O globo, n. 30928, 11/04/2018. País, p. 4

 

STF determina volta de Cabral para presídio no Rio

André de Souza

11/04/2018

 

 

Ex-governador foi transferido para Curitiba por regalias em Benfica

-BRASÍLIA- Por três votos a um, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou ontem a volta do ex-governador Sérgio Cabral para a prisão no Rio de Janeiro. Alvo da Lava-Jato, Cabral tinha sido transferido em janeiro deste ano para o Paraná, após suspeitas de regalias no presídio de Benfica, onde estava. O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, também determinou a instauração de investigação para apurar o uso de algemas durante a transferência de Cabral para Curitiba.

Além de Gilmar, votaram a favor do pedido da defesa de Cabral os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Apenas Edson Fachin foi contra. Celso de Mello, que também integra a Segunda Turma, não estava presente.

— A transferência para o Paraná não faz sentido processual. O endereço da instrução processual demanda a permanência do paciente (Cabral) no Rio de Janeiro, onde responde a ações penais em fase de instrução. Entendo que a transferência não atende aos interesses do processo — disse Gilmar.

Por outro lado, Fachin destacou que Cabral poderia participar das audiências de seus processos por videoconferência. Também argumentou que a situação era excepcional, de modo a autorizar a prisão em local distante da família.

 

USO DE ALGEMAS

Cabral está preso desde novembro de 2016. Em janeiro, a Justiça mandou transferi-lo para o Paraná. No começo de fevereiro, a defesa apresentou um habeas corpus solicitando uma liminar para suspender a transferência, determinada pelos juízes federais Sergio Moro, responsável pela LavaJato em Curitiba, e Caroline Vieira Figueiredo, do Rio.

Em 18 de janeiro, Moro afirmou que se o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, entendesse que a transferência não era pertinente no momento, ele poderia ser informado e reavaliar a decisão. No entanto, logo em seguida, a juíza substituta da 7ª Vara Federal Criminal do Rio deu a decisão. Bretas estava de férias. Os pedidos para a transferência de Cabral foram feitos pelo Ministério Público em Curitiba e no Rio. Por isso, duas decisões de juízes diferentes. No STF, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se manifestou contra o pedido da defesa de levar Cabral de volta ao Rio.

Pouco depois da transferência para Curitiba, ainda em janeiro, os juízes da Lava-Jato na capital paranaense e no Rio pediram explicações sobre o uso de algemas nas mãos e nos pés de Cabral. Sergio Moro intimou a Polícia Federal (PF) a esclarecer os motivos do procedimento. No Rio, o ofício enviado à PF e ao Ministério Público Federal (MPF) para apurar se houve eventual excesso ou irregularidades foi assinado pela juíza substituta. O delegado responsável pela transferência disse na época que foram utilizadas algemas para “evitar que o preso pudesse adotar qualquer atitude que viesse a prejudicar a sua própria segurança, de terceiros e da equipe policial”.

— Todos ficaram pasmos (com o uso das algemas). Aonde queremos chegar? Que tipo de alma está morando no corpo dessa gente? — indagou Gilmar, durante o julgamento.

Em 19 de fevereiro, os advogados do ex-governador citaram a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro como argumento a seu favor. A defesa destacou que, como o sistema penitenciário passou a ser responsabilidade do governo federal, não haveria mais risco de regalias. Ontem, durante o julgamento, o advogado Rodrigo Henrique Roca Pires, que defende Cabral, repetiu o argumento.

— A minha cidade está pegando fogo. O Rio de Janeiro está fora de controle. A intervenção federal até agora não deu em nada — disse Pires, concluindo: — Mas se alguma coisa foi feita pela intervenção federal no Rio de Janeiro foi justamente a Secretaria de Assuntos Penitenciários. Ali funcionou imediatamente. Foram trocados todos os quadros, todas as autoridades foram trocadas. Se havia uma regalia, hoje isso é impossível. Se a decisão originária tinha o fundamento do receio de que o exgovernador do estado do Rio de Janeiro tivesse algum tipo de regalia, hoje esse argumento é inexistente. O presídio de Benfica tem mais de 60 câmeras agora. Na época, eram 52. Diligências diárias fiscalizatórias: Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, juízo das execuções penais.

 

VISITAS EM DIAS PROIBIDOS

Reportagem publicada pelo GLOBO em janeiro mostrou que o ex-governador tinha direito a regalias dentro do presídio. Por isso, o Ministério Público pediu que ele fosse transferido para Curitiba. Cabral foi preso preventivamente em 17 de novembro de 2016, quando foram cumpridos mandados de prisão expedidos pela Justiça Federal de Curitiba e do Rio de Janeiro, na operação “Calicute”, coordenada pelo MPF nos dois estados.

Entre as irregularidades o MP registrou entrega a Cabral de envelope com cédulas, e visitas em dias não permitidos. Uma das pessoas que visitaram Cabral em dia proibido aos demais presos foi o deputado federal Marco Antonio Neves Cabral, filho do exgovernador.