Título: À queima-roupa
Autor: Caraveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 21/03/2012, Mundo, p. 16

À queima-roupa

Autor de massacre em escola de Toulouse disparou contra a cabeça de professor e de três alunos. Autoridades temem um novo ataque

Todos os tiros foram disparados contra a cabeça das vítimas, à queima-roupa. Uma câmera pendurada no pescoço do assassino teria registrado a matança. Os detalhes macabros do massacre de anteontem ocorrido na escola judaica de Ozar Hatorah, em Toulouse (sudoeste da França), reforçam as suspeitas da ação de um psicopata ávido por propaganda e provavelmente motivado pela xenofobia. Blindada e em choque, a cidade de 500 mil habitantes aguarda o próximo ataque.

Enquanto a polícia empreende uma das maiores caçadas da história do país, a Promotoria-Geral da França qualifica o incidente de "terrorista" e admite o risco de novos tiroteios. "O assassino é um indivíduo extremamente determinado, com o mesmo modus operandi e cujas ações são premeditadas. É possível que ele volte a agir", afirmou o promotor François Molins. Três soldados africanos foram executados do mesmo modo, entre 11 e 15 de março, em Toulouse e em Montauban, a 46km dali.

Os caixões das quatro vítimas são carregados para fora do centro de ensino, onde ocorreu o massacre

Segundo Molins, testemunhas descreveram o atirador de Ozar Hatorah como um homem magro, com cerca de 1,75m. "O criminoso é antissemita ou terrorista. Uma hipótese não exclui a outra", comentou. "As circunstâncias em que estas matanças foram cometidas perturbaram gravemente a ordem pública pela intimidação e pelo terror, e os ataques podem ser caracterizados como atos de terrorismo", explicou o promotor.

Um aparato de segurança nunca antes visto foi mobilizado na região dos Pirineus Médios, envolvendo 14 equipes da Raid — a unidade de elite da polícia — e 14 das Companhias Republicanas de Segurança (CRS), além de efetivos da Direção Central da Polícia Judiciária, da Direção de Vigilância Territorial e do Diretório Central de Inteligência Interna. Ao todo, 250 investigadores tentam capturar do assassino.

Por enquanto, são poucas as certezas. As autoridades negam o envolvimento de paraquedistas do 17º Regimento de Engenharia de Montauban, expulsos das Forças Armadas por sua simpatia pelo neonazismo. As investigações relacionadas aos três crimes foram unificadas, após a constatação de que a arma Colt, de calibre 11.45mm, e a motoneta Scooter Yamaha T-Max 530 branca foram usadas em todas as ocasiões. O jornal Le Figaro divulgou que a polícia analisa uma pista obtida em Seine-et-Marne, a 594km de Toulouse. Um homem contou ter visto uma mulher falando ao celular em atividade suspeita, no trem. "Agora, você tomará a escola", teria dito ela, sem disfarçar o nervosismo. Os investigadores já interrogaram centenas de pessoas, mas não efetuaram prisões.

Enterro Os corpos do professor de ensino religioso Jonathan Sandler e dos filhos Gabriel, de 3 anos, e Arieh, de 6; além da filha de 8 anos do diretor da escola serão enterrados hoje em Jerusalém. Os caixões foram recebidos no aeroporto de Rossy, perto de Paris, às 17h30 de ontem (14h30 em Brasília), pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, e pelo premiê François Fillon. Antes de seguirem para Israel, receberam homenagens do chefe de Estado.

O massacre mudou a rotina de Toulouse. "O Plano Vigipirate atingiu o nível escarlate, o mais alto, reservado a ameaças terroristas elevadas. As forças especiais do Grupo de Intervenção da Polícia Nacional (GIGN, pela sigla em francês) estão prontas para agir. É bem assustador", admitiu ao Correio, pela internet, o fotógrafo Félix Debons, de 28 anos, que mora a 1km da escola de Ozar Hatorah. Ele acha que o assassino seleciona suas vítimas. "Sua motivação seria o ódio e a dominação. Ele deve atacar novamente, talvez seja ex-militar", disse. Félix relatou ter visto oito carros da polícia no trajeto de 20 minutos, de casa até o hospital.

Funcionária de uma revista na cidade, Camille Agar, de 22 anos, descreveu o horror. "Todos os moradores estão aterrorizados. Há policiais por todos os locais e pessoas a bordo de motonetas são consideradas suspeitas", contou. "Também tivemos hoje marchas silenciosas, em memória às sete vítimas", emendou.

O país silencia por um minuto Às 11h (8h em Brasília), todas as escolas da França observaram um minuto de silêncio. Na escola primária de Hospitalières-Saint-Gervais, em Paris, os estudantes receberam instruções da professora e interromperam a aula (foto). O presidente Nicolas Sarkozy visitou a escola secundária François Couperin, na capital, e participou da homenagem. François Hollande, candidato socialista à presidência, esteve em Hospitalières-Saint-Gervais. "Crianças muito pequenas, de 3 anos, foram informadas sobre os assassinatos, a pedido de Sarkozy", disse ao Correio Félix Debons, de Toulouse.