Valor econômico, v. 18, n. 4474, 03/04/2018. Política, p. A8.

 

Temer envia recado velado ao STF e critica gestos "irresponsáveis"

Andrea Jubé, Cristiane Bonfanti, Marcelo Ribeiro, Fernando Taquari e Cristiane Bonfanti

03/04/2018

 

 

O presidente Michel Temer mandou ontem um recado velado ao Supremo Tribunal Federal (STF), quatro dias após a Operação Skala da Polícia Federal (PF), que levou à prisão dois de seus amigos mais próximos. Sem mencionar a operação, Temer, que foi deputado constituinte, relembrou os princípios do Estado Democrático de Direito consagrados na Constituição Federal e criticou gestos "irresponsáveis" contra o seu governo.

"Quando você fala em Estado de Direito, está falando do Estado Democrático, mas nós quisemos enfatizar o tema das liberdades individuais, do devido processo legal, da obediência estreitíssima aos termos da Constituição e da lei", afirmou na posse dos novos ministros. "A mensagem que se deu a todos nós: conduza-se pelos termos desta Constituição. Não saia dela, porque sair dela é desguiar-se dos propósitos do Estado Democrático de Direito", completou.

Na quinta-feira, o STF determinou a prisão temporária de amigos do círculo mais próximo de Temer para colher depoimentos no âmbito do inquérito que investiga suposto favorecimento a empresas do setor portuário: o ex-assessor especial da Presidência José Yunes, o coronel João Batista Lima Filho e o ex-ministro da Agricultura Wagner Rossi.

Pela manhã, Temer deu posse aos novos ministros da Saúde, Gilberto Occhi (PP), dos Transportes, Valter Casimiro Silveira (PR), e ao novo presidente da Caixa Econômica Federal, Nelson Antônio de Souza (PP).

Servidor de carreira da Caixa, Occhi ganhou um perfil político ao assumir, pela terceira vez em sua trajetória, um ministério por indicação do PP. Antes da Saúde, ele foi ministro das Cidades e da Integração Nacional, ambos nas gestões Dilma Rousseff. Assumiu a presidência da Caixa em 2016, no governo Temer.

Valter Casimiro era presidente do Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit), enquanto Souza comandava até então a vice-presidência de Habitação da Caixa.

Durante a posse, logo no começo do discurso, ao saudar as autoridades, e cumprimentar o presidente do Congresso, senador Eunício Oliveira, Temer referiu-se ao correligionário como se fosse o "presidente do Supremo", sugerindo uma preocupação com as ações da Corte.

No mesmo pronunciamento, Temer saudou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que hoje assina a ficha de filiação ao MDB, consumando a pré-candidatura à sucessão presidencial.

"E ainda mostrou, mais uma vez, o ministro Meirelles que a responsabilidade fiscal é decisiva para a verdadeira responsabilidade social. Não vamos ter ilusão de que você atinge os benefícios sociais sem ter responsabilidade fiscal no país", concluiu.

Durante evento na capital paulista, Temer reforçou indiretamente as críticas ao STF. Sem citar novamente a operação da PF, o presidente ressaltou que seu governo tem sido alvo de pessoas sem "brasilidade" e com interesse em tumultuar o país e embaraçar o seu governo.

"Nesses quase dois anos de governo não foram poucos os embaraços e as oposições que nós sofremos, até de gente disposta a desestabilizar o país com gestos extremamente irresponsáveis, que têm naturalmente repercussão internacional", afirmou o emedebista em discurso no Fórum Econômico Brasil-Países Árabes.

À noite, em Santos, litoral de São Paulo, onde participou da abertura do Congresso Estadual dos Municípios, promovido pela Associação Paulista dos Municípios, o presidente disse que "estamos perdendo no país muito a ideia da institucionalidade, a ideia da autoridade, do cumprimento rigoroso daquilo que está na Constituição. É interessante como isso está acontecendo com uma frequência extraordinária e muitas e muitas vezes em função dos embates políticos.

Em aceno a prefeitos, o presidente disse que é preciso "colocar de lado" disputas partidárias e defendeu o fortalecimento dos municípios. "Temos um federalismo de pé quebrado, pela metade, capenga", afirmou.