estado de São Paulo. Os valores foram repassados de abril a dezembro de 2002, registra o Portal da Transparência.

Procurado, o advogado de Paulo Preto, Daniel Bialski, disse que a investigação do MP-SP não apurava desvio de valores, mas "o suposto favorecimento para beneficiar seis empregadas da família de Paulo Souza [com assentamentos]".

Para o criminalista, a investigação não se sustenta. "O MPF usou esse fato para tentar continuar a investigar o Paulo e outros, mesmo sabendo que existe investigação no Supremo Tribunal Federal e que o ministro Gilmar Mendes determinou a remessa desse expediente para lá". Serra e o chanceler Aloysio Nunes são alvos de inquérito desdobrado das delações da Odebrecht que estão sob relatoria de Gilmar. Bialski sustenta que os casos estão relacionados e quer que a investigação sobre Paulo Preto suba ao STF.

Em nota, a Dersa afirmou que a empresa e o governo paulista "são os grandes interessados no andamento das investigações e ressarcimento de eventuais danos que venham a ser apurados". E que "todas as obras realizadas pela Companhia foram licitadas obedecendo-se à legislação em vigor". Ainda segundo a Dersa, "se houve conduta ilícita com prejuízo aos cofres públicos, o Estado irá cobrar as devidas responsabilidades, como já agiu em outras ocasiões". No comunicado, a companhia disse ainda que criou seu departamento de auditoria interna em 2011, instituindo um código de ética.

A assessoria de Serra disse que o senador "não tem nenhuma relação com esses fatos apontados".