Título: Os limites entre os pais, os mestres e a Justiça
Autor: Filizola, Paula
Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2012, Brasil, p. 13
Descrito como atrevido e indisciplinado, o aluno Carlos*, de 16 anos, provocou o professor de sociologia Roberto* ao acender um cigarro de maconha dentro da sala de aula em um colégio público do Recanto das Emas. O menino era conhecido na região por participar de uma quadrilha de traficantes. Após levar o estudante à direção da escola, foi aconselhado a registrar o caso na delegacia. Foi quando recebeu uma ameaça do rapaz. A delegacia o orientou a pedir a transferência de instituição. Quatro meses após o episódio, o professor retornou e foi informado de que o adolescente havia sido assassinado. Ainda assim, Roberto convive diariamente com o medo, porque incidentes como o de Carlos não são isolados. Recentemente, no Rio de Janeiro, um aluno de 14 anos ameaçou voltar à escola acompanhado de traficantes depois que a direção chamou seus pais para uma reunião.
Episódios como esses favorecem a ampliação do debate em torno de punições mais severas aos infratores e da presença constante de agentes do Batalhão Escolar nas escolas da rede pública. Atualmente, a equipe policial só aparece quando é solicitada. Apesar dos casos cada vez mais frequentes de violência contra professores, a socióloga Miriam Abramovay acredita que a tendência de judicializar a educação é ruim. "Falta diálogo nas escolas. Os pais precisam participar mais. Porém, o caminho não é levar para o Judiciário", defende a especialista. O coordenador de Educação da Unesco, Paolo Fontani, concorda. "Sabemos que escolas mais ligadas à comunidade são menos violentas."
Para o presidente da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (Fetems), Roberto Magno Botareli Cesar, é preciso rever o Estatuto da Criança e Adolescente, porque a impunidade acaba resultando em mais agressões. A solução, segundo ele, pode ser o projeto de lei da deputada federal Cida Borghetti (PP-PR), que atualmente aguarda designação de relator na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. Caso a proposta seja aprovada, o estudante infrator ficará sujeito a suspensão e, na hipótese de reincidência grave, será encaminhado à autoridade judiciária competente. A iniciativa da parlamentar mudaria o artigo 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) para incluir o respeito aos códigos de ética e de conduta das escolas como responsabilidade e dever da criança e do adolescente estudante.
Na opinião do desembargador e coordenador da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo, Antonio Carlos Malheiros, o projeto não resolve o problema. "Não precisamos de novas leis. Se a vigente não é aplicada, é um sinal de displicência. Ou muitas vezes de medo dos professores e diretores da escola de denunciarem. Mas o estatuto é uma das leis mais completas que temos", justifica.
*Nomes fictícios para preservar a identidade dos entrevistados
"Falta diálogo nas escolas. Os pais precisam participar mais. O caminho não é levar para o Judiciário" Miriam Abramovay, socióloga