Correio braziliense, n. 20084, 17/05/2018. Política, p. 2
Fachin fecha cerco a emedebistas
Renato Souza
17/05/2018
INVESTIGAÇÃO » Ministro do Supremo abre inquérito contra políticos do MDB por recebimento de propina paga pela J&F nas eleições de 2014. Denúncias vieram de delatores da Lava-Jato. Políticos acusados negam envolvimento
O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a abertura de inquérito para investigar se políticos do MDB receberam repasses ilegais da empresa J&F. A investigação usará como base uma denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Cerca de R$ 40 milhões teriam sido repassados aos políticos para a campanha eleitoral de 2014. A autorização para o início das diligências foi incluída no sistema do Supremo ontem.
As informações que embasaram a denúncia do MPF vieram das delações do ex-diretor da Transpetro, Sérgio Machado, e de Ricardo Saud, ex-dirigente da J&F. Nos depoimentos, os delatores citam Renan Calheiros (AL), Jader Barbalho (PA), Romero Jucá (RR), Eunício Oliveira (CE), Vital do Rêgo (PB); hoje ministro do Tribunal de Contas da União), Eduardo Braga (AM), Edison Lobão (MA), Valdir Raupp (RO) e Roberto Requião (PR), entre outros nomes. A decisão do ministro Fachin não deixa claro contra quais políticos a investigação deve ser aberta.
De acordo com os depoimentos, o Partido dos Trabalhadores (PT) solicitou que a J&F, holding que controla a JBS, fizesse repasses milionários para os políticos do MDB. A estratégia seria comprar apoio político dos deputados do partido para evitar o rompimento da legenda com o governo da época. Sérgio Machado contou, em 2016, que as doações da empresa aos parlamentares de Senado geraram uma crise no partido, o que teria feito com que o presidente Michel Temer assumisse a legenda.
Machado afirmou que as reuniões para discutir os repasses ocorriam na casa do senador Renan Calheiros. Foi lá, de acordo com o depoimento, que ele ouviu falar nos valores milionários da propina. Em seguida, ele obteve a confirmação por meio de Ricardo Saud, que até então era diretor de relações institucionais da JBS. A informação sobre o esquema teria chegado até a Câmara dos Deputados, o que teria gerado uma série de reclamações de deputados. De acordo com a denúncia da PGR, Sérgio Machado não soube dizer se a empresa que realizou os pagamentos obteve algum benefício em troca do que foi repassado aos políticos.
Saud firmou acordo de delação pouco tempo depois de Machado. Ele disse que parte dos recursos era destinada a Eunício Oliveira “como contraprestação à atuação favorável aos interesses do Grupo J&F no processo de aprovação de medidas provisórias”. No despacho que autoriza a abertura de investigação, Fachin destacou que informações prestadas pelos colaboradores “não estão em nenhum processo em trâmite no STF”.
Outro lado
Em nota, o presidente do Senado, Eunício Oliveira, afirmou que “a narrativa dos delatores é falsa e caluniosa” e disse que “nunca recebeu doações eleitorais do senhor Sérgio Machado, seu adversário político histórico, ou do Partido dos Trabalhadores, conforme é possível verificar na prestação de contas aprovada pela Justiça Eleitoral”. O Senador Renan Calheiros afirmou que “jamais recebeu recursos de caixa dois ou vantagens de quem quer que seja e todas as doações de campanhas eleitorais ocorreram na forma da Lei e estão nas prestações de contas”.
Também em nota, o senador Romero Jucá informou que “nega qualquer irregularidade e não tem preocupação com as delações em massa que não fazem provas e serão questionadas no Poder Judiciário”. Jucá ressaltou ainda que “a PGR não pede a oitiva do senador e ele não foi candidato em 2014”. O senador Edison Lobão também negou ter cometido irregularidades e disse não se preocupar com os depoimentos que originaram o inquérito.
Valdir Raupp disse que “terá a oportunidade de provar que essas doações não existiram e, portanto, são infundadas” e destacou que não foi candidato em 2014. Eduardo Braga disse que “todas as doações da campanha de 2014 foram declaradas e aprovadas pela Justiça Eleitoral”. O Tribunal de Contas da União (TCU) informou que o ministro Vital do Rego não vai se pronunciar. Jader Barbalho e Roberto Requião não foram encontrados pela reportagem. A J&F informou que não vai comentar o caso.