Valor econômico, v. 18, n. 4436, 05/02/2018. Empresas, p. B1.​

 

 

União deve transferir passivos de distribuidoras para Eletrobras

Camila Maia e Rodrigo Polito

05/02/2018

 

 

Com o objetivo de viabilizar a venda de seis distribuidoras de energia da Eletrobras, a União deve votar, na assembleia geral extraordinária (AGE) marcada para esta semana, a favor de que possíveis débitos bilionários das concessionárias sejam assumidos pela holding. Ao mesmo tempo, a decisão pode obrigar a estatal a fazer uma baixa contábil de cerca de R$ 12,5 bilhões, o que pode colocar em risco sua privatização.

Valor apurou com fontes da equipe do governo que a União, ao mesmo tempo, vai contrariar a recomendação do conselho da Eletrobras e votar para que créditos no valor de R$ 8,5 bilhões que as distribuidoras têm com fundos setoriais sejam transferidos para a holding no contexto da venda das concessionárias.

O conselho da companhia havia recomendado que esses créditos fossem mantidos nas distribuidoras, pelo risco elevado de que eles se transformem em passivos bilionários. A votação será na assembleia geral extraordinária marcada para 8 de fevereiro.

Enquanto as distribuidoras têm os créditos com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) já lançados em seus balanços, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) entende que elas têm, na verdade, passivos de R$ 4 bilhões com o fundo setorial.

Como os créditos já estão no balanço das empresas, a decisão da Aneel pode fazer com que a Eletrobras precise fazer uma baixa contábil de mais de R$ 12 bilhões com a assunção dessas dívidas.

Segundo uma fonte, a decisão da União ainda não está fechada, e deve ser tomada nesta semana, antes da realização da AGE. A tendência é de que os créditos (ou débitos) sejam assumidos pela Eletrobras, pela expectativa de que, futuramente, a companhia possa chegar a um entendimento favorável com a Aneel. "Há expectativa de créditos. Então não é um problema. Se a holding fosse assumir só passivos, mas não, está previsto débito e crédito", disse uma fonte.

Ao levar os créditos (ou débitos) para a holding, a Eletrobras vai aumentar consideravelmente as chances de sucesso da venda das distribuidoras de energia, principalmente a Amazonas Energia e a Ceron (Rondônia), as mais endividadas. Além dessas, também serão vendidas as empresas Boa Vista (Roraima), Eletroacre, Ceal (Alagoas) e Cepisa (Piauí).

O racional por trás disso é que, sem transferir os créditos da CDE para a Eletrobras, as distribuidoras não serão vendidas, pela falta de interessados. Sem a venda das distribuidoras, a privatização da própria companhia ficará em xeque.

A posição do MME é que a Medida Provisória (MP) 814 abre espaço para que a Aneel reveja as conclusões da fiscalização dos créditos que as distribuidoras têm junto aos fundos setoriais.

O governo entende que, dificilmente, o impasse será solucionado antes do leilão de venda das distribuidoras, previsto para abril. A expectativa é que, uma vez que os créditos estejam na Eletrobras, a estatal e a União possam chegar a uma solução antes da privatização da companhia, já com a MP aprovada pelo Congresso e convertida em lei.

A MP cria bases legais, por exemplo, para resolver um problema da Ceron (Rondônia), e da Eletroacre. A Ceron tem em seu balanço créditos de R$ 3,847 bilhões com a CDE, enquanto a Eletroacre tem R$ 296,1 milhões. A Aneel, por sua vez, estima que a Ceron tem que devolver R$ 731,5 milhões, e a distribuidora do Acre outros R$ 276,5 milhões.

O impasse está relacionado à duração dos contratos de geração de energia no sistemas isolados. As duas distribuidoras precisaram bancar a compra de combustível para geração de energia sem subsídios da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), pois os contratos das geradoras contratadas venceram e não foram feitas novas licitações a tempo, por problemas diversos. Se não tivessem feito isso, o fornecimento de energia seria comprometido nessas regiões.

De acordo com uma fonte, com essa alteração, o resultado da fiscalização da Ceron, por exemplo, será positivo para a companhia.

Além disso, a MP 814 também postergou o prazo para que a União aporte R$ 3,5 bilhões nessas distribuidoras para pagamento de despesas com combustível nos sistemas isolados.

A combinação desses fatores deve ajudar a minimizar o problema da fiscalização dos créditos, garantindo que as distribuidoras recebam ao menos parte deles. Como a Eletrobras vai assumir as obrigações, o efeito nas contas da companhia seria positivo, ajudando a atenuar outros R$ 11,2 bilhões em dívidas das distribuidoras que serão assumidos pela holding de qualquer maneira.