Título: Disputa por terras indígenas
Autor: Sassine,Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 22/03/2012, Política, p. 8

Com o voto favorável de 10 deputados do PMDB, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que retira do Executivo a atribuição de demarcar terras indígenas, unidades de conservação e comunidades quilombolas. A derrota do Palácio do Planalto só ocorreu em função da adesão à proposta por parte dos deputados do principal partido aliado ao governo. Os 10 votos do PMDB correspondem à maioria dos 38 a favor da PEC nº 215, de 2000.

Pelo projeto validado na CCJ, a demarcação de terras indígenas, de parques federais e de espaços ocupados por quilombolas passa a ser atribuição exclusiva do Congresso. Em vez de decretos presidenciais, leis ordinárias — apresentadas, discutidas e validadas por deputados e senadores — serão os instrumentos para novas demarcações, caso o Congresso aprove a PEC 215. Depois de ser votada na CCJ da Câmara, a proposta segue para uma comissão especial, que ainda será constituída, e em seguida para o plenário da Casa.

A bancada ruralista na Câmara, capitaneada pelo PMDB, provou mais uma vez ter facilidade para derrotar o governo, a exemplo da aprovação e da completa alteração do novo Código Florestal. Esse projeto, depois de aprovado no Senado, já retornou à Câmara e corre risco de ser validado conforme os interesses da bancada ruralista. A PEC 215 segue o mesmo roteiro, inclusive com o apoio inicial do próprio Planalto. No fim do ano passado, o então líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), participou de um acordo político que garantia a colocação da PEC 215 na pauta da CCJ já no início deste ano legislativo.

O PT e o PV tentaram ontem manobras para barrar a votação, com pedidos de adiamento por cinco sessões da CCJ. Recursos semelhantes foram usados na terça-feira. A PEC 215 acabou aprovada por 38 votos favoráveis e dois contrários. Lideranças indígenas acompanharam toda a sessão. Ao final, protestaram contra o resultado da votação. Um princípio de confronto chegou a ocorrer entre índios e seguranças da Câmara. Eles saíram em protesto do plenário da CCJ, no anexo das comissões, até o Salão Verde da Casa.

Na prática, caso a PEC 215 seja validada, três órgãos perderão a função na demarcação de terras indígenas, unidades de conservação e comunidades quilombolas: a Fundação Nacional do Índio (Funai), vinculada ao Ministério da Justiça; o Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio), ligado à pasta do Meio Ambiente; e a Fundação Cultural Palmares, subordinada à Cultura. À proposta original, sobre demarcação de terras indígenas exclusivamente pelo Congresso, foram apensados mais 11 projetos, que incluíram parques e quilombolas.

"A PEC é gritantemente inconstitucional", afirma o deputado Alessandro Molon (PT-RJ). "Criação de terra indígena virou anarquia. Alguns antropólogos malucos da Funai acham um caquinho de cerâmica e dizem que aquilo ali se trata de terra indígena", rebate Moreira Mendes (PSD-RO), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária.

"Criação de terra indígena virou anarquia. Alguns antropólogos malucos da Funai acham um caquinho de cerâmica e dizem que aquilo ali se trata de terra indígena"

Moreira Mendes, deputado do PSD-RO, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária