Valor econômico, v. 18, n. 4490, 26/04/2018. Brasil, p. A5.

 

Déficit do governo em março foi o maior para o mês desde 97

Fabio Graner/ Fábio Pupo

26/04/2018

 

 

Em mais uma demonstração dos problemas fiscais do país, as contas do governo central - Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central (BC) - registraram em março o pior saldo negativo da série histórica, iniciada em 1997. Impulsionado por antecipação de pagamento de precatórios e sentenças judiciais, o déficit primário no mês passado ficou em R$ 24,82 bilhões. No mesmo mês de 2017, as contas haviam ficado negativas em R$ 11,23 bilhões.

Mesmo se descontasse os R$ 9,5 bilhões da antecipação realizada, o saldo negativo ainda seria, em termos nominais, o pior da série para o mês. Diante dos números negativos, o novo secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, que concedeu sua primeira entrevista coletiva, fez um apelo dramático pela reforma da Previdência, embora esta já tenha sido enterrada para este ano depois que o próprio governo anunciou a intervenção no Rio de Janeiro.

Ele afirmou que o cenário das despesas tende a se agravar ainda mais sem alterações nas regras da Previdência e que não há ajuste fiscal efetivo sem isso nem alternativa. "Não haverá plano B, C, D ou E sem reforma", defendeu. "O déficit da Previdência é enorme, sem perspectiva para reduzir. O cenário, sem reforma, tende a piorar, pois a despesa não depende da boa ou má vontade do gestor público", completou durante a coletiva, no qual gastou boa parte do tempo reforçando essa mensagem.

Mansueto destacou que o déficit da Previdência passou de R$ 20 bilhões em 2013 para R$ 49,1 bilhões no primeiro trimestre deste ano, em valores corrigidos pelo IPCA. Também salientou que o déficit do setor em 12 meses (considerando regime geral e regime próprio de Previdência) é de R$ 276,7 bilhões e disse que a previsão de déficit para o ano é de R$ 292,5 bilhões para toda a Previdência.

"Para reduzir o gasto previdenciário é preciso fazer a reforma", disse ele, complementando que a Previdência representa mais de 60% de todo o gasto primário do governo e que a trajetória de alta no déficit previdenciário nesse ano mais que compensou a recuperação dos superávits do Tesouro Nacional, que se reaproximou dos níveis de 2013.

O nível alto de despesas obrigatórias vem comprimindo o espaço das discricionárias no últimos anos, lembrou. "Caminhamos para nível de despesa discricionária igual a 2009. É como se ela tivesse sido submetida ao teto de gastos desde 2009", disse.

Para ele, além do reequilíbrio das contas públicas, a mudança na trajetória das despesas obrigatórias e outras reformas são necessárias para um crescimento sustentável. "Desafio para o Brasil não é crescer muito e sim de forma consistente", disse. Mesmo assim, ele disse que um crescimento do PIB entre 3,8% e 4% traria avanço per capita de 3%. "Poucos países conseguem isso". 

O déficit primário em março também superou a estimativa mais pessimista entre as dez consultorias ouvidas pelo Valor Data. As projeções eram todas negativas e com grande dispersão, variando de R$ 4,9 bilhões a R$ 21,9 bilhões. A estimativa média das consultorias e instituições financeiras era de déficit de R$ 13,9 bilhões do governo central para o terceiro mês do ano, ou seja, mesmo que não tivesse ocorrido a antecipação de precatórios o resultado teria surpreendido negativamente.

Mansueto explicou que a mudança de cronograma de precatórios procura dar mais previsibilidade às contas públicas e evitar acúmulo de dívidas com juros. Além disso, representa uma economia porque o juro de emissão da dívida pública é menor do que o custo de cada mês em que o pagamento é adiado, dado que o estoque desse passivo cresce pela inflação mais 0,5% ao mês.

No acumulado do trimestre, após um início de ano mais favorável impulsionado pela receita extra originada do Refis, o governo central registrou um déficit de R$ 12,98 bilhões, número melhor do que os R$ 19,56 bilhões verificados nos três meses iniciais de 2017, quando a receita vinha apresentando uma sequência de surpresas negativas.

Nos 12 meses terminados em março, o déficit primário foi de R$ 119,5 bilhões, equivalente a 1,78% do PIB, em valores atualizados. A meta fiscal deste ano é de um rombo de R$ 159 bilhões.