Valor econômico, v. 17, n. 4451, 28/02/2017. Política, p. A6.​

 

 

Para FHC, quem for candidato do mercado vai perder a eleição

Cristiane Agostine

28/02/2018

 

 

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ontem que quem for o "candidato do mercado" vai perder a disputa pela Presidência, por representar apenas a elite brasileira. FHC minimizou a importância do anúncio dos economistas que participarão das campanhas, como já fizeram os pré-candidatos Geraldo Alckmin (PSDB) e Jair Bolsonaro (PSC-RJ), e disse que a população não está interessada nisso.

"Desses candidatos, quem for o candidato do mercado vai perder. É simbolizado como se fosse dos ricos. Daí acabou", afirmou Fernando Henrique ontem, ao participar de fórum promovido ontem pelo jornal "O Estado de S. Paulo", na capital paulista. "O país não é composto pelo mercado só, nem pelos ricos", afirmou. Em seguida, o tucano disse que o candidato ideal deve fazer com que a população tenha confiança no futuro e se sinta "mais segura".

O ex-presidente evitou fazer uma defesa enfática da candidatura Alckmin e disse que ainda é preciso ver qual candidato terá a capacidade de aglutinar a centro-direita do espectro político. "Inclusive já disse que é preciso ver quem é que vai ter essa capacidade", afirmou. Para FHC, Alckmin tem condições de vencer, mas "depende de seu desempenho" e ainda tem de mostrar que é capaz de transformar ideias em ações.

Uma semana depois de Alckmin ter confirmado Persio Arida como coordenador de seu programa econômico, FHC afirmou que o economista é "inteligente e competente", mas ponderou que esse anúncio não é suficiente para alavancar a pré-candidatura. Fernando Henrique minimizou a importância do economista Paulo Guedes, anunciado por Bolsonaro como seu futuro ministro da Fazenda, se eleito. O tucano disse nunca ter lido nada dele e errou o nome, chamando-o de Paulo Rabello.

Fernando Henrique procurou afastar de vez os rumores de que estaria defendendo um candidato que não seja do PSDB e disse que tem sido "usado" para lançarem candidaturas. "Lancei quatro candidatos nas últimas semanas. Alguns eu nem conheço. Não lancei ninguém", afirmou. "Luciano Huck, o rapaz da Riachuelo, Pedro Parente e outro que não me lembro mais", disse. "Pegam e me usam para dizer que estou lançando".

Segundo o ex-presidente, as "forças existentes na sociedade estão tateando para ver se surge algo novo". Fernando Henrique, no entanto, disse não ver um "outsider", apesar do desejo do "novo".

Ao comentar sua boa relação com políticos de outros partidos, FHC brincou que o ex-prefeito Fernando Haddad é "seu candidato" dentro PT à Presidência. Coordenador do plano de governo de Luiz Inácio Lula da Silva, Haddad é cotado como "plano B" caso a candidatura do ex-presidente petista seja inviabilizada.

Em crítica a Lula, o tucano disse que ex-presidentes não deveriam se candidatar novamente para o Planalto, mas sim dedicar-se a "cuidar dos netos". "Daqui a pouco as pessoas vão ver que não é saudável que o antigo presidente continue querendo ser presidente. Ele atrapalha seu partido, seus colegas, não forma lideranças", afirmou. Minutos depois, disse que "quer ver Lula derrotado".

O ex-presidente falou também sobre as pré-candidaturas de Bolsonaro e do ex-ministro Ciro Gomes (PDT). Sobre Bolsonaro, FHC disse que um candidato "puramente reacionário" não deve vencer e ironizou o parlamentar. "Ele quer ordem, mas não tem pensamento liberal. Não sei se tem pensamento", disse. "Por enquanto ele simboliza o autoritarismo". Em relação a Ciro, disse que é um "rapaz impetuoso", "que muda de opinião e não tem rumo definido".

Questionado sobre a intervenção federal na área de segurança no Rio de Janeiro, Fernando Henrique disse que é "legítimo" o presidente Michel Temer tirar proveito político-eleitoral da ação. FHC, no entanto, ponderou que governos fracos costumam apelar para os militares e disse que o presidente estava encurralado. "Pode tirar proveito? Pode. É legítimo tirar proveito", afirmou. "O governo está encurralado, tem que fazer alguma coisa. Sobretudo quando os governos não são fortes apela muito para militar", disse. O ex-presidente lembrou do período do exílio, quando morou no Chile, e disse que o governo de Salvador Allende "punha militar para tudo". "Quando falta crença nos partidos civis apela para instituição que tem uma hierarquia", afirmou.

Ao ser questionado sobre a decisão de Temer de nomear um general para comandar o Ministério da Defesa, Fernando Henrique afirmou que "simbolicamente" era melhor ter um civil à frente da Pasta. "No passado colocar um civil no Ministério da Defesa era símbolo de que poder civil prevalece", afirmou o ex-presidente. Em seguida, o tucano disse que em seu governo "não foi fácil" criar o Ministério da Defesa e colocar um civil como ministro". "Levei anos para fazer a mudança", disse. "Hoje isso não tem o mesmo significado que tinha naquela época. Acho que é mais funcional. Simbolicamente se fosse um civil seria melhor, mas do ponto de vista de eficiência talvez esse militar tenha a eficiência necessária."