O globo, n. 30943, 26/04/2018. País, p. 6

 

Decisão da 2ª Turma não é apocalipse para a operação

Diego Escosteguy

26/04/2018

 

 

Retirada de delação das mãos de Moro tem mais impacto político do que jurídico

São controversas e até mesmo questionáveis as decisões de terça-feira da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que retiraram do juiz Sergio Moro depoimentos de delatores da Odebrecht em casos envolvendo o ex-presidente Lula e crimes na refinaria Abreu e Lima. Não significam, porém, um apocalipse para a Lava-Jato — nem encaminham o petista a um santuário jurídico.

A decisão que envolve Lula tem mais impacto político do que consequência jurídica, conforme um exame detido das leis e dos precedentes do STF — e, ainda, segundo a avaliação de procuradores e juízes que tocam os casos em diferentes instâncias. Atrapalha as ações penais em andamento em Curitiba, por exigir mais idas e vindas nos processos. Pode atrasar os casos. Nada, a princípio, além disso.

Trata-se de dois casos envolvendo Lula. Uma ação penal está em estágio avançado; espera-se uma sentença até junho. Nela, o Ministério Público Federal (MPF) acusa o expresidente de receber propina da Odebrecht por meio de um apartamento em São Bernardo do Campo e de um terreno para a construção do Instituto Lula. Na outra ação, o petista também é réu pela acusação de receber propina da Odebrecht — no caso, o infame sítio em Atibaia.

Mas — e esse é o ponto mais relevante — a decisão da Segunda Turma do STF não abre brecha explícita para retirar de Moro as ações penais contra o petista. Não reconhecer a competência de Moro para receber ou manter as delações da Odebrecht envolvendo Lula não significa pôr em dúvida a competência de Moro para seguir com os casos de corrupção da Petrobras, incluindo os de Lula. Há um abismo entre as duas coisas.

Nada impede que a instrução desses casos de Lula siga normalmente, apesar do percalço imposto pela Segunda Turma do STF. Os delatores da Odebrecht podem depor nesses processos, como em dezenas de outros, produzindo provas, sem prejuízo do local em que estejam seus anexos, os papeis iniciais das colaborações. Esses documentos podem ser encaminhados a São Paulo e obrigar a abertura de outros processos sobre os mesmos temas. É um desperdício do dinheiro dos nossos impostos. Dificilmente configurase uma boa aplicação de Justiça. Não muda, contudo, o desfecho dos casos de Lula em Curitiba.

Outras possíveis consequências dessas decisões do STF, cogitadas desde terça, são ainda mais improváveis, ao menos diante das informações e evidências disponíveis. Elas não apresentam elementos para anular a sentença já proferida por Moro no caso tríplex. Ou, numa outra hipótese sem respaldo na realidade dos fatos e dos precedentes, retirar todos os processos que estão com Moro sobre corrupção na Petrobras.

Esses cenários exigiriam malabarismos jurídicos quase impensáveis, mesmo para os padrões brasileiros. Se maluquices dessa ordem ocorrerem, e nada indica isso neste momento, não terão como precedente as decisões de terça. Nascerão de outro monstro jurídico, ainda desconhecido. Advogados de defesa, por óbvio, prosseguirão tentando, como fazem há quatro anos, retirar de Moro a competência — o poder de julgar os processos — em todos os casos. Mas eles perdem há quatro anos, em todas as instâncias.

A decisão de terça, tomada pela maioria formada por Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, demonstra, mais uma vez, que o trio está convencido de que a Lava-Jato foi longe demais — e que Moro concentra casos em excesso, cometendo excessos. O problema: os relatores da Lava-Jato nas instâncias superiores — TRF-4, STJ e STF — são tão ou mais rigorosos do que Moro. Se há excessos ou abusos, são coletivos e transversais, cometidos por diferentes juízes. Não parece ser o caso de se acreditar numa conspiração de tal estirpe.

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STF julga deputado do PP em 15 de maio

Carolina Brígido

26/04/2018

 

 

Segunda Turma vai examinar caso de Nelson Meurer, o 1º réu da Lava-Jato

-BRASÍLIA- O ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, marcou para o dia 15 de maio o julgamento da primeira ação penal decorrente da operação. O primeiro réu a ter o destino traçado será o deputado Nelson Meurer (PP-PR). Na última sexta-feira, o revisor da Lava-Jato, ministro Celso de Mello, liberou o voto e pediu data para o julgamento.

Os primeiros processos da Lava-Jato chegaram ao STF há três anos. Até agora, nenhum réu foi julgado. Celso de Mello está também com a ação penal da senadora paranaense Gleisi Hoffmann, presidente do PT. O voto referente ao processo será liberado pelo revisor em meados de maio. Gleisi será a segunda investigada a ser julgada pela Segunda Turma. O processo de Meurer teve tratamento prioritário porque foi o primeiro a chegar ao gabinete de Celso.

Como revisor, o ministro tem a responsabilidade de analisar o caso mais detidamente que os outros integrantes da Segunda Turma e votar logo depois do relator. Como o processo de Meurer será o primeiro a ser julgado, servirá como espécie de balizador. Serão discutidos, por exemplo, quais provas são necessárias para validar uma delação premiada, a ponto de justificar uma eventual condenação.

O parlamentar é processado junto com os dois filhos, Nelson Meurer Junior e Cristiano Augusto Meurer, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo as investigações, o exdiretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e a cúpula do PP receberam, entre 2006 e 2014, R$ 357,9 milhões em recursos desviados de contratos de empreiteiras com a estatal. Meurer teria recebido R$ 29,7 milhões.

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PF prende suspeito de fraudar seguro para pescadores

Vinicius Sassine

26/04/2018

 

 

Gerente do Trabalho concedeu benefícios em Caxias do Sul, que não tem mar nem rio

-BRASÍLIA- A Polícia Federal (PF) prendeu ontem o gerente regional do Trabalho em Caxias do Sul (RS), Julio Cesar Goss, diante da suspeita de que ele fraudou a concessão de 7 mil benefícios do seguro-desemprego a pescadores, o chamado seguro defeso. O desvio dos cofres públicos chegou a R$ 20,4 milhões, segundo a PF. A história de Julio Cesar e das supostas alterações cadastrais que geraram as fraudes foram descobertas pelo GLOBO. Em reportagem publicada na edição de ontem, o jornal revelou que o login do funcionário está por trás de 7 mil benefícios suspeitos concedidos numa cidade que não tem rio, litoral e pescadores.

Na tarde de ontem, o Ministério do Trabalho informou que a Superintendência Regional do Rio Grande do Sul afastou o servidor, e que um processo administrativo disciplinar foi aberto para apurar os fatos. Além da prisão, a Justiça Federal autorizou busca e apreensão na casa Julio Cesar Goss é acusado de conceder 7 mil benefícios irregulares de Julio Cesar e na gerência do Trabalho em Caxias do Sul.

O nome do gerente encabeça uma lista de 50 pessoas suspeitas de operarem as maiores fraudes no seguro-desemprego e no seguro defeso entre agosto de 2016 e março deste ano. A reportagem esteve em Caxias do Sul no último dia 17, quando conversou com Julio Cesar sobre a suspeita de que seu login foi usado para destravar mais de 7 mil seguros defeso, com pagamentos que poderiam alcançar R$ 24 milhões — cerca de R$ 4 milhões foram bloqueados.

Desde 2015, não é mais o Ministério do Trabalho que faz as liberações do seguro defeso, concedido a pescadores artesanais durante os meses em que não podem pescar em razão da reprodução dos peixes. Esta atribuição agora é do INSS. Mesmo assim, o login de Julio Cesar aparece como responsável por mudanças cadastrais dos trabalhadores, o que permitiria liberar o dinheiro.

Com base em relatório encaminhado pelo Ministério do Trabalho, a PF em Caxias do Sul instaurou um inquérito. Diante da gravidade das suspeitas, do montante envolvido e da necessidade de preservar provas, protocolou os pedidos de prisão temporária, buscas e apreensões e o afastamento do servidor.