Correio braziliense, n. 20076, 09/05/2018. Política, p. 3

 

PSB lamenta, mas já faz aposta em Ciro

Bernardo Bittar e Leonardo Cavalcanti

09/05/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Com a saída de Barbosa e a indefinição dos petistas, caciques do partido do magistrado tendem para o pedetista, mas há torcida por Haddad. Marina pode herdar votos da legenda

Os caciques do PSB nos estados lamentaram a desistência do ministro aposentado Joaquim Barbosa, mas já iniciaram as negociações políticas para a união de centro-esquerda tendo como candidato Ciro Gomes (PDT). Em entrevista ao Correio na noite de ontem, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, disse que o ministro aposentado do STF, pelos valores que representa, tem uma contribuição importante no processo eleitoral.

“Mas havia uma insegurança por parte do partido se ele seria ou não candidato. Agora, prevalece o cenário anterior à filiação de Barbosa, que é a tentativa de aglutinar partidos como Rede, Solidariedade, Podemos, PDT, PV, PHS, e, até mesmo, PCdoB.” Rollemberg completa dizendo que quem sai mais fortalecido após a movimentação de Barbosa é Ciro Gomes. “Barbosa poderá ter uma participação importante dentro do partido, na formulação de propostas e ideias, mas acredito que ele não vai ser candidato a outro cargo.”

O apoio a Ciro é um caminho que tende a se fortalecer, embora não haja garantias de que o pedetista será o herdeiro natural dos votos de Barbosa. No Nordeste, ainda há quem acredite na possibilidade de um acordo com o PT, no caso de Luiz Inácio Lula da Silva lançar Fernando Haddad. Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, o ministro aposentado representa vários símbolos, o que permitiu criar identificação com diferentes tipos de eleitores. Nesse caso, há, sim, a possibilidade de outros candidatos, como Marina Silva (Rede), serem beneficiados também.

A trajetória de Barbosa, que subiu na vida após uma infância difícil, permitiu ao ministro aposentado criar uma identificação com uma parte do eleitorado, pondera Melo. Outra identificação é a de ter sido o primeiro ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) a determinar a prisão de líderes políticos envolvidos em escândalos de corrupção, no julgamento do mensalão. “Ele reúne uma série de características que nenhum outro pré-candidato dispõe”, analisou o especialista.

Um cacique do PSB nordestino afirmou em conversa reservada que a saída de Joaquim ocorreu antes de novas pesquisas o elevarem a um patamar em que a desistência fosse impossível. O divisor de águas para o fortalecimento da pré-candidatura de Ciro depende de o PSB apoiar abertamente o PDT, pondera Melo. “A desistência de Barbosa é um alívio para os demais pré-candidatos, mas não chega a impulsioná-los. Para que isso ocorra, será necessário bater o martelo na proximidade entre os dois partidos”, enfatizou.

Resolver impasses nos estados será fundamental para reduzir as inseguranças e engatar o namoro com o PDT. Boa parte das decisões do partido prevalecem de interesses regionais, sobretudo de Pernambuco, estado do governador Paulo Câmara. Outro polo de destaque é o de São Paulo, estado comandado pelo pessebista Márcio França. Na primeira reunião para debater a pré-candidatura de Barbosa, ele declarou abertamente que o pré-candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, é um nome mais “maduro” para disputar as eleições.

Eventuais divergências no partido fazem com que a desistência de Barbosa não seja uma decisão surpreendente, avalia um ex-líder pessebista. “É um partido difícil de trabalhar junto. Não seria fácil unir o partido em torno de uma candidatura de Joaquim, a menos se fosse algo muito inconteste, com um favoritismo absolutamente visível e concreto para o lado do ministro”, ponderou.

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Eleitores sem dizem surpresos

Maiza Santos

09/05/2018

 

 

Os votos de Barbosa parecem não ter dono. Pelo menos de imediato. O auxiliar de consultório Elvis Silva da Conceição, de 25 anos, morador de Ceilândia, se diz desencantado da política. “Sempre foi algo a se pensar, mas eu tive um pouco de esperança, de alegria por ter alguém em quem votar e confiar. Só decidi votar em alguém depois que fiquei sabendo da candidatura dele. Agora, não tenho mais candidato, vou votar em branco ou nulo, a não ser que ele volte atrás”, declarou.

Moradora do Recife, a analista de informática Andiara Rodrigues do Rego, 40 anos, criou a página “Joaquim Benedito Barbosa Gomes para presidente” nas redes sociais para apoiar a candidatura. Com quase 23 mil curtidas, o espaço é usado para compartilhar notícias sobre o ministro aposentado. “Virou meu candidato por sua atuação como membro do STF no julgamento do processo do Mensalão. Fiz a página porque acreditei que ele chegaria ao Planalto, e era uma maneira de divulgar. A desistência é uma pena, pois sua índole seria de grande valia para o Brasil.”

A servidora Priscila Fernandes dos Santos, 28 anos, garante que votará em branco ou nulo. “Acredito que ele não é um político e tentaria se desvincular da sujeira, para o bem do país. Precisaríamos de maior representatividade das minorias e Barbosa, como um dos poucos ministros negros que o STF teve, seria um grande símbolo. Ele tem a visão do judiciário e dos processos que bitolam o país, uma visão panorâmica dos problemas que mais afligem o Brasil.”

Ela reconhece, no entanto, que o trabalho do ex-ministro não seria fácil. “Acho que, ao tentar se ambientar no ambiente político, Joaquim Barbosa viu que não conseguiria se soltar das amarras da política suja no Brasil. Infelizmente, vamos precisar de muito tempo para subverter a ordem no Brasil.”

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Reflexos no mercado

09/05/2018

 

 

A desistência de Joaquim Barbosa da pré-candidatura e o possível fortalecimento da pré-candidatura de Ciro Gomes, que ganharia mais tempo de TV com a aliança do PSB, representam preocupação para o mercado financeiro. A curto prazo, os agentes econômicos ainda não precificam a política econômica que o pedetista poderia emplacar. Por mais que o ministro aposentado não tenha tido tempo para apresentar ideias, a posição de centro-esquerda demonstrava preocupação fiscal e monetária que agrada mais a investidores do que Ciro.

As intenções de mexer na taxa de juros e no sistema de metas sem explicar, bem como desvalorizar o câmbio e alterar regras fiscais criadas pelo governo Michel Temer, e de propor uma tributação em lucros e dividendos são aspectos que assustam o mercado, analisa o economista André Perfeito. “Se o mercado perceber que tem chance brutal de ganhar, a curva de juros futuros, de inflação e dólar vão subir, e a bolsa de valores vai cair”, avaliou.