O globo, n. 30931, 14/04/2018. Economia, p. 21

 

Temer vai analisar proposta dos EUA para exportação de aço

Leticia Fernandes e Rennan Setti

14/04/2018

 

 

Para especialista, Brasil não tem opção à imposição de cotas voluntárias

Em meio às negociações com o governo americano para que o país fique isento da sobretaxa de 25% ao aço brasileiro, o presidente Michel Temer disse ontem que vai analisar a última proposta dos Estados Unidos, que sugeriram um acordo de restrição voluntária nas exportações. Na prática, as vendas ao mercado americano obedeceriam a uma cota limitada de produtos para fugir das restrições.

A proposta foi discutida entre o chanceler brasileiro, Aloysio Nunes, e o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Wilbur Ross, na capital peruana. Temer disse que o foco é resolver o quanto antes essa questão junto ao governo dos EUA.

— Isso está sendo examinado pelo Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio), vamos examinar. O que queremos é resolver essa questão da tarifa muito acentuada em cima do aço e do alumínio — afirmou o presidente, que chegou a Lima ontem para participar da Cúpula das Américas.

Segundo interlocutores que participaram da conversa, Ross não foi direto em relação a uma possível redução das exportações brasileiras, mas teria citado a Coreia do Sul. No fim de março, os sul-coreanos conseguiram a isenção permanente da sobretaxa de aço exportado para os EUA, sob a condição de reduzir cerca de 30% dos produtos siderúrgicos enviados ao mercado americano. Primeiro país a ser excluído definitivamente da medida protecionista, a Coreia terá de se submeter a uma cota de 2,68 milhões de toneladas por ano.

Para a especialista em relações comerciais internacionais, Lia Valls Pereira, economista do Ibre/FGV e professora da Uerj, o restrito poder de barganha do Brasil no comércio mundial deixa poucas alternativas à adoção de cotas voluntárias de exportação de aço. Para Lia, a situação é ainda mais grave diante do desprezo do governo Donald Trump pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e da erosão dos mecanismos multilaterais.

— A grande questão é que o Brasil não tem qualquer poder de barganha diante dos EUA. Tudo isso é péssimo, pois mostra que o país não tem força suficiente para contrapor esse tipo de política imposta por Trump, o que pode acabar reafirmando essa postura — disse.

Lia observa que uma opção seria entrar na OMC por meio de um mecanismo para solução de controvérsia. Mas essa estratégia tem dois problemas: a OMC já foi alvo de ataques de Trump, e o presidente americano evocou a defesa nacional para justificar as sobretaxas ao aço, e essa é uma questão controversa dentro do próprio organismo multilateral.

A especialista lembra que a disputa comercial entre EUA e China “é ruim para o Brasil”:

— Uma guerra comercial esvazia a dimensão multilateral, tornando mais vulnerável a situação de países com nosso perfil.