O Estado de São Paulo, n. 45459, 04/04/2018. Política, p. A9.

 

PF resposabiliza DIlma por Pasadena

Fabio Serapião

04/04/2018

 

 

Duas perícias produzidas pela Polícia Federal sobre a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, colocam o Conselho de Administração da Petrobrás, à época chefiado pela presidente cassada Dilma Rousseff (PT), como um dos responsáveis pelo prejuízo milionário no negócio. Os laudos periciais são considerados provas nos processos judiciais e poderão ser utilizados para subsidiar a abertura de investigação contra os integrantes do conselho. No entendimento dos peritos, o sobrepreço pago pela Petrobrás à belga Astra Oil foi de US$ 741 milhões.

Os laudos foram anexados ao inquérito de Pasadena que tramita sob tutela do juiz federal Sérgio Moro, em Curitiba. A investigação deu origem à denúncia – aceita no dia 18 de março por Moro – em que a Lava Jato acusa o senador cassado Delcídio Amaral (ex-PT-MS) e outros nove por corrupção e lavagem de US$ 17 milhões provenientes da compra de 50% da refinaria.

Por causa das supostas falhas, os peritos afirmam que os conselheiros que participaram da reunião em que a compra foi definida não agiram com “o zelo necessário à análise da operação colocada” e sugerem como caminho para prosseguir a investigação a quebra dos sigilos bancários de todos eles. Estavam presentes na reunião, além de Dilma, Antonio Palocci, Cláudio Haddad, Fábio Colletti Barbosa, Gleuber Vieira e José Sergio Gabrielli.

A Petrobrás comprou Pasadena em duas etapas, em 2006 e 2012. Na primeira, pagou US$ 359 milhões por 50% da refinaria à Astra Oil – que, no ano anterior, havia desembolsado US$ 42 milhões por 100% dos ativos da planta. Em março de 2014, o Estado revelou que Dilma votou a favor do negócio em reunião do conselho. Segundo ela, o aval para a compra se baseou em um “resumo tecnicamente falho”, que omitia cláusulas das quais, se tivesse conhecimento, não aprovaria a aquisição.

Após disputa com a Petrobrás, a Astra acionou uma dessas cláusulas e, em 2012, a estatal pagou US$ 820 milhões pelos outros 50% da empresa belga. O negócio começou a ser investigado, em 2013, pelo Ministério Público no Tribunal de Contas da União (TCU) com base em reportagem do Estado

que mostrou a discrepância entre o valor pago pela empresa belga, em 2005, e o desembolso total efetuado pela Petrobrás pelo empreendimento.

Em outubro de 2017, o TCU responsabilizou os conselheiros pelo negócio e solicitou o bloqueio de seus bens.

Sobre a explicação dada por Dilma, os peritos avaliam que o ex-diretor de Internacional da Petrobrás Nestor Cerveró pode ter repassado informações imprecisas ao conselho, ao afirmar que gerentes da empresa “promoveram um completo desvirtuamento do conteúdo” das análises econômico-financeiras apresentadas ao colegiado. Entretanto, para os peritos, houve uma “mitigação dos controles internos e ausência de supervisão” por parte dos conselheiros.

“Nesse caso, admite-se como papel dos conselheiros o dever de evitar desvios (por erro ou fraude) dos diretores, em especial naqueles atos que exigem a sua expressa autorização”, afirma o laudo pericial que aponta o sobrepreço de US$ 741 milhões no negócio.

O senador cassado Delcídio Amaral e o ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró disseram, em delação premiada, que Dilma aprovou a operação sabendo que resultaria em prejuízo.

 

Defesas. Procurada, a assessoria de Dilma disse que não poderia se manifestar porque não teve acesso aos relatórios da perícia. O advogado Maurício Vasconcelos, que representa Gabrielli, afirmou que o ex-presidente da Petrobrás “não conhece a tal perícia e no inquérito onde a mesma foi produzida ele não é indiciado e, muito menos, investigado”.

A Petrobrás informou por meio de nota que instaurou uma comissão interna para apurar possíveis irregularidades na compra da refinaria. O empresário Fábio Barbosa, por meio de seu advogado, disse que não iria comentar porque não teve acesso aos laudos periciais.

Por meio de nota, Claudio Haddad informou que já apresentou detalhadamente sua defesa ao TCU e tem contribuído com as investigações, que seguem em segredo de Justiça.

Já a defesa do ex-ministro Antonio Palocci não respondeu aos contatos da reportagem. O Estado entrou em contato com o Exército para tentar localizar o general Gleuber Vieira, mas a instituição disse que ele foi para a reserva e não poderia tinha como encontrá-lo.

 

Negócio

Perícia diz que sobrepreço na compra de Pasadena pela Petrobras foi US$ 741 mi

 

Atribuição

“Nesse caso, admite-se como papel dos conselheiros o dever de evitar desvios (por erro ou fraude).”

LAUDO PERICIAL DA PF

 

PARA LEMBRAR

‘Estado’ revelou caso em 2012

A primeira reportagem que mostrou que a Petrobrás poderia ter perda milionária com a refinaria de Pasadena (EUA) foi publicada pelo Estado em julho de 2012. A estatal brasileira pagou US$ 1,18 bilhão pela unidade que, sete anos antes, foi negociada por US$ 42,5 milhões com a ex-sócia belga. A transação deu início às suspeitas de irregularidades no negócio. A partir de março de 2013, o Tribunal de Contas da União, o Ministério Público Federal do Rio e a Polícia Federal iniciaram investigações ligadas ao caso. O TCU à época viu “fortes indícios de dano aos cofres públicos e de gestão temerária e antieconômica” na transação. Em 19 de março de 2014, o Estado publicou documentos que revelaram que a então presidente Dilma Rousseff votou em 2006 favoravelmente à compra de 50% da refinaria. Procurada pelo Estado à época, Dilma confirmou que votou a favor do negócio, mas justificou que se baseou em um parecer “técnico e juridicamente falho”. Atribuiu o parecer ao ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, preso na Lava Jato.