O Estado de São Paulo, n. 45482, 27/04/2018. Política, p. A8

 

Antonio Palocci fecha delação com a PF

Fausto Macedo e Fabio Serapião

27/04/2018

 

 

Alvo da Lava Jato, ex- ministro de Lula e Dilma está preso desde setembro de 2016; acordo ainda precisa ser homologado pela Justiça

O ex-ministro Antônio Palocci fechou acordo de delação premiada com a Polícia Federal em Curitiba no qual deve fornecer detalhes de esquemas de corrupção durante os governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2015). A colaboração deve fortalecer as acusações contra Lula, condenado e preso na Lava Jato, e abrir frentes de investigação ligadas aos setores financeiro e automobilístico, além do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Para ter validade, o acordo ainda precisa ser homologado pela Justiça. A informação foi revelada ontem pelo jornal O Globo e confirmada pelo Estado.

Homem de confiança dos dois governos petistas, Palocci buscou a PF após sua negociação com o Ministério Público Federal não avançar. PF e MPF travam uma disputa no Supremo Tribunal Federal sobre quem pode assinar acordos.

O petista, que ocupou o Ministério da Fazenda do governo Lula e a Casa Civil na gestão Dilma, vai falar aos delegados da Lava Jato da Superintendência da PF de Curitiba, onde está preso desde setembro de 2016. Palocci foi detido após o delegado Filipe Hille Pace mapear movimentações da “planilha Italiano” no Setor de Operações Estruturadas – o “departamento de propina” – da Odebrecht.

Como o acordo é mantido em sigilo, ainda não se sabe a abrangência do conteúdo da delação de Palocci. Mas, desde que surgiram as primeiras informações sobre sua intenção de colaborar com a Justiça, a expectativa é de que ele detalhe sua atuação como ministro da Fazenda de Lula, coordenador da primeira campanha de Dilma e consultor na empresa Projeto Consultoria.

Relatório da Receita Federal anexado à Operação Omertà – fase da Lava Jato que prendeu o ex-ministro – apontou que a Projeto recebeu R$ 81,3 milhões de 47 empresas, entre 2006 e 2015. Os valores recebidos são de pelo menos três bancos, uma holding ligada ao setor farmacêutico, uma empresa de planos de saúde, uma montadora de veículos e uma do setor de alimentos. Para os investigadores, o acordo pode levar a novas frentes de apuração, sobretudo em relação ao setor financeiro.

Em depoimento ao juiz Sérgio Moro, na ação penal sobre a compra de um terreno para o Instituto Lula pela Odebrecht, Palocci incriminou o ex-presidente ao relatar a existência de um “pacto de sangue” no qual a Odebrecht se comprometeu a pagar R$ 300 milhões em propinas ao PT. A defesa de Lula diz que o ex-ministro “muda depoimento em busca de delação”.

 

‘Italiano’. O Estado apurou que os primeiros depoimentos prestados à PF por Palocci são relativos à investigação instaurada em Curitiba que apura sua relação com a Odebrecht. A Moro, no ano passado, o ex-ministro confirmou ser o “italiano” citado em planilhas do setor de propina da empresa.

O empresário Marcelo Odebrecht afirmou que a empresa repassou R$ 300 milhões a Palocci com a rubrica “italiano”. Segundo Odebrecht, o ex-ministro também era o administrador dos repasses para o codinome “Amigo”, atribuído a Lula.

O acordo de Palocci também poderá impulsionar investigações sobre possíveis irregularidades na liberação de empréstimos do BNDES. O ex-ministro foi alvo da Operação Bullish, deflagrada em maio de 2017. Uma das suspeitas é de que ele atuou, por meio de sua consultoria, para ajudar a JBS a se tornar a maior empresa de proteína animal do mundo – com apoio financeiro do BNDESPar. Na época da operação, a JBS e o BNDES negaram irregularidades.

 

CRONOLOGIA

Da prisão à colaboração

Setembro de 2016

Prisão

O ex-ministro Antonio Palocci é preso durante a 35.ª fase da Lava Jato – ele é detido sob suspeita de operar propinas da Odebrecht para o PT entre 2008 e 2013.

 

Abril de 2017

‘Caminho’

Em interrogatório, Palocci diz ao juiz Sérgio Moro ter “fatos com nomes, endereços, operações e coisas que vão ser certamente do interesse da Lava Jato”. “Acredito que posso dar um caminho, que talvez vá dar um ano de trabalho”, afirma.

 

Maio de 2017

Troca de advogado

O ex-ministro, diante da promessa de que “muito em breve” poderá ganhar a liberdade, comunica seu advogado, José Roberto Batochio, que vai trocar de defensor. Batochio é conhecido por não defender colaboradores.

 

Setembro de 20l7

Proposta

Com 50 anexos temáticos, a proposta de delação premiada negociada pela defesa do ex-ministro inclui, além do ex-presidente Lula, empresas e o setor financeiro.

 

Abril de 20l8

Acordo com a PF

Palocci fecha um acordo com a Polícia Federal em Curitiba; para ter validade, colaboração do ex-ministro petista ainda precisa ser homologada pela Justiça.

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Moro mantém em Curitiba processo do sítio de Atibaia

Daniel Weterman

27/04/2018

 

 

Para o juiz, decisão do STF de enviar delações da Odebrecht para São Paulo não se estende aos processos de Lula

O juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, negou ontem pedido da defesa do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva e decidiu manter sob sua jurisdição o processo sobre o sítio em Atibaia, no qual o petista é réu por supostos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Por outro lado, o magistrado afirmou que permitirá novas manifestações, em um processo paralelo, para que seja discutido o impacto da decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).

Na terça-feira, o colegiado decidiu, por maioria, retirar de Moro trechos de depoimentos de executivos da Odebrecht e encaminhá-los para a Justiça Federal de São Paulo. Os ministros entenderam que os anexos não têm relação com a investigação sobre supostos desvios de recursos da Petrobrás e, portanto, não deveriam estar sob a responsabilidade de Moro.

A defesa do ex-presidente solicitou que o juiz em Curitiba promovesse a “imediata remessa” dos autos das ações sobre o sítio de Atibaia e o terreno supostamente destinado à futura sede do Instituto Lula, ambas abastecidas com delações de executivos da Odebrecht. Ainda não foi divulgada nenhuma decisão do juiz no processo sobre a sede do Instituto Lula.

No âmbito do processo sobre o sítio, Moro disse que o acórdão da decisão da Segunda Turma do STF não foi publicado e, por isso, ainda não é possível “avaliar a extensão do julgado do colegiado.” Para o juiz, a retirada de trechos da declaração da Odebrecht não tem impacto automático na ação penal, mas será considerada.

No voto do ministro Dias Toffoli – que orientou o posicionamento final da Segunda Turma – “não há uma referência direta à presente ação penal ou alguma determinação expressa de declinação de competência desta ação penal”, disse Moro. “Aliás, o eminente ministro foi enfático em seu respeitável voto ao consignar que a decisão tinha caráter provisório e tinha presente apenas os elementos então disponíveis naqueles autos”, afirmou.

Moro escreveu em seu despacho que a ação contra a Lula reúne outras provas além dos depoimentos dos executivos da Odebrecht e que o processo se iniciou “muito antes” dos acordos com a empreiteira. O juiz afirmou que a análise sobre a competência da Lava Jato em Curitiba de julgar os casos deve ser feita após publicação do acórdão pelo Supremo.

Pendência. Após a decisão da Segunda Turma, o magistrado falou em reabrir prazo pra manifestação do Ministério Público e da defesa de Lula no processo que trata sobre a competência de Moro para julgar o processo.

“Assim, as partes poderão formular todos os argumentos possíveis e a questão poderá ser examinada considerando a referida decisão e todos os elementos probatórios constantes na presente ação penal. Observo, contudo, que a reabertura da questão e dos prazos na exceção precisam aguardar, por todo evidente, a publicação do acórdão para melhor análise do julgado”, reiterou.

O juiz admite que, neste caso, “assiste razão à defesa ao reclamar da falta de julgamento da exceção” e justifica que a pendência “é produto do acúmulo de processos perante este Juízo e da própria sucessão de requerimentos probatórios das Defesas na presente ação penal”.

 

‘Incidente. O advogado do ex-presidente, Cristiano Zanin Martins, afirmou em nota que, a rigor, “essas decisões mostram que o juiz de primeiro grau pretende abrir um incidente processual para decidir se o Supremo agiu corretamente, o que é incompatível com a hierarquia judiciária”.

 

Suplicy

O vereador Eduardo Suplicy (PT) foi recebido ontem pela juíza da 12ª Vara de Execuções Penais de Curitiba, Carolina Lebbos, que proibiu sua visita a Lula. Ele disse que vai recorrer da decisão.