O globo, n. 30942, 25/04/2018. País, p. 6

 

Presidente do PP é suspeito de pagar para obstruir lava-jato

Jailton de Carvalho, Mateus Coutinho e Eduardo Bresciani 

25/04/2018

 

 

PF fez buscas no gabinete do senador Ciro Nogueira, e prendeu ex-deputado

-BRASÍLIA- Numa nova frente da Operação LavaJato, a Polícia Federal prendeu ontem o ex-deputado Márcio Junqueira (PROS-RR) e fez buscas nos gabinetes e endereços residenciais do senador Ciro Nogueira (PP-PI) e do deputado Dudu da Fonte (PP-PE). Em endereços do senador, presidente nacional do PP, foram apreendidos R$ 200 mil em espécie. O senador, o deputado e o ex-deputado são acusados de obstruir as investigações, tentando comprar o silêncio de uma testemunha. Junqueira é suspeito de tentar corromper e ameaçar este colaborador da Justiça, que prestaria depoimento contra Ciro Nogueira e Dudu da Fonte em investigação sobre o envolvimento deles no esquema de corrupção na Petrobras.

A testemunha alvo das ameaças é o motorista José Expedito Rodrigues de Almeida. Ele confirmou a intermediação de pagamentos aos parlamentares do PP. Em troca, foi incluído no Programa de Proteção a Testemunhas. As investigações surgiram no inquérito aberto para apurar repasses da empreiteira Queiroz Galvão a parlamentares do PP no esquema de corrupção na Petrobras. Os pagamentos seriam operados pelo doleiro Alberto Youssef e por seu ex-sócio Leonardo Meirelles, também delator na Lava-Jato.

As buscas e a prisão foram pedidas pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e autorizadas pelo ministro Edson Fachin, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). “O objetivo das medidas cautelares é reunir mais provas de que os dois políticos tentavam comprar o silêncio de um ex-assessor que tem colaborado com as investigações”, diz nota divulgada pela assessoria da procuradora-geral. Segundo o texto, Junqueira seria responsável por “pagamento de despesas pessoais, ameaças e até proposta para a mudança do teor de depoimento que incriminaria os alvos da operação”.

Ciro Nogueira e Dudu da Fonte vêm sendo investigados como destinatários de pagamento de propina desde o começo da Operação LavaJato. O nome do senador aparece nas delações de Alberto Youssef, do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, do empresário Ricardo Pessoa e de executivos da Odebrecht e da JBS, entre outros importantes delatores. Ciro e Dudu já foram denunciados ao STF por organização criminosa no inquérito conhecido como “quadrilhão do PP”.

A denúncia foi feita ainda pelo ex-procurador Rodrigo Janot. Em março, a atual procuradorageral, Raquel Dodge, referendou as acusações. O Ministério Público afirma que os integrantes do partido indicavam para cargos no governo federal pessoas comprometidas em arrecadar propina para o grupo. O PP de Ciro Nogueira dividia com o PMDB a responsabilidade pela indicação de Paulo Roberto na Diretoria de Abastecimento da Petrobras, um dos maiores focos da corrupção na estatal. O partido é uma das siglas com o maior número de parlamentares investigados na operação.

 

ENVOLVIDOS NEGAM ACUSAÇÕES

Policiais federais chegaram aos gabinetes de Ciro e Dudu por volta das 6h da manhã. A segurança do Senado isolou o corredor que dá acesso ao gabinete do senador. Ciro está em Bruxelas, na Bélgica, em missão oficial. Após mais de seis horas no gabinete, os policiais deixaram o local com um malote grande. A PF também fez buscas nos apartamentos funcionais e endereços dos investigados em Teresina, Recife e Boa Vista. Ao todo foram cumpridos oito mandados de busca.

Márcio Junqueira foi preso em caráter preventivo. As prisões preventivas indicam que o investigado deverá responder ao inquérito e até mesmo o processo preso. Sugerem ainda que os indícios recolhidos pelos investigadores são considerados consistentes pelo juiz, neste caso o ministro Edson Fachin do STF.

O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, disse que não teve acesso aos autos e que, por isso, não faria comentários sobre o conteúdo das acusações. “É certo que o senador sempre se colocou à disposição do Poder Judiciário, prestando depoimentos sempre que necessário e, inclusive, já foi alvo de busca e apreensão. Continuará a agir o senador como o principal interessado no esclarecimento dos fatos”, afirma o advogado em nota.

No fim da manhã, Ciro teria dito a Kakay que ele poderia “ficar 100% tranquilo”. O senador negou que tenha participado de qualquer tentativa de barrar as investigações. Dudu não quis dar entrevista. Em nota, divulgada pela assessoria de imprensa, o deputado disse que está “à disposição da Justiça sempre. Confiamos nela e em Deus”.

Junqueira foi preso por volta das 6h da manhã em sua casa, em Brasília. Segundo o advogado Bruno Pena, o ex-deputado está disposto a falar, mas nega qualquer relação com as supostas ameaças e suborno a testemunha mencionada pela Procuradoria-Geral. Pena é advogado do PROS e foi escalado para dar assistência ao exdeputado. No primeiro contato, o advogado orientou o cliente a permanecer em silêncio até que eles tenham acesso aos autos.