O globo, n. 30927, 10/04/2018. País, p. 8

 

STJ invalida decisão que anulou júri do massacre do Carandiru

10/04/2018

 

 

Condenação de 74 policiais está suspensa até nova análise do TJ

-BRASÍLIA- O processo judicial que resultou na condenação em primeira instância de 74 policiais militares por envolvimento no caso Massacre do Carandiru e, posteriormente, na anulação da sentença na segunda instância, sofreu nova reviravolta ontem. O ministro Joel Ilan Paciornik, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinou que o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) analise novamente os embargos de declaração apresentados pelo Ministério Público de São Paulo no caso. Na prática, o ministro suspendeu a decisão do TJ de anular o julgamento que confirmou a responsabilidade dos agentes da PM na morte de 111 detentos em 1992, durante uma ação para conter uma rebelião.

A condenação em primeira instância havia sido anulada em setembro de 2016 pela 4ª Câmara do TJ-SP. Na ocasião, o colegiado considerou que a decisão do júri de condenar os PMs foi contrária às provas do processo. O relator da ação, desembargador Ivan Sartori, quis a absolvição de todos os policiais e chegou a dizer que “não houve massacre, mas uma contenção necessária”. Os outros dois desembargadores votaram pela anulação dos julgamentos.

AÇÃO EM 1992 RESULTOU EM 111 MORTES

Diante de decisão dividida, o Ministério Público recorreu mas, em abril de 2017, o recurso foi negado, e o TJ decidiu que um novo julgamento deveria ser realizado. Entretanto, o MP recorreu ao STJ, alegando que o tribunal paulista não se pronunciou sobre as omissões e contradições de sua sentença que haviam sido expostas nos embargos de declaração. Essa argumentação foi aceita pelo ministro Paciornik. Ele afirmou que o TJ rejeitou o recurso “sem sanar os vícios apontados”.

Segundo o Ministério Público, a decisão do STJ suspende as condenações dos policiais até que a 4ª Câmara Criminal do TJ julgue novamente os embargos. Ainda não há data prevista para um novo julgamento.

O crime ocorreu em 2 de outubro de 1992, depois que tropas da Polícia Militar entraram na Casa de Detenção de São Paulo, chamado de Carandiru, para conter um briga entre presos. A direção da penitenciária pediu a ajuda da PM para controlar a situação. A entrada dos policiais militares foi autorizada pelo então secretário de Segurança Pública, Pedro Franco de Campos, e pelo ex-governador paulista Luiz Antônio Fleury Filho.

Sobreviventes e familiares de vítimas contestam os dados, dizendo que o número de mortes foi superior a 111. Participaram da ação no Carandiru as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), a Tropa de Choque, o Comando de Operações Especiais (COE) e o Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate).

A ação da PM no Carandiru durou cerca de meia hora. Apesar dos presos não portarem armas de fogo, exames do Instituto Médico Legal mostraram que 102 detentos foram mortos com tiros. Nove deles foram vítimas de golpes de armas brancas, o que indica que as mortes podem ter ocorrido antes da chegada da PM. Nenhum policial foi morto.

Durante as investigações, a polícia constatou que 77 das 111 vítimas da chacina teriam sido mortas por policiais — a morte do restante teria sido responsabilidade dos colegas de cela. Em cinco julgamentos, 74 policiais foram considerados responsáveis pelas mortes e condenados a penas que variam de 96 a 624 anos de prisão. Os agentes, no entanto, nunca foram presos.