O Estado de São Paulo, n. 45407, 11/02/2018. Política, p. A5
Barroso intima Segovia sobre declarações
11/02/2018
Ministro do STF manda diretor da PF esclarecer entrevista na qual indica possível pedido de arquivamento do inquérito que envolve Temer
O ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso determinou ontem que o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, seja intimado para prestar esclarecimentos sobre declarações à agência Reuters. Na entrevista, o chefe da PF sugere que a tendência da corporação seria recomendar o arquivamento do inquérito que apura o chamado Decreto dos Portos e tem o presidente Michel Temer entre os investigados. As declarações causaram forte reação das entidades representativas dos policiais federais. Em mensagens aos colegas e em nota, Segovia negou que tenha antecipado uma decisão pelo arquivamento da investigação .
Na entrevista à Reuters, o diretor-geral da PF afirma que as investigações não encontraram provas de irregularidades envolvendo Temer e sugere que a tendência da corporação é recomendar o arquivamento do inquérito. Ele diz ainda que pode abrir investigação interna para apurar a conduta do delegado Cleyber Malta Lopes. O motivo seriam os questionamentos enviados ao presidente no caso. Ontem, Segovia disse que Lopes tem “total independência” e a equipe de policiais que trabalham nos chamados inquéritos especiais age “com toda autonomia e isenção, sem interferência da direção-geral”.
Além de Temer, são investigados no inquérito o ex-assessor da Presidência e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (MDBPR), o presidente da Rodrimar, Antônio Grecco, e o diretor da empresa Ricardo Mesquita.
Para Barroso, relator da investigação no Supremo, as declarações do diretor-geral da PF podem caracterizar infração administrativa ou penal. “Tendo em vista que tal conduta, se confirmada, é imprópria e pode, em tese, caracterizar infração administrativa e até mesmo penal, determino a intimação do delegado para que preste os esclarecimentos que lhe pareçam próprios”, diz o despacho do ministro. Barroso também pediu que o Ministério Público Federal tome as providências “que entender cabíveis” no caso.
Esta é a única investigação no STF ainda em curso contra Temer. No ano passado, a Câmara dos Deputados barrou o andamento de duas denúncias contra o presidente relacionadas à delação do Grupo J&F.
Mesmo que a PF conclua que não houve crime, caberá à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, decidir se aceita a recomendação e pede o arquivamento do caso ao STF.
Entidades. A reação entre as entidades da categoria foi ampla. A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, em nota, disse que nenhum dirigente deve se manifestar sobre investigações em andamento. “A ADPF espera que o diretor-geral garanta, nas palavras e nos atos, os instrumentos necessários para que os delegados exerçam suas atribuições de forma técnica e republicana, sem temor por reações do poder político e econômico.”
A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais também se manifestou. “É sempre temerário que a direção-geral emita opiniões pessoais sobre investigações nas quais não está diretamente envolvida.”
A Federação Nacional dos Policiais Federais divulgou comunicado manifestando preocupação com as declarações de Segovia. O texto da nota diz que ele “extrapolou em suas funções”. “Os policiais federais esperam uma retratação pública desse posicionamento.”
O presidente da OAB nacional, Claudio Lamachia, afirmou ontem não ser “apropriado” que o diretor-geral da PF “dê opiniões a respeito de investigações em curso”. “Quanto à possibilidade de punição ao delegado que conduz o inquérito, devemos observar que o investigador deve ter sua liberdade e independência preservadas. Ao agir de acordo com a lei, o investigador não comete ilícito.”
Procurada, a Reuters não havia se manifestado até a conclusão desta edição. / FABIO SERAPIÃO, JULIA AFFONSO, LUIZ VASSALLO, RAFAEL MORAES MOURA e DAIENE CARDOSO
Esclarecimentos​. “Determino a intimação do delegado, para que preste os esclarecimentos que lhe pareçam próprios e se abstenha de novas manifestações a respeito.” - Luis Roberto Barroso​, MINISTRO no STF