O globo, n. 30945, 28/04/2018. Pais, p. 4

 

Filha de Temer será interrogada pela Polícia Federal em 3 de maio

Daniel Gullino, Karla Gamba e Mateus Coutinho

28/04/2018

 

 

No dia em que a Polícia Federal definiu a data para interrogar Maristela Temer, uma das filhas do presidente Michel Temer, nas investigações da Operação Skala, que apuram suspeitas de corrupção envolvendo Temer e empresas do setor portuário, o presidente saiu em defesa dos familiares e atacou os investigadores. Em pronunciamento na manhã de ontem, Temer, visivelmente irritado, classificou o inquérito do qual é alvo de “perseguição criminosa, disfarçada de investigação”. Em referência aos investigadores, o presidente afirmou que “só um irresponsável, mal intencionado” ousaria tentar incriminá-lo.

As declarações de Temer foram dadas em resposta a uma reportagem do jornal “Folha de S.Paulo”, que citou suspeitas de investigadores de que Temer tenha lavado dinheiro de propina no pagamento de reformas em casas de familiares e dissimulado transações imobiliárias em nomes de terceiros, na tentativa de ocultar bens.

— Eu venho aqui mais uma vez protestar contra mentiras que são lançadas contra a minha honra. E pior ainda, mentiras que atingem minha família e meu filho, que hoje tem 9 anos de idade — disse Temer, reclamando em seguida do vazamento da investigação:

— É revoltante, é um disparate. Quando a minha defesa pede acesso aos autos do inquérito, a resposta é que as diligências ainda estão sendo feitas e, como se trata de sigilo, não é possível dar acesso a esse inquérito sigiloso. Aí eu pergunto: como é que a imprensa consegue acesso a essas informações? Alguém naturalmente vaza esses dados e a imprensa acaba por divulgá-los. É uma perseguição criminosa, disfarçada de investigação.

 

JUNGMANN PEDE INVESTIGAÇÃO

A pedido do presidente, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, que é o chefe da Polícia Federal, determinou a abertura de investigação para apurar o vazamento de informações à imprensa. O presidente defendeu-se das suspeitas sobre seu patrimônio, afirmando que trabalha há 60 anos e acumula rendimentos compatíveis com o seu patrimônio.

— Qualquer contador, qualquer pessoa de bem, qualquer professor de matemática consegue concluir que, ao longo do tempo, eu obtive recursos suficientes para comprar os imóveis que comprei e reformar os imóveis que reformei. Só um irresponsável, mal intencionado, ousaria tentar me incriminar, a minha família, meu filho de 9 anos de idade, como lavadores de dinheiro. Dizer que lavei dinheiro em uma casa alugada? — disse Temer, durante o pronunciamento.

As declarações do presidente provocaram reações imediatas de entidades ligadas à Polícia Federal. Em nota divulgada ontem, a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) afirmou que “não admitirá pressões ou campanhas com a finalidade de desacreditar a atuação dos delegados da Polícia Federal” na condução das investigações que envolvem Temer e também de outras investigações da PF.

A entidade afirmou ainda que “é necessário serenidade” por parte do presidente “para que suas manifestações não se transformem em possíveis ameaças e venham exercer pressão indevida sobre a Polícia Federal”.

A ADPF reiterou “que a instituição não protege, nem persegue qualquer pessoa ou autoridade pública, apenas cumpre seu dever legal de investigar fatos e condutas tipificadas como crimes”. A entidade dos delegados federais também usou a nota para criticar a postura de Temer: “É muito comum que investigados e suas defesas busquem, por todos os meios, contraditar as investigações”.

 

CORONEL LIMA

A Polícia Federal marcou o interrogatório da filha de Temer para a próxima quinta-feira. Os investigadores tentam descobrir se uma reforma na casa de Maristela Temer foi utilizada para lavar dinheiro de propina destinada ao presidente. O caso começou a ser investigado depois que fornecedores que trabalharam na obra da casa da filha de Temer, localizada na Zona Oeste de São Paulo, admitiram que receberam pagamentos em dinheiro vivo da mulher do coronel da reserva da PM José Baptista Lima Filho, apontado por delatores como arrecadador de propinas do presidente.

Maristela deverá ser ouvida pelo delegado da Polícia Federal Cleyber Malta Lopes, responsável pelo inquérito dos Portos, em São Paulo