Correio braziliense, n. 20119, 22/06/2018. Política, p. 2

 

Sob risco de anulação

Gabriela Vinhal

22/06/2018

 

 

ELEIÇÕES » Se fake news influírem no resultado final, o presidente do TSE afirma que o processo eleitoral pode ser invalidado. Abin, Polícia Federal e Ministério Público vão atuar para fiscalizar e repreender o conteúdo falso distribuído nas redes sociais

Caso seja comprovada a influência massiva das notícias falsas no resultado final das eleições, o processo eleitoral corre o risco de ser anulado. A declaração foi dada ontem pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luiz Fux, durante o seminário “Fake news: experiências e desafios”, promovido com a União Europeia no Brasil para debater estratégias de combate ao conteúdo fraudulento.

“O artigo 222, do Código Eleitoral, diz que se o resultado de uma eleição qualquer for fruto de uma ‘fake news’ difundida de forma massiva e influente, o texto prevê, inclusive, a anulação (do processo)”, afirmou. No entanto, Fux ressaltou que não será um processo fácil, pois demanda um “acervo probatório” e um conhecimento profundo daquilo que foi praticado.  “Mas a lei prevê esse tipo de sanção”, justificou.

O texto citado pelo ministro prevê que a votação é anulável quando for viciada de falsidade, fraude, coação, “uso de meios de que trata o artigo 237, ou emprego de processo de propaganda ou captação de sufrágios vedado por lei”. Já o artigo 237 diz que serão coibidos e punidos “a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto”.

“Temos uma tutela penal enérgica que pode anular candidatura que obteve êxito com base em fake news. Tem uma regra geral no Código Eleitoral. E nós temos também a tutela no campo eleitoral, que impõe multas, direito de resposta e, eventualmente, até anulação daquela eleição se ela foi fruto de uma massificação de ‘fake news’, com base no artigo 222 do Código Eleitoral”, acrescentou Fux.

Como estratégia de combate, o ministro ressaltou que vai trabalhar com a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal para fiscalizar e repreender o conteúdo falso na internet. Ele também firmou acordo de cooperação com partidos e coligações políticas, marqueteiros profissionais e empresas de web (Google e Facebook) para não divulgarem fake news nas redes sociais. Fux afirmou ainda que vai publicar uma resolução com novas medidas para tentar conter essas notícias inverídicas.

Avaliação

Para o advogado André Mattos, especialista em direito eleitoral, a declaração de Fux foi “exagerada”, pois o artigo do Código Eleitoral cita a fraude, mas nas urnas, não durante a campanha com notícias falsas. O especialista explica que o texto é antigo, ainda do código original, quando o voto impresso ainda era utilizado e o eleitor poderia ser induzido ao erro. “Forçou um pouco a barra, mas é claro que se uma campanha for toda produzida a partir de fake news e isso ludibriar o eleitorado, pode haver um pedido de cancelamento. Contudo, não está no Código Eleitoral, mas na Lei Complementar nº 64/1990, que dispõe da perda de mandato por abuso de poder econômico e dos meios de comunicação”, justificou.

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Renovação da política em debate

Otávio Augusto

22/06/2018

 

 

Os recentes escândalos de corrupção e a aversão da sociedade à política fizeram de 2018 um ano crucial: será que agora o Congresso será renovado? Como vão se comportar os eleitores e quais nomes vão conquistar a parcela mais descrente? A necessidade de formar novas lideranças esbarra na legislação, no preconceito e, sobretudo, na soberania dos partidos. Ontem, seminário no auditório do Correio, promovido pelo instituto de formação de lideranças políticas RenovaBR, discutiu o tema.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso defendeu o barateamento das campanhas eleitorais como forma de promover a renovação política. Para o ministro, com disputas caras, a forma de financiamento atual mantém o poder na mão de “herdeiros”. “Os custos obrigam os candidatos a buscar financiamentos extravagantes. Há uma diferença muito grande entre o que se custa e o que se pode arrecadar. Isso é motivo de grande parte das práticas de corrupção que vemos no país”, destacou.

Barroso criticou o comportamento dos partidos. “Eles viraram business. Negócio privado com venda de tempo de televisão. Temos que reagir a isso se quisermos criar a cultura de mínimos de decência política”, concluiu. O ministro fez duas propostas: a redução do poder presidencial e o sistema distrital misto. O seminário contou com a participação dos senadores Cristovam Buarque (PPS-DF) e Ana Amélia (PP-RS). Para a senadora, a nova forma de financiamento de campanha — sem dinheiro de empresas e com financiamento público — vai aumentar o caixa dois. “Vai começar a entrar dinheiro da milícia, do tráfico e de outros grupos criminosos. Acho que tentaram criar um beija-flor que saiu um morcego”, ponderou.