Título: Pedido para a Unesco voltar
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 20/03/2012, Cidades, p. 23

Depois da passagem de uma comitiva da Unesco pela cidade, o Governo do Distrito Federal vai pedir à organização que realize uma nova inspeção em Brasília daqui a dois anos. O GDF vai enviar um ofício ao Centro de Patrimônio Mundial, em Paris, para solicitar uma visita em 2014. O objetivo do governo local é mostrar à Unesco os avanços que pretende fazer até lá. Após circularem pela cidade durante quatro dias, na semana passada, os especialistas enviados pela entidade farão um relatório, que será entregue em junho. O governo afirmou que pretende seguir à risca todas as recomendações para manter o título de patrimônio mundial da humanidade.

Na última visita, realizada em 2001, a Unesco elaborou um relatório sobre os problemas encontrados na cidade. Mas, de lá para cá, houve poucas mudanças. À época, os especialistas da Organização das Nações Unidas sugeriram que o governo tomasse medidas rígidas para evitar a ocupação residencial à beira do lago e o desvirtuamento da Vila Planalto. Essas são algumas das mais graves agressões ao tombamento verificadas na capital federal. A situação piorou na última década e esses temas devem ser incluídos novamente no próximo relatório. Outro ponto que foi incluído no documento de 2001 e provavelmente constará entre as novas recomendações é a má qualidade do transporte público em Brasília. Para a Unesco, melhorar as condições de circulação da cidade é essencial para que a cidade possa manter o título de patrimônio mundial da humanidade.

Para o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Geraldo Magela, houve grandes avanços na última década. Ele acredita que o governo deu informações satisfatórias e conseguiu prestar contas sobre todos os questionamentos feitos pelos dois consultores indicados pela organização — o argentino Luís Maria Calvo e o espanhol Carlos Sambrício. "Tentaram criar um clima de caos que não existe de fato. Enviaram denúncias, desenharam um quadro irreal, mas conseguimos demonstrar que a situação atual é muito melhor do que a encontrada pelos outros consultores que vieram em 2001", afirma o secretário.

Acompanhamento Sobre a solicitação de uma nova visita daqui a dois anos, Magela explica que o ideal é fazer um acompanhamento periódico, para que o governo possa ter orientações sobre como agir para proteger o patrimônio. "Brasília é uma cidade viva, não é bom termos que esperar mais de dez anos por uma missão da Unesco. O monitoramento da cidade tem que ser feito por nós, com muito rigor, e também vamos convidá-los a voltar em 2014 para ver o resultado dos nossos trabalhos para revitalizar a Avenida W3, a área central, e outros projetos que sairão do papel, como a implantação do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos)", justifica o secretário. "Não podemos frear o desenvolvimento, mas podemos fazer isso com planejamento, de forma a garantir a proteção ao tombamento. E essas ações devem ser tomadas pelo GDF, mas também pelo governo federal e pela sociedade", finaliza o secretário.

Durante a missão realizada em Brasília, que durou de terça a sexta-feira da semana passada, os especialistas da Unesco visitaram cartões-postais da cidade, como a Igrejinha e a Ponte JK, além da SQS 308, superquadra considerada modelo do projeto do Plano Piloto, desenhado por Lucio Costa. Também viram de perto a situação de abandono da Avenida W3, observaram as invasões de áreas públicas nos fundos das lojas da Asa Sul e conheceram a polêmica proposta de construção de hotéis de até 15 andares na Quadra 901 Norte. Sambrício e Calvo realizaram ainda várias reuniões com representantes do governo federal e da comunidade, como prefeitos de quadra e presidentes de entidades de defesa do tombamento.

Mobilização O grande interesse da sociedade despertado pela chegada de consultores impressionou a coordenadora de Cultura da Unesco no Brasil, Jurema Machado. Para ela, a repercussão da missão na mídia nacional e a mobilização da sociedade mostram o grande interesse da sociedade pela preservação do patrimônio. "Me impressionou muito a dimensão que essa visita tomou. Isso tem um aspecto positivo e mostra que cada vez mais o tema da preservação do patrimônio preocupa a sociedade. Mas, por outro lado, esse interesse mostra que existia uma demanda reprimida e que a população está frustrada com os problemas acumulados nos últimos anos", explica Jurema Machado.

A coordenadora da Unesco lembra que muitas das demandas apresentadas pela comunidade durante a visita não têm relação com a atuação da organização, nem com o tema do patrimônio mundial. "As pessoas superestimaram a nossa atuação, muitas coisas só podem ser resolvidas pelo governo local. Essa grande expectativa das pessoas com relação à preservação do patrimônio é interessante e acho que vale até como estudo de cientistas sociais. O papel da missão foi dar vazão à insatisfação da comunidade", finalizou a coordenadora da Unesco.