Correio braziliense, n. 20094, 28/05/2018. Política, p. 2

 

Nova tentativa de pôr fim à greve

Alessandra Azevedo

28/05/2018

 

 

Em meio a panelaços e buzinaços, Temer anuncia a redução do diesel em R$ 0,46 por 60 dias, o fim da cobrança de pedágios de caminhões sem carga e o valor do frete mínimo. Líder do movimento diz que medidas contemplam a categoria

Com a greve dos caminhoneiros completando uma semana e em meio a panelaços e buzinaços pelo país, o presidente Michel Temer anunciou, na noite de ontem, que reduzirá o preço do litro do óleo diesel em R$ 0,46 por 60 dias para tentar conter as paralisações, que continuam bloqueando rodovias em 25 estados. Em vez de zerar a cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) e do PIS-Cofins, o Tesouro Nacional pagará valor equivalente à Petrobras para substituir os tributos. O presidente também garantiu, após reunião de quase 12 horas com ministros no Palácio do Planalto, que editará três medidas provisórias para atender a outras reivindicações da categoria.

O novo acordo custará R$ 10 bilhões aos cofres públicos, segundo o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun. Ele garantiu que a redução chegará efetivamente às bombas e que os Procons ajudarão a fiscalizar esse repasse. “Nós fizemos nossa parte para perdoar problemas e sofrimentos. As medidas que acabo de anunciar atendem a praticamente todas as reivindicações que nos foram apresentadas”, disse Temer.

Diminuir o preço do diesel por 60 dias foi uma das concessões mais controversas dentro da equipe do governo por ser uma das mais caras do ponto de vista orçamentário. O governo arcará com o desconto por meio da criação de crédito extraordinário, cujas fontes devem ser detalhadas hoje pelo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. Temer garantiu que “honrará essa diferença de custo sem nenhum prejuízo para a Petrobras” e ressaltou que, para chegar aos R$ 0,46 de redução, “o governo está assumindo sacrifícios no Orçamento”.

Embora em caso de crédito extraordinário a despesa não entre nos limites da regra do teto de gastos — que estabelece o aumento das despesas federais à inflação do ano anterior —, o governo precisará cortar gastos para compensar o subsídio e cumprir a meta fiscal.

Quando acabar o prazo de dois meses de preços mais baixos, os reajustes passarão a ser mensais, como havia sido acordado na quinta-feira com algumas entidades representantes de caminhoneiros. A ideia, segundo Temer, é dar previsibilidade a eles, para que possam “planejar melhor seus custos e o valor do frete”. Na semana passada, o governo afirmou que essa medida custaria cerca de R$ 700 milhões ao mês à União.

As medidas provisórias tratarão de outros temas e serão editadas, segundo Marun, “o mais rapidamente possível”. Algumas podem ser publicadas ainda hoje no Diário Oficial da União. Uma delas determina o fim da cobrança do eixo elevado para os caminhões, usado pelos que trafegam sem carga total, nos pedágios das rodovias federais, estaduais e municipais. A segunda MP prometida por Temer prevê a garantia de que 30% da carga movimentada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) será feita por motoristas autônomos. Outra medida provisória estabelecerá um piso mínimo para o frete, demanda antiga da categoria.

O governo se comprometeu a adotar uma nova tabela de referência em 1º de junho e atualizações trimestrais pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT). Há um projeto de lei pronto para votação no Senado com o mesmo teor, mas os caminhoneiros disseram preferir uma medida provisória, que tem efeito imediato, por considerarem uma forma de o presidente mostrar compromisso com as pautas. Segundo o presidente, a decisão de editar uma MP em substituição ao projeto de lei foi tomada após conversa com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). Temer também reforçou que as medidas prometidas na quinta-feira continuam valendo. Entre elas, a garantia de que não haverá reoneração da folha de pagamento no setor de transporte rodoviário de carga.

Expectativa

Após o anúncio, o presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Diumar Bueno, afirmou que os três pontos propostos pelo governo federal atendem às reivindicações feitas pela categoria, mas que não pode garantir que a paralisação vai terminar. “(O fim das mobilizações) vai depender da base. Foi a categoria de forma independente que estabeleceu o movimento e tem a competência de avaliar as propostas do governo e entender se é hora de desmobilização ou não”, disse, em coletiva de imprensa na sede da CNTA, em Curitiba.

Ainda assim, as paralisações ainda devem continuar hoje e podem se estender pelos próximos dias, pois a garantia do governo ainda não atende completamente ao que tem sido pedido pelos autônomos que estiveram ontem no Palácio do Planalto. Entre outras exigências, eles pedem o congelamento do preço do diesel a valores de julho de 2017 por 90 dias. Outra demanda do grupo é a votação, em regime de urgência, do marco regulatório do setor de transportes, em discussão na Câmara dos Deputados.

Ainda que a paralisação dos caminhoneiros seja encerrada em breve, o abastecimento de carne de aves e suínos pode demorar até dois meses para voltar ao normal (leia mais na página 8), estima a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Até agora, 64 milhões de aves adultas e pintinhos morreram em decorrência da greve, de acordo com a entidade.

As medidas

Veja as ações anunciadas pelo presidente Michel Temer para atender aos pedidos dos caminhoneiros:

O preço do litro do diesel vai cair R$ 0,46. Também haverá mudança na política de preços da Petrobras. O valor do diesel nas refinarias só sofrerá variações mensais, em vez de como ocorre atualmente, podendo ser diárias. Além disso, o litro ficará congelado em R$ 2,10 nas refinarias durante 60 dias, em vez dos 30 dias sinalizados na quinta-feira. O governo vai bancar com os prejuízos da estatal durante o período. O detalhamento de onde sairá o dinheiro do orçamento da União será feito nesta segunda-feira.

O Executivo vai publicar uma medida provisória para isentar os caminhoneiros da cobrança dos pedágios para eixo suspenso. A ação vale para as rodovias federais, estaduais e municipais.

Outra MP vai garantir que os caminhoneiros autônomos recebam 30% dos fretes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Uma terceira medida provisória vai estabelecer uma tabela mínima de frete.

Pelo país

64 milhões

Quantidade de aves adultas e pintinhos que já morreram devido à falta de ração, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Um número maior deverá ser sacrificado em cumprimento às recomendações da Organização Mundial de Saúde Animal e das normas sanitárias vigentes no Brasil. Milhões de suínos também estão ameaçados

1 mil

Total de animais que estão no Parque de Exposições de Goiânia. A festa agropecuária terminou ontem e os donos não sabem como eles serão retirados por causa da greve dos caminhoneiros

17%

Percentual da frota de ônibus em circulação no Rio de Janeiro. A quantidade de coletivos que vai rodar nesta segunda-feira será definida às 6h, a partir da análise dos estoques de combustíveis

260

Quantidade de fuzileiros navais enviados pelo comando das Forças Armadas para manter a segurança e garantir as operações no Porto de Santos, no litoral de São Paulo. O complexo é alvo de protesto de caminhoneiros desde o início da semana passada

11

Universidades públicas federais suspenderam totalmente as atividades acadêmicas e administrativas nesta segunda-feira