Correio braziliense, n. 20085, 19/05/2018. Política, p. 3

 

José Dirceu volta para a cadeia

Renato Souza e Deborah Fortuna

19/05/2018

 

 

Condenado a 30 anos e nove meses de prisão por corrupção, ex-ministro está em uma cela coletiva de 30 metros quadrados

Sem alarde, discursos ou estratégia política em negociação, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu se entregou à Polícia Federal e passou a primeira noite em uma cela de 30 metros quadrados no Complexo Penitenciário da Papuda, em São Sebastião. A pena, por enquanto, será cumprida em Brasília, mas há a possibilidade de que o petista seja transferido ao Complexo Médico Penal de Pinhais, em Curitiba.

O prazo estipulado pela juíza substituta da 13ª Vara Criminal Gabriela Hardt era que o ex-ministro se entregasse até as 17h de ontem. Na ausência do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos casos da Lava-Jato, Hardt determinou o cumprimento da pena e o mandado de prisão após o Tribunal Regional da 4ª Região (TRF-4) negar os últimos recursos da defesa. Dirceu chegou à Papuda por volta das 14h40, onde vai começar a cumprir a pena de 30 anos e nove meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Essa não é a primeira vez que o ex-ministro é encarcerado. Além da prisão durante o regime militar, em 1968, Dirceu já foi alvo do mensalão, em 2013, e, dois anos mais tarde, preso na 17ª fase da Operação Lava-Jato. Nesse último caso, o petista ficou encarcerado até 2017, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu o pedido de habeas corpus, até que todos os recursos em segunda instância tivessem se esgotado.

A defesa tentou entrar com um pedido para que ele não fosse preso depois de esgotados todos os recursos, mas o ministro Dias Toffoli não atendeu, já que a jurisprudência da Suprema Corte garante a prisão após condenação em segundo grau. Na quinta-feira, o TRF-4 negou os últimos pedidos da defesa. O advogado do petista disse que ainda vai recorrer da condenação aos tribunais superiores.

Segundo a Subsecretaria do Sistema Penitenciário do Distrito Federal (Sesipe), Dirceu está recolhido no bloco 5 do Centro de Detenção Provisória (CDP) da Papuda. Nessa área, estão reunidos internos que, legalmente, possuem direito de custódia em locais específicos, como ex-policiais, idosos, políticos, além de custodiados com formação de ensino superior. A cela, no entanto, é coletiva e conta com camas tipo beliche, chuveiro e vaso sanitário. “Assim como todos os outros detentos do sistema prisional, José Dirceu terá direito a quatro refeições diárias — café da manhã, almoço, jantar, e lanche noturno — e duas horas de banho de sol”, informou a pasta em nota.

Articulação
O ex-ministro acordou cedo ontem para se articular com os advogados. Por volta das 8h, os defensores chegaram ao apartamento dele, no Sudoeste, para iniciar as negociações com a Polícia Federal.  Por volta das 8h45, José Dirceu recebeu a visita do deputado Chico Vigilante (PT-DF). O parlamentar foi até o local prestar apoio e ao sair informou que Dirceu “estava tranquilo” em relação à decisão da Justiça.

Em frente à PF, um grupo com cerca de 15 manifestantes gritaram palavras de apoio ao ex-ministro e usaram instrumentos musicais para chamar atenção. Com bandeiras, faixas e no “gogó”, o grupo reunido também lutava por Lula livre, enquanto entoavam o “Dirceu, guerreiro, do povo brasileiro”. O ato recebia apoio e também oposição dos motoristas que passavam pelo local.

A deputada federal Érika Kokay (PT-DF) apareceu em frente à corporação logo após o ex-ministro se entregar. Ela abraçou os manifestantes, e todos fizeram uma roda de apoio, e gravaram mensagens de vídeo com mensagens ao petista. Sobre a prisão, Érika foi sucinta: “Continuaremos resistindo”, disse.

Em relação às condenações que já foram realizadas na Lava-Jato, a pena de 30 anos de prisão de José Dirceu é a segunda maior. Ele fica atrás apenas de Renato de Souza Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras, que foi condenado em 2017. O TRF-4 decidiu, em junho do ano passado, que Duque deve cumprir pena de 43 anos e nove meses, pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa.

O lobista Fernando Antonio Guimarães Hourneaux de Moura também se apresentou à Polícia Federal, em Curitiba, ontem, apontado como o operador do ex-ministro no acordo com ex-vice-presidente da empreiteira Engevix Gerson de Mello Almada, já preso.

Repercussão
A Comissão Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores enviou nota em solidariedade à família de Dirceu “pela condenação arbitrária e prisão injusta que ele está sofrendo”. O partido afirmou que o povo brasileiro está mais consciente de que o “sistema judicial vem sendo manipulado para perseguir os que sempre se colocaram ao seu lado”, e relembrou que João Vaccari estaria preso “preventivamente” há mais de três anos. Para a legenda, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também estaria preso “ilegalmente” desde 7 de abril. Por fim, a sigla garante que candidatura de Lula seria a única esperança de que o país volte a ser melhor e mais justo.