Valor econômico, v. 17, n. 4434, 01/02/2018. Brasil, p. A2.​

 

 

Governo já fala em usar receitas de 'megaleilão' para pagar Petrobras

Daniel Rittner e Rafael Bitencourt

01/02/2018

 

 

Ao contrário do que se previa inicialmente, a Petrobras poderá receber em dinheiro sua parte na revisão do contrato da cessão onerosa, pelo qual ganhou o direito de explorar 5 bilhões de barris de petróleo na camada do pré-sal em 2010. Essa possibilidade foi aberta pelo secretário de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, que reiterou ontem o objetivo do governo de fazer um "megaleilão" até a primeira semana de julho.

"É um cronograma bastante apertado, mas factível", disse o secretário, calculando entre R$ 80 bilhões e R$ 100 bilhões a arrecadação potencial com o bônus de assinatura dos excedentes da cessão onerosa. Uma parte das receitas poderia, então, ser revertida à Petrobras como forma de quitar o valor devido pela União.

"Pode [ser em dinheiro]", afirmou Félix, depois da cerimônia de assinatura dos contratos de áreas licitadas na 2ª e na 3ª rodadas do pré-sal, realizadas no ano passado sob o regime de partilha.

O governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva cedeu à Petrobras o direito sobre 5 bilhões de barris localizados em seis blocos do pré-sal. A cessão precisa ser revisada usando-se as premissas mais atuais, como o preço internacional do petróleo e o volume das reservas nesses blocos.

Dois pontos vêm sendo tratados como praticamente certos no mercado. Primeiro: a estatal muito provavelmente será credora da União. Segundo: diante das restrições orçamentárias, o Tesouro Nacional não teria como transferir recursos à empresa e o pagamento ocorreria transferindo-se o direito de exploração sobre um volume adicional de reservas.

O aceno do secretário é importante, porque dispensaria o governo de mudar a legislação. Hoje, a lei só prevê o pagamento em dinheiro. Se fosse ceder mais direitos de exploração como forma de quitar a fatura, o governo teria que editar uma medida provisória ou aprovar um novo projeto.

Félix disse que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) deve, em reunião extraordinária, dar sinal verde em março ao "megaleilão". O excedente da cessão onerosa poderia ser licitado até 7 de julho, segundo ele, que relatou o interesse de multinacionais petrolíferas no certame. "Foi o que nos apontaram na China e em Davos", comentou, citando as duas viagens mais recentes ao exterior do ministro Fernando Coelho Filho.

O ministro antecipou que a economia brasileira poderá viver uma "euforia semelhante" à vivida na descoberta do pré-sal, em meados da década passada, com a decisão do governo de acelerar a exploração de áreas. Ele lembrou uma série de medidas favoráveis aos investimentos no setor - a lei que retirou a obrigação da Petrobras de participar como operadora única, flexibilização do conteúdo local, unitização das áreas adjacentes, renovação dos incentivos previstos no Repetro.

A "euforia" evocada por Coelho Filho foi traduzida em números pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). De acordo com o diretor-geral da agência, Décio Oddone, o aumento na produção se converterá em R$ 100 bilhões de receitas anuais ao Tesouro Nacional ao fim da próxima década. Nos próximos dez anos, acrescentou, 40 novas plataformas vão entrar em funcionamento e haverá investimentos de R$ 850 bilhões no setor. Com isso, o país deve atingir produção diária de 5 milhões de barris.

Após a solenidade no Palácio do Planalto, ontem à tarde, o ministro foi questionado sobre o envio ao Congresso Nacional do projeto de lei que trata da reforma do setor elétrico. Ele garantiu que a proposta será encaminhada à Casa Civil, última instância revisora do governo, até sexta-feira da próxima semana. Por enquanto, segundo ele, o projeto não contempla uma solução para o impasse bilionário envolvendo o déficit de geração pelos donos de hidrelétricas (conhecido pela sigla em inglês GSF).

Coelho Filho manifestou otimismo com a possibilidade de aprovar outro projeto, o que detalha a modelagem de privatização da Eletrobras, no primeiro semestre. Ele acredita que a deliberação da assembleia geral de acionistas da empresa sobre a emissão de ações ocorra em junho.