Título: Obras movidas a corrupção
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2012, Economia, p. 17
As pressões do calendário da Copa do Mundo de 2014 estão obrigando a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) a criar um padrão nacional de planejamento e execução de obras nos seus terminais. Não sem motivo: só agora, diante da premência de melhorar os serviços, a companhia descobriu que nem sequer tem as plantas dos aeroportos que administra. A situação é tão complicada que quaisquer reparos e ampliações resultam em interrupções, atrasos e gastos adicionais. Uma simples manutenção nos banheiros no Aeroporto Juscelino Kubitschek, em Brasília, ficou seis meses parada porque a construtora responsável não tinha em mãos o mapa dos encanamentos existentes no local.
"Problemas desse tipo ocorrem com frequência porque não tínhamos centralizada na sede uma memória das obras feitas e muito menos o aprendizado com elas. A construção dos aeroportos e suas modificações físicas eram tocadas nas regionais e os planos tomavam rumos próprios", explica José Eirado, diretor de Administração da Infraero. A estatal contratou a Fundação para o Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia (FDTE), ligada à Universidade de São Paulo (USP), para atualizar as técnicas de gerenciamento de projetos em obras de 15 aeroportos prioritários, visando evitar surpresas ruins.
Apenas o plano de investimentos do governo federal para os terminais relacionados à Copa e às Olimpíadas prevê um desembolso de R$ 5,2 bilhões pela Infraero. Segundo Eirado, além de fiscalizar a aplicação dos recursos e evitar que o dinheiro escorra pelo ralo, a estatal necessita ganhar agilidade para superar gargalos inesperados e evitar que eles se repitam. "Em matéria de gestão e acompanhamento de projetos, estamos começando tudo do zero", confessa. Ele assegura, porém, que o prazo para a conclusão dos empreendimentos não está estourado e os aeroportos serão reformados até dezembro de 2014.
"Reforma é um horror. Somos surpreendidos durante a obra porque a memória representada pelas plantas se perdeu ou não está devidamente organizada, centralizada. Congonhas (SP), por exemplo, tem projeto executivo de 1935", conta Gustavo do Vale, presidente da Infraero. "É por isso tudo que precisamos de projeto básico em cada obra, uma exigência do Tribunal de Contas da União (TCU). Antes, toda reforma era concedida ao próprio executor da obra, sem projeto básico, dando margem para todo tipo de imprevistos, inclusive corrupção", acrescenta.
No entender de Nilton Nunes Toledo, diretor superintendente da FDTE, a preparação da Infraero para gerir suas obras não interfere na concepção básica dos projetos, mas busca eliminar o tratamento burocrático que vinha sendo dado a elas. "Fatores externos, como licenciamento ambiental, acabam gerando atrasos que poderiam ser evitados com maior integração entre os agentes e o conhecimento prévio", explica. A parceria com um time de 40 engenheiros e professores da USP mira ganhos econômicos na construção e uma nova cultura empresarial para o operador aeroportuário. "Vamos atuar de forma independente nos canteiros de obras e, em paralelo, criar manuais para controle e eficiência", diz.
O contrato da consultoria é de dois anos. Cada aeroporto acompanhado pela FDT terá escritório próprio de gerenciamento e um núcleo central em Brasília. O andamento de cada obra da Infraero será registrado em planilhas e relatórios diariamente. Eirado ressalta que, no caso dos três aeroportos que foram concedidos à iniciativa privada — Brasília, Campinas (SP) e Guarulhos (SP) —, o trabalho da fundação levará cinco meses, na fase de diagnóstico. Os outros 12 aeroportos ganharão escritórios de projeto para monitoramento das obras até o seu final.
Enquanto os empreendimentos não ficam prontos, os passageiros precisam ter paciência. O delegado de polícia Adauri Gomes, 46, por exemplo, esperou meia hora para apanhar a mala na esteira do Aeroporto de Brasília. Junto da mulher, a advogada Taíssa, 39, e da filha Mauy, 6, ele veio de São Paulo com a família. "Em Guarulhos, a demora foi ainda maior", reclama. Menos sorte teve José Anteiro, 56. Ele voltou ao aeroporto um mês após reclamar da mala quebrada na última viagem. "A empresa ligou só agora dizendo para que viesse aqui. A mala se perdeu em São Paulo e reapareceu dias depois, arrombada", conta. (Colaborou Jorge Freitas)