Valor econômico, v. 18, n. 4463, 16/03/2018. Brasil, p. A2.​

 

 

Indústria e alumínio teme ser preterida na reação do Brasil à sobretaxa dos EUA

Fábio Pupo e Renato Rostás

16/03/2018

 

 

A indústria brasileira de alumínio subiu o nível de alerta em meio às discussões acerca da recém-anunciada sobretaxa americana de importação do produto e passou a cobrar mais atenção das autoridades. O receio é que o setor acabe preterido nas negociações e que o país acabe privilegiando a proteção às empresas de aço.

O presidente da Associação Brasileira de Alumínio (Abal), Milton Rego, chegou a ter nesta semana uma reunião com a equipe econômica sobre o tema. "Fomos apresentar um panorama da indústria do alumínio para não ficar em segundo plano nas negociações", disse. Ele afirma que já esperava que aço e alumínio não tivessem a mesma importância nas discussões devido ao maior volume de exportações aos Estados Unidos do setor siderúrgico do que de alumínio. "Mas a preocupação é de que não tenhamos importância nenhuma", disse.

Segundo o presidente da Abal, a equipe econômica compreendeu a mensagem da entidade, mas os receios permanecem sobre qual será o comportamento do governo na reação aos Estados Unidos. Para o presidente da entidade, a alegada preferência por proteção ao aço não foi manifestada oficialmente, mas tem sido percebida pelas empresas de alumínio nas declarações das autoridades. "Basta ver a cobertura a respeito [das declarações] das principais figuras do governo, especialmente do Itamaraty, e o espaço que é ocupado pelo aço e pelo alumínio. O alumínio é somente mencionado e a grande discussão é sempre do aço", disse.

O governo já anunciou que o Itamaraty está à frente do tema. Procurado ontem no começo da noite, o Ministério das Relações Exteriores afirmou que não havia tempo hábil para responder.

O aço é mais relevante nas exportações brasileiras. O país vendeu ao exterior um valor dez vezes maior (R$ 7,9 bilhões) de aço do que de alumínio (R$ 812 milhões) em 2017. Para os Estados Unidos, foram exportados R$ 120 milhões em alumínio, o que corresponde a 15% do total exportado pelo Brasil. Já o aço chegou a R$ 2,6 bilhões, 33% do total do produto embarcado.

Mas o maior medo da indústria brasileira do alumínio é sofrer com a potencial concorrência de importados barrados nos EUA e direcionados ao Brasil. O mercado internacional de alumínio, tanto do metal primário quanto de produtos fabricados com a commodity, encontra-se em excesso de capacidade, principalmente pelos avanços da China na década passada.

"O cenário ideal seria que Trump propusesse ações para diminuir a oferta global, não para tornar o produto chinês menos competitivo artificialmente", diz o presidente da Abal. "É uma briga de elefantes, ou os outros fogem, ou são pisoteados. Minha preocupação é que o Brasil sofra com isso."

A Abal acabou de publicar um estudo - feito em parceria com as empresas, especialistas de mercado e governo - a respeito do que poderia ser feito para o setor do alumínio sobreviver no longo prazo. O consenso foi de que é vital para a indústria estar presente em todas as pontas da cadeia: da lavra da bauxita até a fabricação de produtos acabados.

Enquanto os principais produtos de exportação do país são primários (alumina, com 62%, alumínio, com 13,9%, e bauxita, com 7,4%), na importação os acabados são regra (chapas, com 15,9%, ligas, com 12,7%, e folhas, com 9,6%). Nos últimos anos, os principais grupos concentraram-se em alguma das pontas da cadeia para continuar sobrevivendo.

A energia é o principal insumo do elo que une o mineral da bauxita e os transformados. Em 2016, a eletricidade representava 70% do custo total de produção do alumínio primário. A gigante americana Alcoa, por exemplo, desligou a produção de primário no Brasil por conta disso. A Hydro, por outro lado, é muito mais competitiva no início da cadeia.

"O governo tem que ter políticas públicas a respeito disso e o maior gargalo é mesmo a energia", diz Rego. "Precisamos atrair agentes dispostos a investir no setor, trabalhar em conjunto com a pesquisa acadêmica para ver inovação na indústria e simplificar os tributos. O Brasil precisa desse planejamento estratégico."