O Estado de São Paulo, n. 45431, 07/03/2018. Política, p. A8.

 

 

Barroso pede para apurar 'vazamento' à defesa de Temer

Teo Cury

07/03/2018

 

 

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, determinou ontem que a Polícia Federal investigue “vazamento” de informações do inquérito que apura irregularidades no chamado Decreto dos Portos. No despacho, o ministro afirma que a defesa do presidente Michel Temer teve acesso a números de autuação de procedimentos “absolutamente sigilosos”.

As informações estavam em petição na qual a defesa pede acesso à decisão de Barroso que autoriza a quebra de sigilo bancário do presidente. O ministro é relator do inquérito que investiga irregularidades na edição do Decreto dos Portos, assinado por Temer em maio de 2017.

“Verifico que a petição apresentada pela ilustre defesa do Excelentíssimo Senhor Presidente da República revela conhecimento até mesmo dos números de autuação que teriam recebido procedimentos de investigação absolutamente sigilosos. Diante de novo vazamento, determino que seja incluída na investigação a apuração das responsabilidades cabíveis”, escreveu Barroso.

O advogado de Temer Brian Alves Prado afirmou ao Estado que a defesa não teve acesso ao conteúdo do procedimento. Ontem, em nota, o Palácio do Planalto informou que advogados do presidente obtiveram os dados no site do Supremo Tribunal Federal. “O escritório do advogado do presidente Michel Temer, Antônio Mariz, já está esclarecendo ao ministro Luís Roberto Barroso que os dados sobre o presidente estavam disponíveis e foram coletados no site do STF”, afirma a nota.

No documento, o relator disse ainda que apreciará “oportunamente” a solicitação de acesso aos procedimentos que a defesa do presidente mencionou. “Junte-se aos autos deste inquérito, com tarja nos números dos procedimentos sigilosos. Remetam-se cópias desta decisão e das petições acima referidas (também com tarjas sobre os números de procedimentos sigilosos) à Polícia Federal.”

 

Quebra de sigilo. Ao autorizar, anteontem, a quebra do sigilo bancário de Temer, o ministro do STF atendeu a um pedido do delegado Cleyber Malta, responsável pelo inquérito que investiga irregularidades na edição do Decreto dos Portos. A decisão de Barroso é de 27 de fevereiro. A perda de sigilo abrange o período entre 2013 e 2017.

A solicitação feita por Malta, em dezembro de 2017, diverge do requerimento da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Em dezembro, ela pediu quebras de segredo no âmbito da investigação dos portos, mas não incluiu o presidente. No entendimento da PGR, não havia, à época, elementos para a quebra do sigilo de Temer.

 

‘Não agrada.’ O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou ontem que a decisão de autorizar a quebra de sigilo bancário do presidente “não é algo que agrada”, mas ponderou que, por não ter nada a esconder, o chefe do Executivo está decidido a tornar a movimentação financeira pública.

Sobre a possibilidade de o presidente recorrer da decisão, Padilha afirmou que, em “decisões judiciais, em tese, sempre cabe recurso”. “Agora o presidente não tem se mostrado com vontade de recorrer.”

O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Carlos Marun, também havia dito que o presidente não vai recorrer da decisão de Barroso. “A decisão de não recorrer é para que o recurso não sirva de munição à hipocrisia dos adversários”, declarou Marun em entrevista no Planalto, reiterando que a decisão de Barroso evidencia caráter “abusivo”. “Quem tomou a decisão, a tomou de forma abusiva e desnecessária, haja vista a fragilidade do inquérito, que não possui base fática”, declarou Marun, sem citar Barroso.

Já o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, minimizou a decisão de Barroso. Jungmann disse que “decisão judicial não se discute, se cumpre”, mas acrescentou que o presidente já se antecipou para “mostrar sua inocência”.

O inquérito, aberto em setembro do ano passado, apura se houve favorecimento à empresa Rodrimar no decreto que trata da prorrogação de contratos da concessão de áreas no Porto de Santos. As suspeitas são de lavagem de dinheiro e corrupção. / COLABORARAM CARLA ARAÚJO, TÂNIA MONTEIRO, RENAN TRUFFI e JULIA LINDNER

 

Barroso em sessão no STF

O ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso, que pediu quebra de sigilo bancário do presidente Michel Temer, participa de sessão na Corte

 

Conhecimento

“Verifico que a petição apresentada pela ilustre defesa do Exmo. Senhor Presidente da República revela conhecimento até mesmo dos números de autuação que teriam recebido procedimentos de investigação absolutamente sigilosos. Diante de novo vazamento, determino que seja incluída na investigação (...) a apuração das responsabilidades cabíveis.”

Luís Roberto Barroso

MINISTRO DO STF

 

A INVESTIGAÇÃO

O que é o Decreto dos Portos?

Editado em 10 maio de 2017 pelo presidente Michel Temer, o decreto aumenta para 35 anos o prazo de contratos arrendatários no Porto de Santos, prorrogáveis por até 70 anos.

 

O que está sendo investigado?

Estão sendo investigados crimes de lavagem dinheiro, corrupção ativa e passiva; empresas, entre elas a Rodrimar, teriam sido beneficiadas pelo decreto assinado por Temer.

 

Os investigados

1) Michel Temer, presidente; 2) Rodrigo Rocha Loures, ex-deputado federal e ex-assessor de Temer; 3) Antônio Celso Grecco, dono da Rodrimar, 4) Ricardo Conrado Mesquita, diretor da Rodrimar.

 

Como chegou ao presidente

Conversa entre Temer e Loures, que estava grampeado, foi interceptada pela PF em 4 de maio de 2017. O então deputado tentava obter informações sobre a assinatura do decreto.

 

Em que fase está o inquérito

O inquérito foi aberto em setembro de 2017. A PF enviou ao presidente 50 perguntas, respondidas por Temer em 18 de janeiro. Luis Roberto Barroso, do STF, pediu quebra de sigilo bancário.