Correio braziliense, n. 20090, 24/05/2018. Economia, p. 7

 

Desabastecimento e aumento de preços

Alessandra Azevedo e Flávia Maia

24/05/2018

 

 

CRISE DOS COMBUSTÍVEIS » Setor de supermercados alerta para a falta de alguns produtos e para o aumento do custo. JBS suspende abate em quatro unidades, ônibus reduzem frota no Rio e em São Paulo. Em Brasília, distribuição de gás e vendas do McDonalds são afetadas

Enquanto o governo se desdobra para encontrar uma solução para o problema da greve dos caminhoneiros, os brasileiros enfrentam uma crise de desabastecimento. O cenário inclui bombas zeradas nos postos de gasolina, linhas de ônibus reduzidas, ameaças de cancelamento de voos por falta de combustível, prateleiras vazias em supermercados e, até, restrições nos cardápios de lanchonetes.

Os prejuízos são percebidos, principalmente, nos setores de transportes e de alimentação. Ontem, consumidores de pelo menos 10 estados sentiram falta de itens perecíveis, como frutas, legumes e verduras, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras). A consequência é de que os preços de produtos com alta demanda, como a batata, subiram em alguns pontos de venda. A situação “é uma verdadeira bola de neve”, nas palavras do presidente da Federação da Agricultura de São Paulo (Faesp), Fábio Meirelles: o aumento nos custos da produção gera a necessidade de reajuste. Tanto a escassez de opções quanto a elevação nos preços poderão “se estender por todo o Brasil nos próximos dias, se algo não for feito”, alertou a Abras, em nota.

Carnes

Além disso, caso a greve continue, os consumidores também poderão ter dificuldade para encontrar carnes suínas, bovinas e de aves nos próximos dias. Até ontem, 129 frigoríficos haviam parado a produção devido à greve, número que pode chegar a 208 amanhã, pelas estimativas de associações que representam os setores. Nesse caso, o resultado será a paralisação de cerca de 90% da produção nacional de carne. A BRF, dona da Sadia e da Perdigão, já suspendeu as atividades em quatro unidades de abate de frangos e suínos e relatou uma falta “considerável” de abastecimento de ração para cerca de 1 milhão de animais.

Em Brasília, as consequências chegaram até redes de fast food. Na tarde de ontem, o McDonald’s do Sudoeste não estava vendendo Big Mac porque o caminhão não havia chegado com o carregamento. Segundo um atendente, várias lojas da rede estavam com o mesmo problema.

O desabastecimento de gás também é uma realidade na capital. O Sindicato das Empresas Transportadoras e Revendedoras de Gás LP do Distrito Federal (Sindivargas) emitiu um alerta de desabastecimento do combustível na capital. A previsão é de que o estoque nas revendedoras seja suficiente até amanhã. De acordo com nota assinada pelo presidente da instituição, Sérgio Costa, o sindicato “comunga com as reivindicações dos caminhoneiros no protesto”, entretanto, ressalta que, com os bloqueios, as companhias estão “sem possibilidades de logística em fornecer o gás de cozinha residencial e industrial”.

A greve dos caminhoneiros também tem reflexos diretos na prestação de serviços como transporte público. Pelo menos cinco estados já relatam problemas para manter as linhas funcionando normalmente. No Rio de Janeiro, a previsão é de que 70% dos ônibus não circulem hoje se os estoques não forem repostos. O quadro pode chegar a paralisação total do transporte público na sexta-feira, caso os caminhões de combustível não cheguem às garagens ainda hoje. As empresas de ônibus abastecem os veículos nas garagens, onde mantêm um estoque de combustível suficiente para, no máximo, três dias.

Transporte público

Em São Paulo, com a perspectiva de que 40% dos ônibus fiquem fora de circulação hoje, a prefeitura suspendeu o rodízio municipal de veículos e afirmou, em comunicado, que vai pedir à Justiça “a suspensão dos bloqueios aos centros de distribuição de combustível”. A frota de caminhões de lixo na capital paulista ainda não foi afetada, “mas se persistir a greve, o serviço pode ficar comprometido a partir da sexta-feira”, diz o documento. Em Santos, no litoral paulista, 450 toneladas de lixo se acumularam pelas ruas ontem. O acesso dos caminhões de coleta é o mesmo do Porto de Santos, bloqueado pelos caminhoneiros.

Outro serviço afetado pela greve foi o dos Correios, que suspenderam temporariamente as postagens das encomendas com dia e hora marcados (Sedex 10, 12 e Hoje) e afirmaram que a paralisação tem causado atrasos nas operações da empresa no país. (Colaborou Adriana Bernardes)

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Indústria reduz atividade

24/05/2018

 

 

A paralisação dos caminhoneiros preocupa entidades representativas da indústria. Até ontem, 18 fábricas de automóveis no país tiveram que suspender ou reduzir as atividades — entre elas, quatro da Volkswagen, três da Ford, três da General Motors e duas da Toyota. Se a greve continuar até o fim de semana, “é certo que todas as fábricas vão parar”, alertou Antônio Megale, presidente da Anfavea, entidade que representa as montadoras. O resultado, segundo ele, será queda na produção, nas vendas e nas exportações, “tendo como consequência impacto direto na balança comercial brasileira e na arrecadação de tributos”.

O presidente da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Glauco José Côrte, afirmou, em nota, que os bloqueios podem “rapidamente trazer implicações para indústria, varejo e para toda a sociedade”. “Esperamos que governo e caminhoneiros cheguem a uma rápida solução para o impasse, a fim de evitar vultosos prejuízos à indústria e ao país”, disse.

De acordo com a Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul (Fiems), mais de 3,7 mil indústrias do estado paralisaram a produção nos últimos três dias. O número equivale a 60% dos 6.201 estabelecimentos industriais do estado. O presidente da entidade, Sérgio Longen, disse que haverá atraso no pagamento dos salários de mais de 120 mil trabalhadores. (AA)

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Aeroportos sob risco de parar

24/05/2018

 

 

Devido à greve dos caminhoneiros, pelo menos 11 aeroportos do país tiveram  problemas de abastecimento devido às paralisações. De acordo com a estatal Infraero, quatro só tinham combustível para operar até ontem e outros sete só conseguirão manter as atividades até amanhã. A lista não leva em conta aeroportos gerenciados por empresas privadas, como o de Brasília, que precisou restringir o recebimento de aeronaves com pouco combustível no terminal.

Após a Inframerica, concessionária do Aeroporto de Brasília, ter anunciado pela manhã que só haveria querosene de aviação até o fim da tarde, cinco caminhões, cada um com 45 mil litros do produto, chegaram ao terminal. O combustível saiu de Betim (MG) e veio escoltado pela Polícia Rodoviária Federal. O volume, entretanto, não foi suficiente. Como o terminal gasta, em média, 20 caminhões por dia, o estado ainda é de alerta.

O contingenciamento continua em vigor, com caminhões de querosene ainda retidos no entorno do Distrito Federal. Até ontem à noite, só podiam pousar no terminal aeronaves com capacidade para decolar sem a necessidade de reabastecimento, “a fim de minimizar o impacto para os passageiros”, informou a assessoria da Inframerica. Os aviões sem combustível suficiente estão sendo orientados a voltar ou a mudar a rota.

Diante da incerteza sobre a duração da greve, a recomendação da Infraero, que administra aeroportos como Santos Dumont (Rio de Janeiro) e Congonhas (São Paulo), e da Inframerica é de que os passageiros consultem as companhias aéreas sobre a situação dos voos.

O comerciante Felipe Bornier, 39 anos, comprou nova passagem para antecipar seu voo, que originalmente era hoje às 15h30, para a noite de ontem, por acreditar que, hoje, o movimento nos aeroportos será prejudicado pela falta de combustível. “Já vi que em três estados a situação estava mais complicada e eu tenho compromissos importantes amanhã (hoje) no Rio de Janeiro. Não queria correr o risco de o voo atrasar ou ser cancelado”, disse.

Para minimizar os impactos para os passageiros, a Latam anunciou que deixará de cobrar a taxa de remarcação de passagens e oferecerá a opção de reembolso integral do bilhete, sem multas, até que a situação se normalize. (Colaborou Anna Russi)