-Horas antes de se entregar à polícia, de cima de um carro de som na porta do Sindicato dos Metalúrgicos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso de 55 minutos no qual atacou o Judiciário, o Ministério Público e a imprensa. Ele também indicou que, mesmo na cadeia, não sairá do jogo eleitoral.

— Vou cumprir o mandado (de prisão). E vocês vão ter que se transformar. Vocês não vão mais se chamar Chiquinha, Joãozinho, Zezinho, Albertinho. Todos vocês, daqui para a frente, vão virar Lula e vão andar por esse país fazendo o que têm de fazer. Todo dia. Eles têm que saber que a morte de um combatente não para a revolução — disse, ao lado de correligionários. — Não adianta eles acharem que vão fazer com que eu pare. Eu não pararei, porque eu não sou um ser humano. Eu sou uma ideia.

O discurso encerrou uma cerimônia em homenagem à mulher do petista, Marisa Letícia, morta em 2017, e que completaria 68 anos ontem. O ato religioso acabou servindo de palco para uma manifestação política contra a condenação do petista a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá (SP).

Ao anunciar que se entregaria, o ex-presidente ouviu militantes gritarem que ele deveria resistir. Lula afirmou que “sairá dessa ainda maior” e “mais inocente”, “de peito estufado”.

No ato, o ex-presidente acusou o juiz Sergio Moro de mentir ao confirmar a acusação contra ele. Para condenar o petista, Moro levou em conta depoimentos de delatores, documentos e fotos que mostravam a relação do ex-presidente com o tríplex do Guarujá. Reportagens do GLOBO, em 2010 e 2014, revelaram o elo do petista com o imóvel.

— Eu quero enfrentá-los de olho no olho. E eu vou enfrentá-los aceitando cumprir o mandado. Eu quero saber quantos dias eles vão pensar que estão me prendendo. E quanto mais dias me deixarem lá, mais Lulas vão nascer neste país”.

A Associação Nacional dos Procuradores da República divulgou nota criticando as declarações. A entidade afirmou que o petista nunca foi perseguido pelos procuradores e que ninguém pode "zombar e menosprezar" a Justiça.

O ex-presidente também atacou o Supremo Tribunal Federal, que negou pedido de habeas corpus do petista, na semana passada.

— Quem quiser votar com base na opinião pública largue a toga, escolha um partido político e vá ser candidato a deputado. Ora, a toga é um emprego vitalício. O cidadão tem de votar apenas com base nos autos do processo. Aliás, eu acho que ministro da Suprema Corte não deveria dar declaração de como vai votar

Lula se emocionou ao falar de acusações contra sua família — dois filhos são investigados e Marisa Letícia chegou a ser denunciada na operação Lava-Jato.

MÍDIA COMO ALVO

Ao criticar a imprensa, o petista voltou a se dizer perseguido e citou vários veículos de comunicação, entre eles O GLOBO. Ele defendeu mais uma vez a regulação dos meios de comunicação.

— Estou sendo processado, mas tenho dito claramente. Sou o único ser humano processado por um apartamento que não é meu. — disse.

Lula também fez homenagem à ex-presidente Dilma Rousseff, alvo de impeachment, e chamou os pré-candidatos à Presidência do PSOL e do PC do B, Guilherme Boulos e Manuela D’Ávila, de “jovens representantes da nova geração”.