Valor econômico, v. 17, n. 4461, 14/03/2017. Brasil, p. A2.
Prefeitura de SP quer obter R$ bi com privatizações para investir
Estevão Taiar e Ligia Guimarães
14/03/2018
O secretário de Desestatização e Parcerias da Prefeitura de São Paulo, Wilson Poit, defendeu ontem o programa de privatizações e concessões promovidas pelo prefeito João Doria (PSDB). O objetivo, segundo o secretário e o próprio prefeito, é restringir o investimento público ao que é considerado essencial à população: saúde, educação, assistência social, habitação, mobilidade e segurança. Poit prevê que só a concessão de parques municipais, "que deve sair no meio do ano", representará economia de R$ 200 milhões por ano aos cofres públicos, do Estádio do Pacaembu, de 27 terminais de ônibus e de mercados municipais.
O secretário explicou que tem como meta pessoal que o Fundo Municipal de Desenvolvimento Social, criado para receber recursos gerados pelas privatizações e outorgas, alcance R$ 5 bilhões em 4 anos. "Esse dinheiro já está carimbado. As privatizações de outorga de São Paulo irão para esse fundo, e sairão unicamente para esses cinco setores prioritários", afirmou Poit, ao falar em painel sobre crescimento econômico e desenvolvimento durante o seminário São Paulo - Creating the Future, promovido pelo Valor e o "Financial Times", do qual o prefeito João Doria também participou.
Questionado sobre como garantir que os recursos não sejam desviados de função, o secretário disse que as ações serão acompanhadas pelo Conselho Municipal de Desestatização e Parcerias, formado pelas secretarias de Desestatização, Gestão, Fazenda, Relações Internacionais e Justiça.
"Haverá uma governança a ser aprimorada, com contas auditadas, editais publicados no site da prefeitura", disse o secretário, que afirmou que a intenção é que 25% desse fundo seja destinado a ações de saúde e educação na Zona Norte da cidade. Na visão do secretário, a maioria das cidades do Brasil está muito grande, com equipamentos que não são essenciais. "Tudo que não é essencial não deveria ser prioridade", disse. Listou uma série de projetos em andamento, como a privatização do complexo de eventos Anhembi e de imóveis que, por herança vacante ou recuperados por dívida, ficaram sob cuidado da prefeitura e comporão fundos imobiliários. "É uma riqueza escondida", disse.
Antônio Carlos Kfouri Aidar, diretor de controle da FGV Projetos, ponderou que nem tudo deve ser privatizado, e que estatal não é sinônimo de má qualidade ou corrupção. "Sou fervoroso defensor de [privatizar] tudo o que é transparente e tem preço transparente, com regulação. O que não tem não pode ser privatizado", afirmou durante o painel. Aidar usou como exemplo a Petrobras. "Vamos privatizá-la? Conheço bem o [atual presidente da companhia] Pedro Parente. Se tiver um gestor como o Parente, não precisa privatizar. Jamais privatizaria a Petrobras sem uma golden share (ação especial com direito a veto em questões estratégicas), porque é estratégica."
Aidar disse ser contrário à privatização de instituições financeiras como o Banco do Brasil , que tem papel fundamental no fomento à produção agrícola em atividades que pouco interessam aos bancos privados. "Se privatizar banco, pergunta se vai dar crédito para pequeno produtor? O Brasil hoje só não está em situação muito pior por causa do setor de agro. Os bancos privados só emprestam para o intermediário. Pergunta se dão crédito ao produtor? Muito pouco", afirmou. "Sou totalmente a favor de privatização. Só que eu acho que não é tão simples".
O jornalista Cristiano Romero, que mediou o debate, citou a experiência dos Estados Unidos, que consumiam grande parcela do petróleo mundial, mas não tinham nenhuma empresa estatal de petróleo. "Então por que é estratégico?", questionou. Doria também defendeu a privatização da Petrobras, e disse que não faz sentido ter uma estatal desse tamanho. Ele defendeu a gestão eficiente como legado: "Sou totalmente a favor da privatização, desestatização", disse o prefeito.
Mesmo com as ressalvas, o diretor da FGV Projetos afirmou que o setor público precisará promover parcerias com o setor privado para que o Brasil tenha recuperação econômica sustentada. "Quem assumir o próximo governo vai passar por uma crise fiscal, com o recurso curto. Se não houver PPP (parceria público-privada), o voo vai ser de galinha d'angola, que voa menos", disse.
No debate sobre como estimular o desenvolvimento econômico das cidades, o presidente da Whirpool na América Latina, João Carlos Brega, defendeu que São Paulo precisa explorar sua vocação de tornar-se polo de conhecimento e inovação, mais do que industrial. "Pelas universidades, pela diversidade, pela cultura da população, pela capacidade de ser aberta. Eu vejo São Paulo puxando muito mais conhecimento do que polo industrial per si", afirmou.
A francesa Sandrine Ferdane, CEO do BNP Paribas Brasil, mora em São Paulo há mais de 15 anos com a família e diz que a cidade tem grande importância tanto em sua vida pessoal quanto nos negócios do banco. "O BNP tem 1.800 pessoas trabalhando no Brasil, 1.400 na cidade de São Paulo. A vida em São Paulo, a segurança, o transporte, o acesso a talentos é muito importante para nós."
No debate sobre cidades inteligentes, moderado pela repórter especial do Valor, Daniela Chiaretti, Marisa Moreira Salles, co-fundadora do Arq.Futuro e da BEI Editora, disse que o uso da tecnologia na gestão pública não pode transformar-se em fetiche.
"Ainda estamos no país em que há o problema do saneamento. Temos bairros em São Paulo que jogam o esgoto no rio", disse. "Nossas cidades, por causa de um avanço tecnológico que foi o carro, foram desenhada num espraiamento, e a distância distancia as ideias, as pessoas, não faz cidades saudáveis, afirmou, defendendo que a tecnologia precisa aproximar as pessoas. "Sou 'pró' tecnologia, mas o bom senso está com a gente".